Autor do Texto: Hugo Pinto Homem
As
sandálias do discípulo ressoavam surdamente nos degraus de pedra que levavam
aos porões do velho mosteiro. Empurrou a pesada porta de madeira que cerrava os
aposentos do ancião. Custou a localizá-lo na densa penumbra, o rosto velado por
um capuz, sentado atrás de enorme escrivaninha, onde, apesar do escuro, fazia
anotações num grande livro, tão velho quanto ele. E o discípulo o inquiriu:
- Mestre, qual o sentido da vida?
O idoso monge, permanecendo em
silêncio, apenas apontou um pedaço de pano, um trapo grosseiro no chão junto à
parede. Logo após, seu indicador ossudo e encarquilhado mostrou, no alto do
aposento, o vidro da janela, opaco sob décadas de poeira e teias de aranha. O
discípulo pegou o pano e subiu em algumas prateleiras de uma pesada estante
forrada de livros. Conseguiu alcançar a vidraça e começou então a esfregá-la
com vigor, retirando a sujeira que impedia sua transparência. O sol inundou o
aposento, banhando com sua luz estranhos objetos, instrumentos raros e dezenas
de papiros e pergaminhos com misteriosas anotações e signos cabalísticos. O
discípulo, sem caber em si de contentamento, a fisionomia denotando o brilho da
satisfação, declarou:
- Entendi, mestre. - Devemos nos livrar de tudo que atrapalhe nosso aprendizado... Retirar
o pó dos preconceitos e as teias das opiniões que impedem o receber da luz do conhecimento e então
enxergaremos a verdade, com mais
nitidez.
O jovem discípulo fez então uma
reverência, e deixou o aposento, agora iluminado, a fim de dividir com os
outros a lição recém aprendida. O velho monge, o rosto enrugado ainda encoberto
pelo largo capuz, os raios do sol da manhã banhando-o com uma claridade a que
se desacostumara, olhou o discípulo se afastando. Deixou escapar um tênue
sorriso e pensou:
- Mais importante do que aquilo que alguém mostra é o
que o outro enxerga!
E murmurou baixinho:
E murmurou baixinho:
- Eu só queria que ele colocasse o pano no lugar de
onde caiu.
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