As férias chegam ao fim, volto ao
Rio, mas trago na bagagem recordações de Lisboa. Ao contrário dos cariocas, tão
afetuosos e expansivos, os portugueses carregam em si um formalismo que chega a
ser engraçado. A turista brasileira perguntou
a um passante:
- Eu queria ir para o Mosteiro dos Jerônimos.
- Ora, minha senhora. A senhora vai para onde quiser - ouviu de volta.
- Ora, minha senhora. A senhora vai para onde quiser - ouviu de volta.
Um amigo português me explica que ela
deveria ter perguntado de outra forma:
- Boa tarde. Por
favor, o senhor sabe me informar como faço para ir ao Mosteiro dos Jerônimos?
Outro conhecido estava procurando a
Rua do Ouro, como é popularmente chamada a Rua Áurea. Roda daqui, roda dali, já
estava perdido havia uns 30 minutos, quando resolveu pedir ajuda a um guarda:
- O senhor sabe onde fica a Rua do Ouro?
- É aqui mesmo.
- Mas na placa está dizendo Rua Áurea!
- Se o amigo soubesse um pouco de latim... - ironizou o policial.
- É aqui mesmo.
- Mas na placa está dizendo Rua Áurea!
- Se o amigo soubesse um pouco de latim... - ironizou o policial.
Em Lisboa, o ritmo das coisas é mais
lento. Eu estava no ônibus quando duas brasileiras, afobadas, começaram a empurrar
as pessoas à frente na tentativa de descer mais rapidamente.
Um português virou-se e disse:
- Em Portugal, tem-se que ter calma.
Uma das figuras mais agradáveis que reencontrei foi o jornalista Duda Guenes. Ele mora em Portugal desde 1974 e é um frasista de primeira. Uma delas: "Isso é mais falso que folclore baiano".
Pernambucano, Duda diz que a melhor definição que já encontrou do Brasil foi no estatuto de uma gafieira no Recife. Um dos itens dizia: "Proibido dançar mais de uma vez
Duda tem um amigo que coleciona bens imateriais. Mais especificamente, apertos de mão. O sujeito tem anotadas todas as mãos importantes que já apertou, de JK a Rita Lee e Rita Pavone.
Mas a figura mais inusitada de Lisboa pode ser vista toda madrugada numa esquina da cidade. É um senhor distinto, de família aristocrática, vestido de blazer, que passa a noite dando tchauzinho e sorrindo para todos os carros que passam. Numa dessas noites, meu pai resolveu retribuir o cumprimento e recebeu em troca um dos sorrisos de felicidade mais genuínos que já vi.
Enquanto isso no
Brasil...
O melhor de Paris talvez seja atravessar o sinal sem olhar para os lados. Turista tende a idealizar a cidade que visita, mas a verdade é que aqui os carros - e bicicletas - param a qualquer hora do dia e da noite. No Rio, é com solavancos na alma que passamos por qualquer cruzamento, mesmo à tarde.
Lembro o dia em que passei com a luz verde e um taxista
que vinha na outra rua furou o sinal e berrou para mim:
- Seu egoísta!
Tudo porque eu não parei e o deixei ultrapassar o sinal vermelho
- Tá pensando que está na Suécia, ô perua!
Minha amiga brasileira, com quem almoço no bairro árabe de Ménilmontant, em frente à igreja onde Brian De Palma filmou a cena mais impressionante de “Femme fatale”, diz que eu não vi nada. Certa vez, no Rio Comprido, ela teve que se desviar e quase caiu no canal por causa de um taxista que furou o sinal e ainda por cima a xingou:
- Sua filha da
p...! Eu sou homem e a prioridade é minha.
Pelas ruas de Paris
Anoitece e um vento frio
substitui o calor que havia feito de dia. Na porta de um banco, um mendigo toma
vinho e lê o jornal.
Minha atenção é desviada para uma
aglomeração de carros de polícia, cena rara em Paris. Mas eles estão ali para cuidar do trânsito e permitir que centenas de patinadores deslizem pela cidade em segurança. Juntos ,
vão também alguns policiais-patinadores.
Entro numa livraria. Vejo Fernando Pessoa numa estante e penso em como "Livro do desassossego" soa muito mais poético do que "Le livre de l'intranquilité".
Pego o metrô. Já passa das dez da noite. No vagão, um rapaz abre seu notebook e começa a escrever no computador. Duas moças tiram fotos uma da outra com uma câmera digital. Uma jovem ouve música no seu ipod. Outra abre a carteira e começa a contar o dinheiro.
Salto perto de um parque lindíssimo,
rodeado de prédios milionários. Um deles chama a atenção pela beleza.
De curiosidade, dou uma olhada no
interfone para ver quem são os moradores. Um nome soa familiar: M Lutfalla.
Penso em apertar o botão e perguntar se monsieur Paulô Maluf está, mas já havia
recebido notícias do Brasil e sabido que àquela altura o ex-prefeito estava na
cadeia. Uma alegria cívica me acompanha na volta para casa.
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