Raul Pompeia
Os companheiros de
classe eram cerca de vinte; uma variedade de tipos que me divertia. O Gualtério, miúdo, redondo de costas,
cabelos revoltos, motilidade brusca e caretas de símio - palhaço dos outros,
como dizia o professor; o Nascimento,
o bicanca, alongado por um modelo geral de pelicano, nariz esbelto, curvo e
largo uma foice; o Álvares, moreno,
cenho carregado, cabeleira espessa e intonsa de vate de taverna, violento e
estúpido, que Mânlio atormentava, designando-o para o mister das plataformas de
bonde, com a chapa numerada dos recebedores, mais leve de carregar que a
responsabilidade dos estudos; o Almeidinha,
claro, translúcido, rosto de menina, faces de um rosa doentio, que se levantava
para ir à pedra com um vagar lânguido de convalescente; o Maurílio, nervoso, insofrido, fortíssimo em tabuada: cinco vezes
três, vezes dois, noves fora, vezes sete?... lá estava Maurílio, trêmulo,
sacudindo no ar o dedinho esperto... olhos fúlgidos no rosto moreno, marcado
por uma pinta na testa; o negrão, de
ventas acesas, lábios inquietos, fisionomia agreste de cabra, canhoto e
anguloso, incapaz de ficar sentado três minutos, sempre à mesa do professor e
sempre enxotado, debulhando um risinho de pouco vergonha, fazendo agrados ao
mestre, chamando-lhe bonzinho, aventurando a todo ensejo uma tentativa de
abraço que Mânlio repelia, precavido de confianças; Batista Carlos, raça de bugre, válido, de má cara, coçando-se
muito, como se o incomodasse a roupa no corpo, alheio às coisas da aula, como
se não tivesse nada com aquilo, espreitando apenas o professor para aproveitar
as distrações e ferir a orelha aos vizinhos com uma seta de papel dobrado. Às
vezes a seta do bugre ricochetava até a mesa de Mânlio. Sensação; suspendiam-se
os trabalhos; rigoroso inquérito. Em vão, que os partistas temiam-no e ele era
matreiro e sonso para disfarçar.
Dignos de nota havia
ainda o Cruz, tímido, enfiado,
sempre de orelha em pé, olhar covarde de quem foi criado a pancadas, aferrado aos
livros, forte em doutrina cristã, fácil como um despertador para desfechar as
lições de cor, perro como uma cravelha para ceder uma idéia por conta própria;
o Sanches, finalmente, grande, um
pouco mais moço que o venerando Rebelo,
primeiro da classe, muito inteligente, vencido apenas por Maurílio na
especialidade dos noves fora vezes tanto, cuidadoso dos exercícios, êmulo do
Cruz na doutrina, sem competidor na análise, no desenho linear, na cosmografia.
O resto, uma cambadinha indistinta, adormentados nos últimos bancos, confundidos na sombra preguiçosa do fundo da sala.
O resto, uma cambadinha indistinta, adormentados nos últimos bancos, confundidos na sombra preguiçosa do fundo da sala.
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“A
escola é um mundo onde a gente pode até errar,
fazer de novo e acertar.”
fazer de novo e acertar.”
Raul Pompeia
Raul d'Ávila Pompeia (Angra dos Reis, 12 de abril de 1863 − Rio de
Janeiro, 25 de dezembro de 1895) foi um escritor brasileiro, representante do impressionismo na Literatura
Brasileira. Seu livro mais importante foi O Ateneu, de 1888, que está inserido
entre as obras do Realismo.
Neste livro é narrada a história
de Sérgio, já adulto, relembrando sua infância, quando aos onze anos foi
estudar no internato, Ateneu, o colégio de maior prestígio na época, com seu
grande diretor Aristarco, depois de ter estudado em uma pequena escola e recebido
estudo em casa, foi sempre coberto de amor.
Durante o primeiro ano fez muitas
amizades. Rebelo que lhe apresentou a escola e seus alunos cada qual com seu
caráter. Saches, o mais velho, o salvara de um afogamento na piscina, mas
depois de uma briga se tornaram de certa forma inimigos. Franco, um menino mal
comportado se envolveu em uma confusão com Sérgio, Franco jogou cacos de vidro
na piscina, mas por sorte e para alívio de Sérgio nada aconteceu.
Barreto que lhe afirmava que a
mulher era um demônio, fato que segundo Sérgio veio a ser comprovado quando
dois homens na luta pelo amor de Ângela, camareira da casa de Aristarco,
brigaram, um morreu e outro foi preso.
Depois ao interessar-se pela
biblioteca e os livros fez mais duas amizades, Júlio Verne e Bento Alves, ambos
mais velhos.
Bento e ele tinham uma amizade de
irmãos. Bento o protegia e foi por isso que depois de muitas implicâncias
entrou em uma briga com Malheiro. Nesses tempos Sérgio recuperou seu
rendimento, pois o ano letivo estava para acabar. Iniciou-se na escola uma
“moda” entre os alunos, a de colecionar selos, depois dessa veio a exposição
artística e assim ano acabou.
O primeiro ano no Ateneu acabou,
durante as férias Sérgio e Bento se encontraram e ao voltarem ao colégio mantiveram
sua amizade. Nesse segundo ano passou por momentos divertidos, entre desfiles e
piqueniques com chuva, mas sem explicação um dia brigou com Bento rompendo a
amizade. Bento saiu da escola, Sérgio teve uma desavença com Aristarco sem
resultados.
Viveu ainda o castigo por causa
de travessuras, fez então uma nova amizade, Egbert, com esse tinha uma amizade
fraternal e grandiosa, mas depois de um jantar na casa do diretor, a amizade de
Sérgio ficara no passado. Foi transferido para o dormitório dos rapazes mais
velhos onde participou de passeios clandestinos durante a noite.
Assim o segundo ano no Ateneu
seguiu, com as férias Sérgio adoeceu, sarampo, ficou sob os cuidados do
diretor, já que sua família viajava para a Europa. Por esses dias em que permaneceu
doente viu em D. Ema ,
mulher de Aristarco, uma mãe, nem se lembrando mais da verdadeira, ansiava o
encontro a cada manhã com D. Ema.
Em uma manhã, a ruína do Ateneu
chegou, todos gritavam por fogo, Sérgio saiu de sua cama e percebeu que estava
tudo a arder em
chamas. Ao fim, parte da escola estava carbonizada, o
culpado do incêndio proposital era Américo um aluno recém chegado que fora
deixado ali contra a vontade, o pai pediu a Aristarco que lhe curasse o mau
comportamento. Durante o incêndio D. Ema desapareceu.
Com o fim do
Ateneu, Sérgio encerrou suas memórias.
Por Rebeca Cabral
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