quinta-feira, 3 de abril de 2014

Tinha uma maleta no meio do caminho

Esta história faz parte do folclore futebolístico.  Seleção gaúcha, representando o Brasil, foi campeã pan-americana de futebol no México.


 

Ataque do pan:

Luizinho, Bodinho, Larri, Ênio Andrade e Chinesinho

O calendário do Pan-Americano marcava rodada dupla para a noite de 6 de março. Na preliminar, Argentina X Costa Rica e no jogo de fundo, Brasil X Peru. O time brasileiro era o mesmo que iniciou a partida contra o Chile: Sérgio, Oréco, Florindo, Ênio Rodrigues e Duarte; Odorico e Ênio Andrade; Luizinho, Bodinho, Larry e Raul.

Mesmo quem estava no Estádio não podia acreditar. Eram 15 minutos do segundo tempo e a Costa Rica derrotava a Argentina por 3 a 1. Para piorar, Tucho Mendez, uma legenda do futebol argentino e já também um dinossauro de 34 anos, fraturou a perna e saiu de campo. O técnico Guilhermo Stábile colocou em seu lugar Sívori, garoto de 20 anos, revelação do River Plate campeão argentino de 1955. Baixo, cabeça grande e um pouco barrigudo, em nada lembrava a fisionomia de um atleta de futebol. Parecia jogador de xadrez e como um exímio enxadrista deu um xeque-mate na Costa Rica. Marcou três gols em 25 minutos e saiu de campo carregando consigo todos os prêmios de melhor da partida. Resultado final: Argentina 4 X 3 Costa Rica.

O confronto contra os peruanos era chave na competição. Dois dias antes, eles haviam derrotado o México por 2 a 0 (no embate das civilizações inca e asteca) e assumiam, embora com uma partida a mais, a liderança do torneio.

Florindo mostrou que não estava para brincadeira. Incumbido de marcar Mosquera, não queria passar o mesmo vexame do qual o argentino Cardoso havia sido vítima. Nas duas primeiras divididas, chegou atrasado propositadamente para trombar com o pequenino Mosquera, que naturalmente levava sempre a pior. Indisposto a virar saco de pancada, o peruano recuou e começou a jogar no meio de campo, onde era menos perigoso.

O perigo agora se chamava Félix Castilho, 36 anos, ponteiro-direito veloz como um cavalo de corrida. Duarte, encarregado de marcá-lo, não o viu em campo. Ênio Rodrigues jogou toda a partida em sua cobertura. Mas foi o Brasil quem largou na frente. Larry, ao receber uma cobrança lateral, ainda na intermediária, numa atitude impensada chutou a gol. A bola tomou uma força incrível e entrou no ângulo do goleiro Felandro. Um golaço.

No segundo tempo, os comandados de Teté praticamente não passaram do meio campo. Em um curto espaço de tempo, Duarte cometeu três faltas consecutivas sobre Félix Castilho. Vendo que o árbitro Alfredo Rossi corria energicamente em sua direção para verbalmente mandá-lo embora de campo (não havia o sistema de cartões), Duarte ajoelhou-se aos seus pés e pediu clemência, só faltando chamar Rossi de Vossa Santidade. Foi perdoado.

Na tentativa de dar mais movimentação ao ataque, Teté tirou Larry, cansado, e colocou Juarez em seu lugar. A torcida, imediatamente, começou a gritar tourito, tourito. Entretanto, quem continuou a melhorar foi a seleção peruana.

A partida assumia requintes de dramaticidade. O capitão Ênio Rodrigues lesionou-se e precisou ser atendido pelo médico Derly Monteiro e o massagista Moura atrás da goleira de Sérgio. Quando Félix Castilho, sempre ele, driblou dois adversários e entrou área adentro para marcar o gol de empate, Moura atirou a maleta do doutor Derly na bola, fazendo com que o habilidoso ponteiro peruano se perdesse na jogada. O sururu foi geral. Os peruanos queriam a prisão perpétua do massagista brasileiro. Houve troca de empurrões entre vários jogadores, e a pequena área ficou cheia de mercúrio, éter, iodo, algodão e vela. O árbitro não sabia o que marcar, já que o livro de regras era omisso nesse artigo. Decidiu, diplomaticamente, pela cobrança do escanteio.

A segunda vitória em dois jogos mostrou que a gauchada não estava lá para fazer número. O clube Puebla entregou o troféu da partida, posteriormente colocado na Arca de Troféus. Mais do que Larry, autor do gol da vitória, o herói da noite foi o massagista Moura.


Luizinho - Bodinho - Larry - Ênio Andrade e Chinesinho


(Do livro “1956 Uma epopeia gaúcha no México”, 
de Eduardo Valls – WS editor)


Nenhum comentário:

Postar um comentário