João Vicente da Cunha e seu
equipamento de rádio falso, “transmitindo” evento a partir das areias do
Gonzaga, em 1960. Foto: Zezinho Herrera.
(Você já viu muito isso na
TV)
O “Zé Macaco” era um termo muito
usado pela turma de repórteres de campo para homenagear o criador da peripécia
radiofônica. A traquinagem consistia de uma lata de óleo de cozinha coberta por
verniz, uma antena de rádio de carro e uma “redinha de arame”, ou seja, um
microfone perfeito. Igual ao das emissoras mais ouvidas na época. O “falso
repórter” saía então à cata de eventos e solenidades para, misturando-se à imprensa, fazer parte das manchetes de jornais e revistas. Portanto, numa
entrevista coletiva, lá estava o Zé Macaco. Porém jamais se descobrira a que emissora
ele pertencia. Essa estratégia de merchandising é usada até hoje,
pois, quando assistimos a uma entrevista coletiva na TV, não significa que
todos aqueles microfones com os logotipos das emissoras estejam conectados. O
mesmo vale para uma foto de jornal ou revista. Aliás, o objetivo número um do
Zé Macaco era aparecer. Cabe dizer que o autor do maquinário morava em Santos e
chegou a ser vereador da cidade, certa vez entrevistando Jânio Quadros, na
época Presidente da República.
(Do livro “Um show de
rádio - a vida de Estevam Sangirardi”,
de Carlos Coraúcci)
de Carlos Coraúcci)
Observação:
A TV Globo está, ao vivo,
entrevistando um político em Brasília para todo o país no Jornal Nacional,
assistido por milhões de telespectadores em todo o território brasileiro,
dezenas de microfones de emissora regionais, como o gravador da RBS, estão na
boca do entrevistado: tudo desligado, tudo Zé Macaco...
ZÉ MACACO - João
Vicente Saldanha da Cunha foi o segundo vereador mais votado na história de
Santos alcançando 10.913 sufrágios, só perdendo para José Gonçalves, que
obteve 11.822 votos.
Nascido em Vitória da Bahia e desde os 15 anos em Santos, Zé Macaco foi quem melhor personificou o político do chamado voto de protesto. Com pouca instrução, ganhou notoriedade fazendo entrevistas, quase todas em campos de futebol. Na verdade, este era seu hobby: ele não era repórter, usava uma lata de alumínio adaptada. Só poucos entrevistados descobriram este esquema. Zé Macaco foi ganhando fama fazendo propaganda na porta de lojas, mas não se limitava à forma tradicional de chamar a atenção. Usava perna-de-pau, engolia vidros e moedas e depois os fazia voltar. Aposentou-se da Câmara por invalidez, pois ficou com artrose na perna esquerda, depois de um acidente automobilístico. João Vicente Cunha faleceu aos 73 anos e deixa o filho Marcos. Seu sepultamento ocorreu no Cemitério de São Vicente.
Histórias &
Estórias
Amílcar Ferrão Pinto
Toda cidade e mesmo todo bairro
têm os seus personagens exóticos, folclóricos, que vivem à margem do mundo dito
normal, ensandecidos pela vida ou marcados desde o nascimento para um destino
inexplicável. O jornalista Olavo Rodrigues discorreu sobre muitos desses tipos
populares que existiram em Santos em várias épocas: Camarinha, Guari,
Mata-Cobras, Trinta Quilos, João das Ostras... O escritor Nélson Salasar
Marques mencionou um indivíduo insólito do Bairro Chinês: o temido Foge-Chico.
Recordo-me de algumas dessas figuras que passaram pelo bairro da infância.
Maria Sapa foi uma delas, mas sua imagem me surge enevoada, apagada pela
distância do tempo. O jurista Mário Faria dedicou enternecedor soneto a essa
estranha criatura que perambulava pelas ruas de Santos.
Recentemente ainda se via o Zé
Macaco. Muito magro, braços compridos, andar desengonçado, roupas bizarras,
puxava um carrinho com um alto-falante num volume ensurdecedor e, em meio a
apitos e chiados, matraqueava anúncios de casas comerciais. Quando reclamavam
do ruído infernal de sua engenhoca, dizia: “Quem não gosta de barulho que vá
morar no cemitério!” À noite, Zé Macaco demonstrava seus dotes de dançarino no
tradicional “Samba Danças”, da Rua General Câmara. Também gostava de imitar
locutor de rádio e fingia fazer reportagens em jogos de futebol e visitas de
pessoas importantes. Dizem que uma vez chegou a “entrevistar” o então
Presidente da República, Marechal Castelo Branco, que seriamente respondia às
perguntas do Zé Macaco sem desconfiar que falava a uma lata de azeite
disfarçada de microfone! Muito popular, chegou a ser eleito vereador em Santos. E o mais
votado!
Zé Macaco
Parabéns pelo blog Nilo. Muito interessante.Obrigado pelo crédito ao meu livro. Um abraço.
ResponderExcluirCarlos Coraúcci
E parabéns a você também pelo belo trabalho de pesquisa de seu livro, contando fatos do tempo glorioso do rádio.
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