“Desde pequenos na arriscada vida
de rua, os Capitães da Areia eram como homens, eram iguais a homens. Toda a
diferença estava no tamanho. (...) Quando outras crianças só se preocupavam com
brincar, estudar livros para aprender a ler, eles se viam envolvidos em
acontecimentos que só homens sabiam resolver. Sempre tinham sido como homens,
na sua vide de miséria e de aventura, nunca tinham sido perfeitamente crianças.
Porque o que faz a criança é o ambiente de casa, pai, mãe, nenhuma responsabilidade.
Nunca eles tiveram pai e mãe na vida da rua. E tiveram sempre que cuidar de si
mesmos, foram sempre os responsáveis por si.”
Jorge Amado do livro Capitães da Areia*
(Na minha opinião, o
melhor livro do autor)
O mar. Tenho deixado de ir ao mar por indolência.
E também por impaciência com o ritual necessário:
barraca, areia colada por toda a pele. (...)
Tenho uma conhecida que mora na Zona Norte (...)
e prometi que ela viria em casa para entrarmos
no mar às seis horas da manhã. Por quê?
Porque é a hora da grande solidão do mar.
Como explicar que o mar é o nosso berço materno, mas
que
seu cheiro seja todo masculino; no entanto berço
materno?
Talvez se trate da fusão perfeita do masculino com o
feminino.
Às seis horas da manhã as espumas são mais brancas.
Clarice Lispector - O
mar de manhã
do livro Crônicas para jovens do Rio de Janeiro e
seus personagens
Recife
Não a Veneza americana
Não a Maurisstad doa amadores
das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a
amar depois –
Recife das revoluções
libertárias
Mas o Recife sem história nem
literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância
(...)
Atrás de casa ficava a rua da
Saudade...
...onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da rua
Aurora...
...onde se is pescar escondido
Capibaribe
- Capibaribe
(...)
Um dia eu vi uma moça nuinha no
banho
Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu
Foi o meu primeiro alumbramento.
Manuel Bandeira -
Evocação do Recife do livro Melhores
poemas de Manuel Bandeira
Mário Quintana - O
mesmo assunto do livro Caderno H
“(...) Basta dizer que era
outono em Porto Alegre.
Eu disse ao visitante:
- Está vendo?
As cores não se misturam:
tudo parece recortado
a tesourinha no horizonte.
A paisagem de Porto Alegre
é anterior ao impressionismo.
Ele agachava-se, apertava,
arregalava os olhos,
concordando com tudo.
E, de regresso ao Rio, escreveu:
“Como eles não têm nada que
mostrar; gabam os crepúsculos!”
E convocou os jangadeiros da
praia,
os donos das aves de pau, com
asas brancas de pano.
Os leva e traz da terra e mar...
E, no meeting que as ondas
aplaudiam,
batendo palmas na areia branca,
ouviu-se a jura solene:
Nunca mais a sombra preta de um
cativo
mancharia a consciência branca
de suas velas!
(...)
Os jangadeiros juraram
e cumpriram o juramento,
e foi assim que acabou o vaivém
trágico da mercadoria negra...
Rachel de Queiroz –
Nascimento do livro Mandacaru
Oswald de Andrade –
do livro Um homem sem profissão
“Numa manhã doirada da cidade,
encontrei Daisy na Rua 15, esquina do Largo do Tesouro. Despedimo-nos depois de
ligeira conversa. Olho para trás e vejo seu chapéu flutuar descendo a Rua 15.
Sigo-a sem saber até hoje por quê. Ela atravessa a Praça Antônio Prado, desde a
Avenida São João, envereda pela Rua Anhangabaú por debaixo do Viaduto Santa
Ifigênia. Acompanho-a de perto, agora interessado. Ela para à porta de uma das
casas amarelas e iguais que defrontam o Cassino Antártica. Eu abordo o moço e
pergunto quem mora ali. – “É uma pensão de rapazes”.”
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