domingo, 1 de junho de 2014

Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac



Olavo Bilac por Loredano

(O nome já é um verso alexandrino)

Histórias de sua vida

Refugiado em Minas Gerais para escapar do Marechal Floriano Peixoto, Olavo Bilac permaneceu longe do Rio uma longa temporada, sofrendo em seu íntimo a saudade da terra carioca.

Atribuíram-lhe a autoria de muitos versos terrivelmente venenosos que publicavam em O Combate contra o ditador. Daí a perseguição policial que o obrigou a refugiar-se à sombra das montanhas mineiras.

Um belo dia recebe ele a notícia de que podia regressar ao Rio. Não era político nem revolucionário, por que haveria de temer? E Bilac, confiante, mete-se no trem, de volta à roda boêmia da Rua do Ouvidor.

Ao saltar na estação da Central, tem esta surpresa: a Polícia, alertada de seu regresso, deita-lhe a mão, conduzindo-o ao Quartel, para o tormento dos interrogatórios, a que se segue a prisão incomunicável.

É dali, burlando a vigilância que apertava a guarda à sua volta, que Bilac manda a Coelho Neto este desabafo em forma de soneto:

Em custódia

Quatro prisões, quatro interrogatórios...
                  Há três anos que as solas dos sapatos
Gasto, a correr de Herodes a Pilatos,
Como Cristo, por todos os pretórios!

Pulgas, baratas, percevejos, ratos...
Caras sinistras de espiões notórios...
Fedor de escarradeiras e mictórios...
Catingas de secretas e mulatas...

Para tantas prisões é curta a vida!
Ó Dutra! Ó Melo! Ó Valadão! Ó diabo!
Vinde salvar-me! Vinde em meu socorro!

Livrai-me desta fama imerecida,
Fama de Ravachol, que arrasta ao rabo,
Como uma lata ao rabo de um cachorro!

Estrabismo do poeta

Estava Bilac à porta da Colombo, numa segunda-feira de Carnaval, quando um mascarado se aproxima e lhe pergunta:

- Esse teu estrabismo não te faz as imagens duplicadas?

E o poeta, que havia reconhecido o mascarado:

- Sempre que te olho, vejo de fato quatro pés.

O culto da perfeição

Um mês antes de morrer, Olavo Bilac apanhou das gavetas, onde guardava os seus manuscritos, os originais de três poemas e três dramas em verso, a que não dera o derradeiro polimento, e jogou-os às brasas de um fogareiro que mandara trazer ao seu quarto.

E ante a estranheza da irmã e de um sobrinho, que assistiam à cena:

- A obra de arte é uma questão de qualidade e não de quantidade. Quem, como eu, prezou o estilo e a forma, deve ter o orgulho de artista do velho Boileau, e o velho Boileau ensina, através de seu Horácio: Policez e repolicez sans cesse.

E como a irmã e o sobrinho, estarrecidos, lhe perguntaram por que destruía no fogo os seus versos, responde com melancolia:

- Não terei tempo de acabar mais nada.

E atirou ao fogareiro a última folha dos originais imperfeitos, fiel à “Profissão de Fé” da página de abertura de suas Poesias:

Torce, aprimora, alteia, lima
A frase. E, enfim,
No verso de ouro, engasta a rima,
Como um rubim.

Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem nenhum defeito...

O último desejo

Prodigioso trabalhador literário, não obstante ter pago tributo largo à vida boêmia na sua mocidade, Olavo Bilac, no seu leito de enfermo, voltava a escrever, sempre que a doença lhe concedia uma pequena trégua, minorando os seus sofrimentos.

A 18 de dezembro de 1918, ao apontar da primeira claridade do dia, ele se ergueu no leito, querendo dirigir-se à mesa de trabalho:

– Já raia a madrugada – disse o doente, reconhecendo a luz do sol a insinuar-se no aposento.

E num pedido:

– Deem-me café. Vou escrever.

Mas as forças lhe faltaram e o poeta, logo depois, sem outra palavra, entrou em agonia.


Olavo Bilac por Netto

Do livro “Pequeno Anedotário da Academia Brasileira”, 
de Josué Montello.




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