Olavo Bilac por Loredano
(O nome já é um verso alexandrino)
Histórias de sua vida
Refugiado em Minas Gerais para
escapar do Marechal Floriano Peixoto, Olavo Bilac permaneceu longe do Rio uma
longa temporada, sofrendo em seu íntimo a saudade da terra carioca.
Atribuíram-lhe a autoria de muitos
versos terrivelmente venenosos que publicavam em O
Combate contra o ditador. Daí a perseguição policial que
o obrigou a refugiar-se à sombra das montanhas mineiras.
Um belo dia recebe ele a notícia de que podia regressar ao Rio. Não era
político nem revolucionário, por que haveria de temer? E Bilac, confiante,
mete-se no trem, de volta à roda boêmia da Rua do Ouvidor.
Ao saltar na estação da Central, tem
esta surpresa: a Polícia, alertada de seu regresso, deita-lhe a mão,
conduzindo-o ao Quartel, para o tormento dos interrogatórios, a que se segue a
prisão incomunicável.
É dali, burlando a vigilância que
apertava a guarda à sua volta, que Bilac manda a Coelho Neto este desabafo em
forma de soneto:
Em custódia
Quatro prisões, quatro
interrogatórios...
Há três anos que as solas dos sapatos
Há três anos que as solas dos sapatos
Gasto, a correr de Herodes a Pilatos,
Como Cristo, por todos os pretórios!
Pulgas, baratas, percevejos, ratos...
Caras sinistras de espiões notórios...
Fedor de escarradeiras e mictórios...
Catingas de secretas e mulatas...
Para tantas prisões é curta a vida!
Ó Dutra! Ó Melo! Ó Valadão! Ó diabo!
Vinde salvar-me! Vinde em meu socorro!
Livrai-me desta fama imerecida,
Fama de Ravachol, que arrasta ao rabo,
Como uma lata ao rabo de um cachorro!
Estrabismo do poeta
Estava Bilac
à porta da Colombo, numa segunda-feira de Carnaval, quando um mascarado se
aproxima e lhe pergunta:
- Esse
teu estrabismo não te faz as imagens duplicadas?
E o poeta,
que havia reconhecido o mascarado:
-
Sempre que te olho, vejo de fato quatro pés.
O culto da perfeição
Um mês antes de morrer, Olavo Bilac
apanhou das gavetas, onde guardava os seus manuscritos, os originais de três
poemas e três dramas em verso, a que não dera o derradeiro polimento, e
jogou-os às brasas de um fogareiro que mandara trazer ao seu quarto.
E ante a
estranheza da irmã e de um sobrinho, que assistiam à cena:
- A obra de arte é uma
questão de qualidade e não de quantidade. Quem, como eu, prezou o estilo e a
forma, deve ter o orgulho de artista do velho Boileau, e o velho Boileau
ensina, através de seu Horácio: Policez e
repolicez sans cesse.
E como a irmã e o sobrinho, estarrecidos,
lhe perguntaram por que destruía no fogo os seus versos, responde com
melancolia:
- Não
terei tempo de acabar mais nada.
E atirou ao fogareiro a última folha
dos originais imperfeitos, fiel à “Profissão de Fé” da página de abertura de
suas Poesias:
Torce, aprimora, alteia, lima
A frase. E, enfim,
No verso de ouro, engasta a rima,
Como um rubim.
Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem nenhum defeito...
O último desejo
Prodigioso trabalhador literário,
não obstante ter pago tributo largo à vida boêmia na sua mocidade, Olavo Bilac,
no seu leito de enfermo, voltava a escrever, sempre que a doença lhe concedia
uma pequena trégua, minorando os seus sofrimentos.
A 18 de dezembro de 1918, ao
apontar da primeira claridade do dia, ele se ergueu no leito, querendo
dirigir-se à mesa de trabalho:
– Já raia a madrugada – disse o doente, reconhecendo a luz
do sol a insinuar-se no aposento.
E num pedido:
– Deem-me café. Vou escrever.
Mas as forças lhe faltaram e o poeta, logo depois, sem outra
palavra, entrou em agonia.
Do livro “Pequeno
Anedotário da Academia Brasileira”,
de Josué Montello.
de Josué Montello.
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