O samba pode ser narrativo ou não. E
o choro raramente tem letra. Mas, quando eles vão para a cama, o que resulta do
nheco-nheco -
o samba-choro – conta sempre uma história. Mais exatamente, uma historinha, um
“conto mínimo”, em que o amor esgrima com o humor e em que o “sentimento” nunca
leva vantagem sobre a mordacidade, o sarcasmo e, às vezes, o mais puro cinismo,
Cada letra é um sketch, um ato cômico, tratando a infalível guerra entre os
sexos -
uma guerra em que, no samba-choro, nenhum dos dois, homem e mulher, é
exatamente um santo. Daí a alta incidência de duetos (quase duelos) no se
repertório.
“Tem que rebolar”, de José Batista e
Magno de Oliveira, criação original de Elizeth Cardoso e Ciro Monteiro, em
1966.
-
Moreninha linda, moreninha boa, quer se casar comigo ser minha patroa?
- Sai
fora, mulato, vê lá se me passo, me casar contigo é coisa que eu não faço.
- Eu tenho a grana e a
minha cor não pega...
-
Somente a sua grana pode interessar...
- Mas
pra botar a mão na minha grana, você tem que rebolar, rebolar, rebolar.
-
Mulato atrevido, está me maltratando, o rebolar é novo modo de gingar.
-
Fique sossegada, isso não maltrato, é um ditado novo, é jeito de dançar.
- Mas
se o papai souber disso, se zanga, vai lhe chamar de feio, vai lhe rebentar.
- Mas
pro seu pai bater neste mulato, também tem que rebolar, rebolar, rebolar.
Carmen Miranda por Miécio
“Quem é?”, de Custódio Mesquita e
Joracy Camargo, com Carmen Miranda e Barbosa Júnior, em 1937.
Carmen
Miranda:
Quem é que
muda os botõezinhos da camisa?
Quem é que diz um adeusinho no portão?
E de manhã não faz barulho quando pisa
E quando pedes qualquer coisa não diz não?
Quem é que diz um adeusinho no portão?
E de manhã não faz barulho quando pisa
E quando pedes qualquer coisa não diz não?
Quem é que sempre dá o laço na gravata?
Quem é que arruma teus papéis na escrivaninha?
Quem é que faz o teu bifinho com batatas
E estraga tanto as lindas mãos lá na cozinha?
E no entretanto é só você que não me liga
E ainda descobre sempre em mim cada defeito,
Pois é talvez porque eu sou muito sua amiga
E nunca estás
por isso mesmo satisfeito.
Quem é que reza por você lá no oratório?
Quem é que
espera por você sempre chorando?
Quem é que sabe que não paras no escritório
E acredita que estiveste trabalhando?
Quem é que sabe que não paras no escritório
E acredita que estiveste trabalhando?
Quem é que trata dos botões da tua roupa?
Quem é que mais economiza luz e gás?
Quem é que sopra no jantar a tua sopa?
Quem é que diz no telefone que não estás?
E no entretanto você pensa em me deixar,
Anda dizendo que eu sou qual não sei o quê.
E no entretanto você vai me abandonar,
Mas é porque eu sou louquinha por você.
Barbosa
Júnior:
-
Espera lá!
Quem é que paga a costureira o ano inteiro?
Quem é aluga um automóvel todo mês?
Quem é que paga o seu chatô, sua empregada?
Quem é que gasta os cobres todos de uma vez?
Quem é que paga a costureira o ano inteiro?
Quem é aluga um automóvel todo mês?
Quem é que paga o seu chatô, sua empregada?
Quem é que gasta os cobres todos de uma vez?
Quem é que vive esbodegado, amofinado
E que trabalha noite e dia sem parar?
Quem é que só para o seu luxo extravagante
Fica sem ter um niquelzinho pra gastar?
E no entretanto é só você que não me liga,
Todas as outras estão querendo o meu amor,
Se eu fosse um pouco mais pão-duro e menos trouxa,
Você me dava, com certeza, mais valor.
Quem é que
finge que não vê o seu namoro?
Quem é que dorme se você quer passear?
Quem é que espera por você sempre sorrindo
Quem é que dorme se você quer passear?
Quem é que espera por você sempre sorrindo
E cochilando
fica, às vezes, sem jantar?
Quem é que traz os embrulhinhos todo dia?
Quem é que compra tanta coisa na cidade?
Quem é que não me liga nem um bocadinho?
Quem é que faz comigo assim tanta maldade?
E no entretanto aturo tudo tão quietinho,
Fico calado sem dizer nada a ninguém.
Você precisa dar valor ao meu carinho,
Precisa ver que, finalmente, eu sou alguém.
Carmen
Miranda:
E no
entretanto você pensa em me deixar
Anda dizendo que eu sou qual, não sei o quê.
E no entretanto você vai me abandonar
Mas é porque... eu sou louquinha por você...
Anda dizendo que eu sou qual, não sei o quê.
E no entretanto você vai me abandonar
Mas é porque... eu sou louquinha por você...
Carmen Miranda por Baptistão
“Boneca de piche”, de Ary Barroso e Luiz Iglesias, com Carmen Miranda e
Almirante, em 1938.
Almirante:
Venho danado com meus calo quente,
Quase enforcado no meu colarinho,
Venho empurrando quase toda a gente,
Quase enforcado no meu colarinho,
Venho empurrando quase toda a gente,
Eh! Eh!
Pra ver meu benzinho.
Pra ver meu benzinho.
Eh! Eh!
Pra ver meu
benzinho.
Carmen:
Nego tu veio quase num arranco,
Cheio de dedo dentro dessas luva,
Cheio de dedo dentro dessas luva,
Tem um
ditado que diz:
Nego de
branco,
Eh! Eh!
É sinar de chuva.
É sinar de chuva.
Eh! Eh!
É sinar de
chuva.
Almirante:
Da cor do
azeviche, da jabuticaba
Boneca de piche, é tu que me acaba.
Sou preto e meu gosto, ninguém me contesta,
Mas há muito branco com pinta na testa.
Boneca de piche, é tu que me acaba.
Sou preto e meu gosto, ninguém me contesta,
Mas há muito branco com pinta na testa.
Carmen:
Tem
português assim nas minhas água,
Que culpa eu tenho de ser boa mulata.
Nego, se tu borrece minhas mágoa,
Que culpa eu tenho de ser boa mulata.
Nego, se tu borrece minhas mágoa,
Eh! Eh!
Eu te dou a lata.
Eu te dou a lata.
Eh! Eh!
Eu te dou
lata.
Almirante:
Não me
farseia, ó muié canalha,
Se tu me engana vai haver banzé
Eu te sapeco dois rabo-de-arraia,
Se tu me engana vai haver banzé
Eu te sapeco dois rabo-de-arraia,
Eh!, Eh!
E te piso o pé.
E te piso o pé.
Eh! Eh!
E te piso o
pé.
Carmen:
Da cor do
azeviche, da jabuticaba,
Boneca de piche, sou eu quem te acaba.
Tu é preto e tem gosto, ninguém te contesta,
Mas há muito branco com pinta na testa.
Boneca de piche, sou eu quem te acaba.
Tu é preto e tem gosto, ninguém te contesta,
Mas há muito branco com pinta na testa.
Almirante:
Sou preto e
meu gosto ninguém me contesta,
Mas há muito branco com pinta na testa.
Mas há muito branco com pinta na testa.
“Joujoux e
Balangandãs”, de Lamartine Babo, c
om Mário Reis e Mariah, de 1939.
om Mário Reis e Mariah, de 1939.
- Joujoux!
Joujoux!
- Que
é, meu Balangandã?
- Aqui estou eu.
- Aqui estou eu.
- Aí
estás tu.
- Minha Joujoux!
- Minha Joujoux!
- Meu
Balangandã!
- Nós dois, depois, o sol do amor que manhãs!
- Nós dois, depois, o sol do amor que manhãs!
- De
braços dados, dois namorados.
- Já sei, Joujoux.
- Já sei, Joujoux.
-
Balagandã.
- Seja
em Paris
- Ou
nos Brasis,
- Mesmo
distantes,
- Somos constantes.
- Tudo
nos une, que coisa rara,
- No amor, nada nos separa.
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