“Curare” é o segundo sucesso de
Alberto de Castro Simões da Silva, o afamado boêmio carioca Bororó,
violonista e compositor nas horas vagas, cuja obra praticamente se resume a
duas músicas, Curare e Da cor do pecado, ambas clássicos.
Bororó - 1898 - 1986
Bororó foi o padrinho da carreira
artística de Orlando Silva,
que em 1939 ficou enciumado por não ter gravado “Da cor do
pecado”, o outro clássico, lançado por Sílvio Caldas.
Então o compositor deu-lhe “Curare”, como compensação. Além da letra brejeira,
a construção harmônica da segunda parte, especialmente a frase final, uma
seqüência avançada para época, tornam este samba atraente para intérpretes,
como João Gilberto, interessados em músicas de concepção mais elaborada.
Esta música tem diferentes interpretações e diferentes grafias na sua letra. No texto abaixo, mantivemos a interpretação de Orlando Silva, gravação de 14 de agosto de 1940.
Curare − 1940
Você
tem boniteza
e
a natureza foi quem agiu.
Com esse óio de índia,
Com esse óio de índia,
curare
no corpo,
que
é bem Brasil.
Tu
é toda a Bahia,
é
a flô do mocambo
da
gente de cô.
Faz do amor confusão,
numa misturação
bem
banzeira e inzoneira,
que
tem raça e tradição.
Quebra, machuca minha dô
Nega, neguinha,
tudo,
tudinho,
meu amorzinho.
meu amorzinho.
Com
essa boquinha vermelhinha,
rasgadinha,
Qui
tem veneno como quê.
Conta tristeza e alegria pro seu bem.
E tudo vive a dizer:
Que você é diferente
Conta tristeza e alegria pro seu bem.
E tudo vive a dizer:
Que você é diferente
dessa
gente que finge querê.
No livro - A Canção no Tempo -
Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello relatam que “a musa dos versos chamava-se
Felicidade, uma mulher de vida pregressa pouco recomendável, que trabalhava em
frente ao Tribunal de Justiça e lhe foi apresentada por Jaime Távora, oficial
do gabinete do ministro José Américo. Iniciou-se assim um romance de vários
anos em que Bororó
foi responsável pela mudança de vida da moça. Mais tarde ela se casaria com um
médico, tendo morrido ainda jovem em conseqüência de uma gripe mal curada”.
“Da cor do pecado” permanece como
um clássico sendo gravada por grandes nomes da nossa MPB como Elis Regina, João
Gilberto, Nara Leão, Ney Matogrosso, Jacob do Bandolim e Luíz Bonfá.
Da cor do pecado
Esse
corpo moreno,
Cheiroso
e gostoso,
Que
você tem.
É
um corpo delgado,
Da
cor do pecado,
Que
faz tão bem.
Esse
beijo molhado,
Escandalizado,
Que
você me deu.
Tem
sabor diferente,
Que
a boca da gente
Jamais
esqueceu.
E
quando você me responde
Umas
coisas com graça,
A
vergonha se esconde,
Porque
se revela a maldade da raça,
Esse
corpo de fato
Tem
cheiro de mato,
Saudade,
tristeza,
Essa
simples beleza,
Esse
corpo moreno,
Morena
enlouquece.
Eu
não sei nem por quê,
Só
sinto na vida
O
que vem de você.
“As duas
canções-mestras de Bororó elevam o erotismo que desde cedo embalou a
sensibilidade e o sentimento musical do povo brasileiro a um nível tão extremo
de realização, que nele já não se acha qualquer vestígio de vulgaridade. E o
curioso é que esse erotismo puro, decantado, seja alcançado não por uma recusa
ou por um distanciamento dos elementos tradicionalmente tidos como vulgares (a
carne, o sexo), mas pela exaltação livre destes mesmos elementos. Por uma série
de manobras poético-musicais, nas duas canções o corpo é plenamente afirmado em
sua alegria física, sem que venha a se tornar uma coisa, um objeto oco, sem
rosto, em total submissão frente aos impulsos básicos do organismo, da matéria”.
(Paulo da Costa e Silva).
Fonte:
A Canção no Tempo - 85 Anos de
Músicas Brasileiras, Vol 1: 1901-1957 / Jairo Severiano e Zuza Homem de
Mello. - São Paulo: Ed. 34, 1997. -Site e blog do IMS.
Orlando Silva, “O Cantor das
Multidões”, em 1940.
letra musica Que e que e
ResponderExcluirSegundo consta, Bororó fez a letra e a música de ambas composições.
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