sábado, 31 de outubro de 2015

As Normas de George Washington



Quando estava no décimo quarto ou décimo quinto ano de vida, o jovem George Washington mantinha consigo um livro muito divulgado na época, intitulado Formas de Escrever. Entre os itens que compunham esta miscelânea, este livro continha uma lista de 110 “Regras de Civilidade e Comportamento Decente na Companhia dos Outros e Durante a Conversação”. Muitos escritores, incluindo Washington Irving, o Dr. J.M. Toner e Moncure Conway, discutiram as possíveis fontes dessas máximas, e parece provável que tenham sua origem em jesuítas franceses do século XVI. Algumas dessas regras estão reproduzidas abaixo, como afirmou Conway, “na esperança de que farão algo mais do que divertir o leitor devido à sua natureza extravagante”.

(Trecho do livro A Miscelânea Original de Schott, de Ben Schott)


1ª Qualquer ação realizada na Companhia de alguém deve ocorrer com algum Sinal de Respeito para com os que estão presentes.

2ª Quando na Companhia de alguém, não ponha as mãos em nenhuma parte do corpo que normalmente esteja descoberta.

6ª Não Durma quando os outros falam, não se Sente quando outros estão de pé, não Fale quando deveria manter-se em silêncio, não Ande quando os outros pararem.

16ª Não encha as Bochechas, não ponha a língua para fora, esfregue as Mãos, ou a barba, espiche ou morda os lábios, nem mantenha os lábios abertos demais ou fechados demais.

19ª Cuide para que sua postura seja agradável, mas, diante de assuntos sérios, com um aspecto mais circunspecto.

22ª Não demonstre alegria com a Desgraça alheia, mesmo que se trate de um inimigo.

38ª Ao visitar os Doentes, não assuma o papel de Médico se não tem conhecimento para tanto.

54ª Não banque o Pavão, preocupando- se sempre e por toda parte em Saber se está bem Posto, se seus sapatos são apropriados, se suas Meias caem bem e se suas Roupas parecem bonitas.

85ª Na Companhia de outros de mais Alta Posição do que você, não fale até que lhe tenham feito uma Pergunta, então Levante, tire o Chapéu e Responda com poucas palavras.

107ª Se outros à Mesa estão falando, mostre-se atento, mas não fale com um pedaço de Carne na sua Boca.

110ª Esforce-se para manter viva no Peito esta Pequena Centelha de Fogo Celestial chamada Consciência.

*****

A exata formulação de algumas das normas perdeu-se devido aos estragos no texto provocados pelos ratos.


À mulher de César não basta ser honesta


Por Adriano Enivaldo de Oliveira (1)


Não há frase de Caio Júlio César mais repetida em nossos tempos do que “À mulher de César não basta ser honesta, tem de parecer honesta”.

A expressão do século I antes de Cristo cruzou milênios e tem sido aplicada às situações diversas, desde as relações amorosas até a higiene de restaurantes. Os motivos do tempo e da generalização são bastante para justificar uma reflexão sobre a frase, seu autor e seu contexto. 

O autor da frase é um dos homens mais conhecidos da História. Jurista (2), orador (3), sacerdote (4), escritor (5) general (6) e político (7), César era muito famoso, também, pelos casos amorosos que mantinha com as esposas de seus adversários políticos.

Por haver sido acusado falsamente, na juventude, de ter tido relação homossexual com o rei Nicomedes, a fim de garantir o apoio da Bitínia em uma empreitada romana – mentira explorada por seus adversários durante décadas – César seguiu o conselho da mãe, Aurélia, de responder a estes adversários seduzindo suas esposas de modo público e notório. O que fazia com reconhecido êxito.

Delineado infimamente alguns traços de César, é preciso esclarecer que teve várias esposas (Cornélia, Pompeia, Calpúrnia), razão pela qual temos duas versões sobre a origem da frase.

A primeira versão teria ocorrido com a esposa Pompeia, durante a festa da deusa romana Bona Dea. Durante à noite dessa festividade os homens não podiam participar. De acordo com a história um nobre chamado Clódio teria se disfarçado de mulher para tentar se aproximar e seduzir a bela Pompeia. Descoberto e preso, foram ambos (Pompeia e Clódio) inocentados da acusação. Mesmo assim César se separou da mulher afirmando que ela era inocente, mas que sua imagem pública ficaria maculada se sua esposa, além de honesta, não parecesse honesta.

A segunda versão teria sido com a esposa Calpúrnia. De acordo com a história César, que mantinha um caso amoroso com Cleópatra em Alexandria, teria encarregado um aliado de voltar a Roma e espalhar o boato de que Calpúrnia o estava traindo.

Ao argumento do aliado de que isso era mentira César foi enfático na ordem para espalhar o boato. Alguns meses depois, retornando a Roma, César entrou em casa, chamou pela esposa e disse-lhe que queria o divórcio. Tendo Calpúrnia indagado o motivo disse-lhe: “porque dizem que estás me traindo”. A esposa fiel argumentou que isso era não era verdade. Como resposta recebeu a afirmativa que “à mulher de César não basta ser honesta, tem que parecer honesta”.

Independe de qual versão seja a verdadeira o caso mostra duas facetas. A verdade, mesmo conhecida, foi ignorada em prol das aparências; e os motivos que geraram a frase foram indignos.

Num mundo que supervaloriza a imagem e as aparências – embora com certa hipocrisia pregue que “o ser” é mais importante que “o parecer” – facilmente se explica porque a frase ganhou popularidade. Oxalá aqueles que a empreguem no futuro saibam, ao menos, que estão valorizando as aparências em detrimento da verdade.

*****

(1) Juiz federal e professor universitário.

(2) Foi o pretor urbano em Roma.

(3) Cícero o considerava um dos melhores oradores.

(4) Foi flamen dialis (sacerdote especial de Júpiter) e o Pontífice máximo (chefe da religião romana).

(5) A Guerra das Gálias e a Guerra Civil, são suas obras mais famosas.

(6) Foi aclamado imperator, que significa general vitorioso.

(7) Ocupou postos como cônsul e ditador.


A marca que você deixa nas pessoas



Quando eu era criança, bem novinho, meu pai comprou o primeiro telefone da nossa vizinhança. Eu ainda me lembro daquele aparelho preto e brilhante que ficava na cômoda da sala. Eu era muito pequeno para alcançar o telefone, mas ficava ouvindo fascinado enquanto minha mãe falava com alguém. Então, um dia, eu descobri que dentro daquele objeto maravilhoso morava uma pessoa legal. O nome dela era “Uma informação, por favor” e não havia nada que ela não soubesse. “Uma informação, por favor” poderia fornecer qualquer número de telefone e até a hora certa. 

Minha primeira experiência pessoal com esse gênio na garrafa veio num dia em que minha mãe estava fora, na casa de um vizinho. Eu estava na garagem mexendo na caixa de ferramentas quando bati em meu dedo com um martelo. A dor era terrível, mas não havia motivo para chorar, uma vez que não tinha ninguém em casa para me oferecer a sua simpatia. Eu andava pela casa, chupando o dedo dolorido, até que pensei: o telefone!!! Rapidamente fui até o porão, peguei uma pequena escada que coloquei em frente à cômoda da sala. Subi na escada, tirei o fone do gancho e segurei contra o ouvido. Alguém atendeu e eu disse: - “Uma informação, por favor”. Ouvi uns dois ou três cliques e uma voz suave e nítida falou em meu ouvido. “Informações”. - “Eu machuquei o meu dedo...”. disse, e as lágrimas vieram facilmente, agora que eu tinha audiência. “A sua mãe não está em casa?”, ela perguntou. “Não tem ninguém aqui...”, eu soluçava. “Está sangrando?” “Não.”, respondi. “Eu machuquei o dedo com o martelo, mas tá doendo...” “Você consegue abrir o congelador?”, ela perguntou. Eu respondi que sim. “Então pegue um cubo de gelo e passe no seu dedo”, disse a voz.

Depois daquele dia, eu ligava para “Uma informação, por favor” por qualquer motivo. Ela me ajudou com as minhas dúvidas de Geografia e me ensinou onde nascia o rio Amazonas. Ela me ajudou com os exercícios de matemática. Ela me ensinou que o pequeno esquilo que eu trouxe do bosque deveria comer nozes e frutinhas. Então, um dia, Pety, meu canário, morreu. Eu liguei para “Uma informação, por favor” e contei o ocorrido. Ela escutou e começou a falar aquelas coisas que se dizem para uma criança que está crescendo. Mas eu estava inconsolável. Eu perguntava: “Por que é que os passarinhos cantam tão lindamente e trazem tantas alegrias para a gente para, no fim, acabar como um monte de penas no fundo de uma gaiola?” Ela deveria ter compreendido a minha preocupação, porque acrescentou mansamente. “Paulo, sempre lembre que existem outros mundos onde a gente pode cantar também...” De alguma maneira, depois disso eu me senti melhor. No outro dia, lá estava eu de novo. “Informações”, disse a voz já tão familiar. “Você sabe como se escreve ‘exceção’?” Tudo isso aconteceu na minha cidade natal ao norte do Estado.

Quando eu já tinha 9 anos, nos mudamos para Porto Alegre. Eu sentia muita falta da minha amiga. “Uma informação, por favor” pertencia a aquele velho aparelho telefônico preto, e eu não sentia nenhuma atração pelo nosso novo aparelho telefônico branquinho que ficava na nova cômoda na nova sala. Conforme eu crescia, as lembranças daquelas conversas infantis nunca saíam da minha memória. Freqüentemente, em momentos de dúvida ou perplexidade, eu tentava recuperar o sentido calmo de segurança que eu tinha naquele tempo. Hoje eu entendo como ela era paciente, compreensiva e gentil ao perder tempo atendendo as ligações de um molequinho.

Alguns anos depois, quando eu estava indo para a faculdade, meu avião teve uma escala em Vacaria. Eu teria mais ou menos meia hora entre os dois voos. Falei ao telefone com minha irmã, que morava lá, por 15 minutos. Então, sem, nem mesmo sentir que estava fazendo isso, disquei o número da operadora daquela minha cidade natal e pedi. “Uma informação, por favor.” Como num milagre, eu ouvi a mesma voz doce e clara que conhecia tão bem, dizendo: “Informações.” Eu não tinha planejado isto, mas me peguei perguntando: “Você sabe como se escreve ‘exceção’?” Houve uma longa pausa. Então, veio uma resposta suave:  “Eu acho que seu dedo já melhorou, Paulo.” Eu ri. “Então, é você mesma!!”, eu disse. “Você não imagina como era importante para mim naquele tempo.” “Eu imagino”, ela disse. “E você não sabe o quanto significavam para mim aquelas ligações. Eu não tenho filhos e ficava esperando todos os dias que você ligasse.” Eu contei para ela o quanto pensei nela todos esses anos e perguntei se poderia visitá-la quando fosse encontrar minha irmã. “É claro”, ela respondeu, “venha até aqui e chame a Célia, meu nome.”

Três meses depois, eu fui a Vacaria visitar minha irmã. Quando liguei, uma voz diferente respondeu: “Informações” Eu pedi para chamar a Célia. “Você é amigo dela?”, a voz perguntou. “Sou um velho amigo. O meu nome é Paulo.” “Eu sinto muito, mas a Célia estava trabalhando aqui apenas meio período, porque estava doente. Infelizmente ela morreu há cinco semanas.” Antes que eu pudesse desligar, a voz perguntou: “Espere um pouco. Você disse que seu nome é Paulo?” “Sim.” “A Célia deixou uma mensagem para você. Ela escreveu e pediu para eu guardar caso você ligasse. Eu vou ler para você. A mensagem dizia: “Diga a ele que eu ainda acredito que existem outros mundos onde a gente pode cantar também. Ele vai entender.” Eu entendi... e como eu entendi...

(Texto de autor desconhecido adaptado ao Sul)


A Lenda do rei Capenga-2



(Bastos Tigre)

- Com Prova de Texto -

Do livro: Comunicação Interpretação de Roberto Augusto Soares Leite, Amaro Ventura Nunes e Rosa Erman Companhia Editora Nacional. 

Em certo reino um rei havia
De nobre estirpe secular
Que começou, um belo dia,
Do pé direito capengar.

Um calo enorme era o motivo
Que dava ao rei um tal cacoete:
Calo feroz, duro, agressivo,
Plantado sobre o real joanete.

Mas essa causa assim plebeia
Ficava mal de publicar;
E toda a corte teve a ideia
De andar coxeando, a capengar.

Príncipes, duques e marqueses,
Viscondes, condes e barões
Andavam, coxos e corteses,
Com mil mesuras a capengar.

Desde a nobreza solarenga
Ao camponês da rude grei,
Tudo no reino era capenga
Para “engrossar” o velho rei.

E o rei sorria, satisfeito,
Por ser benquisto e popular;
Não era mais nenhum defeito,
Naquele reino, o capengar.

Mas eis que, um dia, um tipo surge,
Em passo firme, andando bem;
O povo, unânime, se insurge,
E a corte a fúria não contém.

Possessa, diz toda a cidade:
– Castigo dê-se-lhe, exemplar!
Crime é de lesa-majestade
Viver, aqui, sem capengar.

É preso o infame; e logo o júri
Se reúne ali dos cidadãos,
Para que o crime, enfim, se apure,
E o vil, da lei, caia nas mãos.

E clama o júri: - o reino insulta!
O nosso rei tenta aviltar!
E ruge e freme a turbamulta,
De um lado a outro, a capengar.

Mas fala o réu: - Por Jesus Cristo,
Não me mandeis para as galés!
Se ando direito é só por isto
Eu sou capenga dos dois pés...

01) O rei começou a capengar porque:

(A)  era moda.
(B)  a lei o exigia.
(C)  os médicos não curaram os ferimentos da batalha.
(D)  o calo lhe doía no pé.
(E)  queria ver quais eram os súditos fiéis.

02) Ficava mal publicar o verdadeiro motivo que levava o rei a capengar porque:

(A)  não havia realmente nenhum motivo. .
(B)  o motivo não era nobre.
(C)  o povo gostava do seu rei.
(D)  esse defeito era considerado crime
(E)  o rei era de estirpe secular.

03) Toda a corte (e depois a burguesia e o povo) começou a capengar. O verdadeiro motivo para isto era:

(A)  bajulação.  .
(B)  irreverência. .
(C)  gozação.
(D)  compaixão.
(E)   inconformismo

04) A palavra do texto que confirma o motivo que você apontou no item anterior é:

(A)  solarenga.
(B)  benquisto.
(C)  “engrossar”
(D)  esdrúxulo.
(E)   plebeia.

05) Assinale o dito popular que se pode aplicar a tal situação.

(A)  Em terra de cego quem tem um olho é rei.
(B)  Palavra de rei não volta atrás.
(C)  Rei morto, rei posto.
(D)  Dai a César o que é de César.
(E)  Agrada ao rei e terás seus favores.

06) O tipo que surge andando bem é acusado de crime e infâmia. Desse fato podemos concluir que:

(A)  crime e infâmia são conceitos imutáveis em qualquer parte do mundo
(B)  os conceitos de crime e infâmia se baseiam muitas vezes em interesses e convenções arbitrárias.
(C)  só os juizes podem decidir, sem erro, o que é crime e infâmia.
(D)  as leis só existem para condenar os criminosos.
(E)  louco não responsável perante a lei.

07) Ao se justificar dizendo: “Eu sou capenga dos dois pés...”, pode-se dizer que o réu se lembrou do ensinamento contido no seguinte provérbio:

(A)  Em terra de louco, faze-te de louco.
(B)  Não deixes para amanhã o que podes fazer hoje.
(C)  Quem com ferro fere com ferro será ferido.
(D)  Duro com duro não faz bom muro.
(E)   Quem ama o feio bonito lhe parece.

08) A justificativa do réu revela:

(A)  timidez.
(B)  petulância.
(C)  covardia.
(D)  subserviência.
(E)  sagacidade.

09) A atitude do indivíduo que “... surge / Em passo firme, andando bem ...” pode ser caracterizada pela seguinte expressão popular:

(A)  “maria-vai-com-as-outras”.
(B)  “puxa-saco”.
(C)  “pau-mandado
(D)  “cara-de-pau!”
(E)   “testa-de-ferro

10)  Assinale o item em que a explicação não corresponde à significação da palavra na frase:

(A)  “... um tal cacoete ...”                    - um tal defeito
(B)  “Com mil mesuras ...”                   - com mil salamaleques
(C)  “O modo esdrúxulo de andar”       - o modo esquisito de andar
(D)  “O nosso rei tenta aviltar!”            - o nosso rei tenta humilhar
(E)  “Não me mandeis para as galés!”  - não me mandeis para as colônias.

11) Nobreza solarenga é a que vive:

(A)  nas mansões.
(B)  ao sol.
(C)  a bajular.
(D)  com roupas ricas
(E)   em caçadas

12) Assinale o único item cujo significado, segundo o texto, não se relaciona com grei (nação):

(A)  turbamulta.
(B)  povo
(C)  estirpe
(D)  plebe
(E)   burguesia

13) O autor diz que o rei era “de nobre estirpe secular”. Na sua opinião, o que significa isso?

(A)  Significa que a sua nobreza já vinha de muitos séculos, de muitas gerações.
(B)  Significa que o rei tinha quase cem anos de idade.
(C)  Significa que o seu reinado iria ainda durar mais cem anos.
(D)  Significa que os seus familiares viviam quase cem anos.
(E)  Significa que o povo o adorava há cem anos.

14) Por que se diz: “Não era mais nenhum defeito, / Naquele reino, o capengar.”

(A)  porque os capengas não tinham vergonha de capengar.
(B)  se todo mundo capengava, deixou de ser defeito; passou a ser o normal.
(C)  porque o reino obrigou os seus súditos a capengar.
(D)  porque os verdadeiros capengas foram favorecidos.
(E)  porque os nobres criticaram o povo por capengar.

15) A justificativa do réu: “- Eu sou capenga dos dois pés...” poderia ser aceita, naquelas circunstâncias, para inocentá-lo? Por quê?

(A)  porque ele era verdadeiramente capenga dos dois pés.
(B)  porque ele tinha joanetes nos dois pés.
(C)  porque, apesar de ser capenga, caminhava normalmente.
(D)  porque ele não conhecia os costumes do reino.
(E)  porque, naquela circunstância, qualquer desculpa seria válida para salvar a pele.

16)  Haveria outra maneira de mostrar ao rei que ele era benquisto e popular que não fosse o andar capegando?

(A)  Sim, dizendo-lhe, simplesmente, que o seu mal era um ridículo calo que o eliminasse.
(B)  Não, pois ele era feliz assim.
(C)  Sim, o povo deveria continuar capengando, pois isso fazia o rei ficar contente.
(D)  Não, o rei era inflexível e todos deveriam imitá-lo em tudo que ele fizesse.
(E)  Sim, ignorando os defeitos de seu rei

*****

GRADE DE RESPOSTAS (MARQUE COM APENAS UM X)

01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
A


X



X



X

X


X
B

X



X







X


C



X







X




D
X







X







E




X


X

X




X


A grade acima já está com o gabarito das respostas certas.

Valor das questões:

01 -   0,62
02 -   1,25
03 -   1,87
04 -   2,50
05 -   3,12
06 -   3.75
07 -   4,37
08 -   5,00
09 -   5.62
10 -   6,25
11 -   7,87
12 -   7.50
13 -   8,12
14 -   8,75
15 -   9.37
16 - 10.00

Observação: as notas podem ser arrendondadas para cima ou para baixo: acima de 0, 50 para cima, abaixo, 0,50 para baixo.

Oração da árvore


No antigo Castelo de São Jorge, em Lisboa, ao lado da estátua de Dom Manuel, O Venturoso, podemos ver este conhecido primor literário, no qual se observou um viés de preocupação ecológica.


Ao Viandante

Tu que passas e ergues para mim o teu braço,
Antes que me faças mal. Olha me bem.
Eu sou o calor do teu lar nas noites frias de inverno.
Eu sou a sombra amiga que tu encontras
Quando caminhas sob o sol de agosto
E os meus frutos são a frescura apetitosa
Que te sacia a sede nos caminhos.
Eu sou a trave amiga da tua casa, a tábua da tua mesa,
A cama em que descansas e o lenho do teu barco
Eu sou o cabo da tua enxada a porta da tua morada,
A madeira do teu berço e do teu próprio caixão
Eu sou o pão da bondade e a flor da beleza
Tu que passas, olha-me bem e não me faças mal

Veiga Simões, Arganil, Portugal, maio de 1914.

Em 1914, Veiga Simões, De Arganil, coração amplo e fecundo, escreveu para a festa escolar a oração que acima transcrevemos.

Em 1959, esta oração foi adotada como legenda obrigatória nos parques públicos do Uruguai e depois divulgada pelas Américas.

*viandante: adjetivo de dois gêneros e substantivo de dois gêneros, que ou a pessoa que viaja, especialmente a pé. = caminhante.

Alberto da Veiga Simões


Escritor, jornalista, político, investigador, 
nasceu em Argamil a 16 de dezembro de 1888
e faleceu, em Paris, a 1° de dezembro de 1954.


quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Julinho, o compositor fantasma.


Durante a ditadura militar (1964 – 1985), as manifestações culturais estavam sob a dura vigilância do governo, atento a tudo o que pudesse ser considerado “subversivo”. Chico Buarque de Holanda, um dos compositores mais populares do período, fez malabarismos para escapar do cerco da censura. Em 1974 ele criou um personagem, Julinho da Adelaide, que assinou algumas de suas composições. O escritor Mário Prata chegou a fazer uma “entrevista” com o fictício Julinho, publicada no jornal carioca Última Hora. O texto trazia inclusive dados biográficos e anatômicos do personagem, como o nascimento, na favela da Rocinha, referência a uma cicatriz no seu rosto e até uma foto da sua mãe, a também fictícia Adelaide de Oliveira – na verdade o retrato de uma nativa africana que Chico encontrou num livro do pai, o historiador Sérgio Buarque de Holanda. Na entrevista, Julinho da Adelaide até vociferava contra Chico, acusando-o de “querer parecer às minhas custas!”


Jorge maravilha

Julinho de Adelaide - 1974

Há nada como um tempo
Após um contratempo
Pro meu coração
E não vale a pena ficar
Apenas ficar chorando, resmungando
Até quando, não, não, não
E como já dizia Jorge maravilha
Prenhe de razão
Mais vale uma filha na mão
Do que dois pais voando

Você não gosta de mim
Mas sua filha gosta
Você não gosta de mim
Mas sua filha gosta
Ela gosta do tango, do dengo
Do mengo, domingo e de cócega
Ela pega e me pisa, belisca
Petisca, me arrisca e me enrosca
Você não gosta de mim
Mas sua filha gosta

Há nada como um dia
Após o outro dia
Pro meu coração
E não vale a pena ficar
Apenas ficar chorando, resmungando
Até quando, não, não, não
E como já dizia Jorge maravilha
Prenhe de razão
Mais vale uma filha na mão
Do que dois pais sobrevoando
Você não gosta de mim
Mas sua filha gosta.*


* Segundo consta, a filha do presidente Geisel gostava das músicas do Chico.

Acorda Amor

Leonel Paiva/Julinho da Adelaide

Acorda amor
Eu tive um pesadelo agora
Sonhei que tinha gente lá fora
Batendo no portão, que aflição
Era a dura, numa muito escura viatura
Minha nossa santa criatura
Chame, chame, chame lá
Chame, chame o ladrão, chame o ladrão

Acorda amor
Não é mais pesadelo nada
Tem gente já no vão de escada
Fazendo confusão, que aflição
São os homens
E eu aqui parado de pijama
Eu não gosto de passar vexame
Chame, chame, chame
Chame o ladrão, chame o ladrão

Se eu demorar uns meses
Convém, às vezes, você sofrer
Mas depois de um ano eu não vindo
Ponha a roupa de domingo
E pode me esquecer

Acorda amor
Que o bicho é brabo e não sossega
Se você corre o bicho pega
Se fica não sei não
Atenção
Não demora
Dia desses chega a sua hora
Não discuta à toa não reclame
Clame, chame lá, chame, chame
Chame o ladrão, chame o ladrão, chame o ladrão
(Não esqueça a escova, o sabonete e o violão)

Milagre Brasileiro

Compositor: Julinho da Adelaide

              Cadê o meu?
Cadê o meu, ó meu?
Dizem que você se defendeu
É o milagre brasileiro
Quanto mais trabalho
Menos vejo dinheiro
É o verdadeiro boom
Tu tá no bem bom
Mas eu vivo sem nenhum

Cadê o meu?
Cadê o meu, ó meu?
Eu não falo por despeito
Mas, também, se eu fosse eu
Quebrava o teu
Cobrava o meu Direito.

Vida

Cíntia Melo Primo


Queria ser mulher
Não neguei o sexo
Do homem faminto
Preparei meu corpo
Repensei meu ciclo
Aproveitei o óvulo maduro
Promovi o nascimento
A possibilidade fremente
Ofereci ao mundo
Meu ventre sadio.

Nasci bicho fêmea
Concebi
Acolhi no colo
Dei de mamar
As tetas robustas, febris
Fartas de leite
Não contive o riso
A alegria indecifrável
Amei a cria
Cumpri o milagre da vida.

Passou o tempo
Cansei-me da lida
Das regras dos homens
Da culpa insistente
Repetindo o choro
Na noite clara
Meu corpo cansado
Doente de sono.

Queria é ser mulher parida
Cem anos atrás
Amar meus rebentos
Nutrir todos eles
De leite, de amor
Depois, sem culpa
Dormir meu resguardo.




terça-feira, 27 de outubro de 2015

O vendedor de palavras



Por Fábio Reynol*

Ouviu dizer que o Brasil sofria de uma grave falta de palavras. Em um programa de TV, viu uma escritora lamentando que não se liam livros nesta terra, por isso as palavras estavam em falta na praça. O mal tinha até nome de batismo, como qualquer doença grande, “indigência lexical”. Comerciante de tino que era, não perdeu tempo em ter uma ideia fantástica. Pegou dicionário, mesa e cartolina e saiu ao mercado cavar espaço entre os camelôs.
Entre uma banca de relógios e outra de lingerie instalou a sua: uma mesa, o dicionário e a cartolina na qual se lia: “Histriônico - apenas R$ 0,50!”.
Demorou quase quatro horas para que o primeiro de mais de cinquenta curiosos parasse e perguntasse.
- O que o senhor está vendendo?
- Palavras, meu senhor. A promoção do dia é histriônico a cinquenta centavos como diz a placa.
- O senhor não pode vender palavras. Elas não são suas. Palavras são de todos.
- O senhor sabe o significado de histriônico?
- Não.
- Então o senhor não a tem. Não vendo algo que as pessoas já têm ou coisas de que elas não precisem.
- Mas eu posso pegar essa palavra de graça no dicionário.
- O senhor tem dicionário em casa?
- Não. Mas eu poderia muito bem ir à biblioteca pública e consultar um.
- O senhor estava indo à biblioteca?
- Não. Na verdade, eu estou a caminho do supermercado.
- Então veio ao lugar certo. O senhor está para comprar o feijão e a alface, pode muito bem levar para casa uma palavra por apenas cinqüenta centavos de real!
- Eu não vou usar essa palavra. Vou pagar para depois esquecê-la?
- Se o senhor não comer a alface ela acaba apodrecendo na geladeira e terá de jogá-la fora e o feijão caruncha.
- O que pretende com isso? Vai ficar rico vendendo palavras?
- O senhor conhece Nélida Piñon?
- Não.
- É uma escritora. Esta manhã, ela disse na televisão que o País sofre com a falta de palavras, pois os livros são muito pouco lidos por aqui.
- E por que o senhor não vende livros?
- Justamente por isso. As pessoas não compram as palavras no atacado, portanto eu as vendo no varejo.
- E o que as pessoas vão fazer com as palavras? Palavras são palavras, não enchem barriga.
- A escritora também disse que cada palavra corresponde a um pensamento. Se temos poucas palavras, pensamos pouco. Se eu vender uma palavra por dia, trabalhando duzentos dias por ano, serão duzentos novos pensamentos cem por cento brasileiros. Isso sem contar os que furtam o meu produto. São como trombadinhas que saem correndo com os relógios do meu colega aqui do lado. Olhe aquela senhora com o carrinho de feira dobrando a esquina. Com aquela carinha de dona-de-casa ela nunca me enganou. Passou por aqui sorrateira. Olhou minha placa e deu um sorrisinho maroto se mordendo de curiosidade. Mas nem parou para perguntar. Eu tenho certeza de que ela tem um dicionário em casa. Assim que chegar lá, vai abri-lo e me roubar a carga. Suponho que para cada pessoa que se dispõe a comprar uma palavra, pelo menos cinco a roubarão. Então eu provocarei mil pensamentos novos em um ano de trabalho.
- O senhor não acha muita pretensão? Pegar um...
- Jactância.
- Pegar um livro velho...
- Alfarrábio.
- O senhor me interrompe!
- Profaço.
- Está me enrolando, não é?
- Tergiversando.
- Quanta lenga-lenga...
- Ambages.
- Ambages?
- Pode ser também evasivas.
- Eu sou mesmo um banana para dar trela para gente como você!
- Pusilânime.
- O senhor é engraçadinho, não?
- Finalmente chegamos: histriônico!
- Adeus.
- Ei! Vai embora sem pagar?
- Tome seus cinquenta centavos.
- São três reais e cinquenta.
- Como é?
- Pelas minhas contas, são oito palavras novas que eu acabei de entregar para o senhor. Só histriônico estava na promoção, mas como o senhor se mostrou interessado, faço todas pelo mesmo preço.
- Mas oito palavras seriam quatro reais, certo?
- É que quem leva ambages ganha uma evasiva, entende?
- Tem troco para cinco?

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Fábio Reynol (1973), paulista da cidade de Campinas, é jornalista e escritor. Trabalha como assessor de imprensa, redator para Internet e ghostwriter. Tem vários trabalhos, nenhum publicado, entre eles o livro-reportagem “A verdadeira história de Pedrinho Matador” escrito em parceria com a jornalista Patrícia Capovilla. Publicou, em fins de Novembro/2008, o livro “O vendedor de palavras − Crônicas de um país de tanga na mão e corda no pescoço”.