sexta-feira, 25 de março de 2016

A Mulher do Gaúcho*

*(...do pampa rio-grandese)


Raúl Annes Gonçalves


No geral, é vitima do destino. Nascida em um rancho de gente humilde, logo de início torna-se, apesar de tenra idade, responsável por seus irmãozinhos, ajudando a mãe a criá-los. Dos oito aos dez anos irá ao colégio, se houver na redondeza. E a freqüência não vai além do necessário para aprender a ler e rabiscar um bilhete.

Depois de moça, criada sem infância, não conhecerá a liberdade de que desfruta a mocidade. Seus namoros são controlados. Na sala, junto aos namorados, sempre vigiada, tutelada e governada. Jamais age por si mesma.

Depois de casada, logo passará ao rol das velhas. Em bailes, dançará pouco e por pouco tempo. Lua-de-mel é coisa ignorada. Nos primeiros dias de casada terá os pais e irmãos ao seu costado. Se for morar com o noivo, isto é, marido, logo lhe darão uma companheira, porque “mulher só não dá certo”.

Garantido que, no primeiro ano, terá um bebê. E nos outros também. Sua missão, pronto, está definida: criar filhos, cozinhar, costurar, lavar, passar, criar pintos, terneiros guachos, ajudar no plantio e colheita da chácara e ordenhar as vacas de leite cedo todas as manhãs.

Passeios? Para quê? Se há tanto o que fazer? À cidade só vai quando há doença, nela ou nas crianças. No rancho, ela faz e resolve tudo. No marido, quase sempre encontra um bom companheiro e pai amoroso para os filhos, mas completamente alheio aos serviços domésticos, suas necessidades e carência de conforto. Das roupas usadas, faz vestes para os filhos e as roupas velhas dos filhos maiores diminuem para os menores.

Trata dos doentes com auxílio de remédios caseiros e fé em Deus. Não se lastima contra a sorte nem se arrenega. Cumpre sua árdua tarefa como se esta lhe fosse imposta pela vontade de Deus. Não cobiça o alheio nem inveja a vida dos patrões. Sem outro apoio que não o do marido, isolada em seu rancho, dá aos filhos uma educação onde prevalece o respeito às pessoas mais velhas e o temor a Deus. E criam-se e vivem num ambiente de honestidade e honradez que lhes dá alegria de viver e segurança em si mesmos.

(Do Almanaque do Correio do Povo – 1976)



2 comentários:

  1. Meu Deus, pobre mulher,vocês tem certeza que a escravidão acabou

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  2. Realmente, a mulher pobre do pampa gaúcho tinha esse destino e, creio eu, que até hoje seja assim.

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