Variações desta história existem desde a antiguidade clássica. Paulo
emprega uma delas em
Coríntios I 12:14-16.
Uma vez um homem sonhou que suas
mãos, pés, boca e cérebro começaram todos a se rebelar contra estômago.
– Sua lesma imprestável! – as mãos
disseram – Nós trabalhamos o dia inteiro, serrando, martelando, levantando e
carregando. De noite estamos cobertas de bolhas e arranhões, nossas juntas doem
e ficamos cheias de sujeira. Enquanto isso, você só fica aí sentado, pegando a
comida toda!
– Nós concordamos! – gritaram os pés –
Pense só como nos desgastamos, andando para lá e para cá o dia inteiro. E só
fica se entupindo, seu porco ganancioso, cada vez mais pesado para a gente
carregar.
– Isso mesmo! –
choramingou a boca – De onde você pensa que vem toda a comida que você tanto
ama? Eu é que tenho que mastigar tudo; e logo que termino, você suga tudo aí
para baixo, só para você. Você acha que isso é justo?
– E eu? – gritou o cérebro – Você
acha que é fácil ficar aqui em cima, tendo que pensar de onde vai vir a sua
próxima refeição? E ainda por cima, não ganho nada pelas minhas dores todas.
Uma por uma, as partes do corpo
aderiram às reclamações contra o estômago, que não disse coisa alguma.
– Tenho uma ideia – o cérebro
finalmente anunciou. – Vamos todos nos rebelar contra essa barriga preguiçosa e
parar de trabalhar para ela.
– Soberba ideia! – todos os outros
membros e órgãos concordam – Vamos lhe ensinar como nós somos importantes, seu
porco. Assim, talvez você também acabe fazendo algum trabalho.
E todos pararam de trabalhar. As mãos
se recusaram a levantar ou carregar coisas. Os pés se recusaram a andar. A boca
prometeu não mastigar nem engolir nem um bocadinho. E o cérebro jurou que não
teria mais nenhuma ideia brilhante. No começo, o estômago roncou um pouco, como
sempre fazia quando estava com fome. Mas depois ficou quieto.
Nesse ponto, para surpresa do homem
que sonhava, ele descobriu que não conseguia andar. Não conseguia segurar nada
nas mãos. Não conseguia nem abrir a boca. E de repente, começou a se sentir bem
doente.
O sonho pareceu durar vários dias. A
cada dia que passava, o homem se sentia cada vez pior.
– É melhor que essa rebelião não dure
muito – ele pensou – senão vou morrer de inanição.
Enquanto isso, mãos, pés, boca e
cérebro só ficavam à toa, cada vez mais fracos. No início, se agitavam só um
pouquinho, para escarnecer do estômago de vez em quando; mas pouco depois não
tinham mais energia nem para isso.
Por fim, o
homem ouviu uma vozinha fraca vinda da direção dos pés.
– Pode ser que estivéssemos enganados
– eles diziam. – Talvez o estômago estivesse trabalhando o tempo todo, ao jeito
dele.
– Estava pensando a mesma coisa –
murmurou o cérebro. – É verdade que ele fica pegando a comida toda. Mas parece
que ele manda a maior parte de volta para nós.
– Devemos admitir nosso erro – disse
aboca. – O estômago tem tanto trabalho a fazer quanto as mãos, os pés, o
cérebro e os dentes.
– Então,
vamos todos voltar ao trabalho – gritaram juntos. E, nisso, o homem acordou.
Para seu alívio, descobriu que os pés
estavam andando de novo. As mãos seguravam, a boca mastigava e o cérebro agora
conseguia pensar com clareza. Começou a se sentir muito melhor.
– Bem, eis aí uma lição para mim –
ele pensou, enquanto enchia o estômago de café e pão com manteiga, de manhã. –
Ou funcionamos todos juntos, ou nada funciona mesmo.
(De “O Livro das
Virtudes – Uma Antologia de William J. Bennett)
Editora Nova
Fronteira
Não tem como viver e ser feliz isoladamente, precisamos do outro para nos completarmos, sempre achei isso, e os textos que li confirma tudo isso.
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