quarta-feira, 27 de abril de 2016

Sonetos de B. Lopes



(1859-1916)

BERÇO

Recordo: um largo verde e uma igrejinha,
um sino, um rio, um pontilhão, e um carro
de três juntas bovinas que ia e vinha
rinchando alegre, carregando barro.

Havia a escola, que era azul e tinha
um mestre mau, de assustador pigarro...
(Meu Deus! que é isto! que emoção a minha
quando estas cousas tão singelas narro!?)

Seu Alexandre, um bom velhinho rico,
que hospedara a Princesa; o tico-tico
que me acordava de manhã e a serra...

com seu nome de amor – Boa Esperança,
eis tudo quanto guardo na lembrança
de minha pobre e pequenina terra!

QUANDO EU MORRER

Quando eu morrer em véspera tranquila,
num pôr-do-sol de goivos e saudade,
da velha igreja, que a Madona asila,
o sino grande a soluçar Trindade;

Quando o tufão do mal que me aniquila
soprar minh´alma para a Eternidade,
todas as flores dos jardins da vila,
certo, eu terei da tua caridade.

E, já na sombra amiga do cipreste,
há de haver uma lágrima piedosa,
a edênica gota, a pérola celeste,

para quem desfolhou, terno, e as mãos cheias,
o lírio, o bogari, o cravo e a rosa
pelas estradas brancas das aldeias.


→ Bernardino da Costa Lopes nasceu no arraial de Boa Esperança (Rio Bonito), Província do Rio de Janeiro, em 15 de janeiro de 1859 e morreu no Rio de Janeiro em 18 de setembro de 1916. Casado, desorganizou sua vida por motivos de ordem sentimental e entregou-se ao álcool. Foi ri­dicularizado no fim da vida por conta de um soneto infeliz, de louvor ao marechal Hermes da Fonseca.

→ O poeta negro B. Lopes nasceu antes do fim da escravidão, mas como filho de pais livres e membros da classe média pobre: o pai, Antônio, escrivão, e a mãe, Mariana, costureira.

→ Membro da boemia intelectual, sua poesia recolhe diferentes tendências da passagem do século XIX ao XX. Da primeira etapa, vista como parnasiana, é Cromos (1881), com o qual obteve reconhecimento nacional. Seus cromos representam, conforme Alfredo Bosi, “uma linha rara entre nós: a poesia das coisas domésticas, os ritmos do cotidiano”.

→ Em 1890, Cruz e Souza chegou ao Rio de Janeiro: ele, B. Lopes, Emiliano Perneta e Oscar Rosas formaram o primeiro grupo de simbolistas brasileiros. Desse novo período, fazem parte Brasões (1895) e Val de Lírios (1900), entre outros.

→ Em 1906, morre de tuberculose. A hibridez de sua poesia, de marcas parnasiana e simbolista, continua a merecer novos leitores.

→ Seus sonetos estão em: Poesia Brasileira para a Infância, Cassiano Nunes e Mário da Silva Brito, São Paulo, Saraiva:1968.






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