domingo, 29 de maio de 2016

Neném Prancha, o filósofo do futebol.


Publicado na Folha de S. Paulo, sábado, 17 de janeiro de 1976


Um enfarte do miocárdio silenciou para sempre o homem Antônio Franco de Oliveira, na madrugada de ontem, na Casa de Saúde Dr. Eiras. Mas “Neném Prancha”, o mito, ficará na história do futebol brasileiro. Torcedor incondicional do Botafogo desde o dia em que chegou a Copacabana, procedente de Resende, há mais de 40 anos. “Neném Prancha” ganhou fama no extinto Posto Quatro Futebol Clube, como goleador, e zagueiro, no Carioca Esporte clube.

Profundo conhecedor de futebol, "Neném Prancha" atuou até pouco tempo como "olheiro" no futebol de praia. Roupeiro do departamento de atletismo no Botafogo desde 1943 - começou trabalhando para a divisão juvenil de futebol, Antônio Franco de Oliveira passou a ter problema no coração a partir de março do ano passado: "O "Neném" ficou muito agitado com o lançamento do livro “Assim falou Neném Prancha”, de autoria do esportista Pedro Zamara, era o comentário mais ouvido durante o seu enterro no cemitério São João Batista.

Homem de poucas palavras, mas perfeito observador e muito inteligente, só falava nos momentos oportunos. Lançava com grande humor as suas frases irônicas para definir os fatos. Adepto do futebol simples e objetivo, ele contestava a forma de jogar de Domingos da Guia. Neném repudiava o drible, a firula dentro da área: “Jogar a bola pra cima, enquanto ela estiver no alto não há perigo de gol.”

Para muitos torcedores, "Neném" era uma figura humana estranha. Apesar de muito conhecido na praia, ele jamais foi visto tomando banho de mar. Antônio Franco de Oliveira jamais gostou de falar sobre o seu passado. Filho de Zeferino, um biscateiro e Dª. Júlia, empregada doméstica, "Neném Prancha" passou os seus 69 anos - nasceu a 16 de junho de 1906 - criando suas frases.

Quando encontrava um menino habilidoso, com jeito de seguir a carreira, "Neném Prancha" o aconselhava. “Jogador de futebol, tem que ir na bola com a mesma disposição com que vai num prato de comida. Com fome, para estraçalhar.”

Talvez, por passar praticamente toda a sua vida entre a praia e o seu pequeno quarto na própria sede do Botafogo, assim definia as concentrações: “Se concentração ganhasse jogo, o time do presídio não perdia uma partida”.

Foi também inimigo das superstições, que dominam a maioria dos jogadores e dirigentes do futebol brasileiro. Ele sempre dizia que sem talento não adiantavam as promessas: “Se macumba resolvesse, o campeonato baiano terminava sempre empatado”.

Um conselho paternal para os goleiros: “O goleiro deve andar sempre com a bola, mesmo quando vai dormir. Se tiver mulher, dorme abraçado com as duas”.

Admirador do futebol clássico, "Neném Prancha" encarava Didi como um dos maiores armadores de futebol do mundo. Sua resposta era a mesma quando solicitado para comentar o talento de Didi: “O Didi joga bola como quem chupa laranja, com muito carinho”.

Mito do futebol brasileiro, Antônio Franco de Oliveira passou a "Neném Prancha" por causa das mãos - cada uma mede 23 centímetros de comprimento - e dos pés, que poucas vezes calçaram sapatos número 44 - ele preferia os chinelos. A exemplo dos demais funcionários do Botafogo, passou por privações com os frequentes atrasos dos salários. Mas nunca pensou em largar o clube de seu coração. Foi há muito custo que ele concordou em se internar numa casa de saúde.

"Neném Prancha" jamais pensou em casamento, porque o pouco dinheiro que ganhava servia apenas para “Manter o estômago em dia”, além disso, "Neném Prancha" não confiava muito na história da Amélia, a mulher de verdade, porque lia diariamente nos jornais as notícias sobre briga de casais: “Casamento é coisa muito séria para terminar nas manchetes de jornais”.

Quando jogador no futebol de praia, "Neném Prancha" evitava a cobrança de pênaltis e depois passou à condição de treinador de juvenis e torcedor do Botafogo, ele lançou uma de suas mais famosas frases: “Pênalti é uma coisa tão importante, que quem devia bater é o presidente do clube”.

Frases de Neném Prancha

Futebol é muito simples: quem tem a bola ataca; quem não tem defende.

Jogador brasileiro não vai ter problema no México, não. Tudo já morou em favela e não pode se queixar de altitude.

Jogador de futebol, tem que ir na bola com a mesma disposição com que vai num prato de comida.

Jogar a bola pra cima, enquanto ela estiver no alto não há perigo de gol.

Se concentração ganhasse jogo, o time do presídio não perdia uma partida.

Futebol moderno é que nem pelada. Todo o mundo corre e ninguém sabe para onde.

Jogador é o Didi, que joga como quem chupa laranja.

O goleiro deve dormir com a bola. Se for casado, dorme com as duas.

O pênalti é tão importante que devia ser cobrado pelo presidente do clube.

Se macumba ganhasse jogo, o Campeonato Baiano terminava empatado.

O importante é o principal, o resto é secundário.

Futebol é uma caixinha de surpresa.

Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.

Quem corre é a bola. Senão, era só fazer um time de batedores de carteira.

Jogador que joga nas 11 não joga bem em nenhuma

Bola tem que ser rasteira porque o couro vem da vaca e a vaca gosta de grama.





Nenhum comentário:

Postar um comentário