segunda-feira, 8 de agosto de 2016

A história de duas músicas de Lupicínio Rodrigues



Lupicínio: Tive muitas namoradas na minha vida. Umas me fizeram bem, outras me fizeram mal. As que me fizeram mal foram as que mais dinheiro me deram, porque as que me fizeram bem eu esqueci.

O Pasquim: Lupicínio tem mil histórias para contar. Por exemplo: Vingança. É uma música que em 1952 dominou o Brasil inteiro. Jornais publicavam e ressaltavam o que houve na época por causa daquela música. Houve tentativas de suicídio etc. A quem dedicou Vingança? Que mulher é essa, onde ela esteve, onde está?

Lupicínio: A mulher que me inspirou Vingança viveu comigo seis anos. E depois terminou namorando um garoto que era meu empregado.

O Pasquim: Que idade tinha?

Lupicínio: 16, 17 anos.

O Pasquim: Foi passado pra trás por um garoto de 17 anos.

Lupicínio: Não foi bem assim. É que eu tinha viajado, ela mandou chamar o garoto. Disse que queria falar com ele. Ela mandou um bilhete. O garoto, com medo de mim, quando eu cheguei me entregou o bilhete. Disse: “Olha, a dona Carioca me mandou este bilhete. Eu não sabia o que ela queria comigo. Não fui.” Entregou a mulher. Aí eu não disse nada. Fiquei quietinho, inventei outra viagem, peguei minha mala e fui embora.

O Pasquim: Endoidou.

Lupicínio: Era época do carnaval, ela endoidou. Botou um “Dominó”. “Dominó” é aquela fantasia preta, que cobre tudo. No carnaval, feito louca, foi me procurar. Uma certa madrugada, ela, num fogo danado – parece que deu fome -, entrou num bar onde a gente costumava comer, e o pessoal a reconheceu. Perguntaram: “Ué, Carioca, que você está fazendo aqui a essa hora? Cadê o Lupi?” Ela sozinha.

O Pasquim: Carioca por quê? Ela é carioca?

Lupicínio: É, sim. Ela é viva, mora aqui. Aí ela começou a chorar. Eu estava num restaurante do outro lado. Uns amigos chegaram e me disseram: “Ô, encontramos a Carioca vestida de “Dominó”, num fogo tremendo. Começou a chorar e perguntou por ti. O que ouve, vocês estão brigados?” Aí foi eu que fiz Vingança. Na mesma hora comecei, saiu (canta):

Eu gostei tanto,
Tanto quando me contaram,
Que lhe encontraram
Bebendo e chorando
Na mesa de um bar,
E que quando os amigos do peito
Por mim perguntaram,
Um soluço cortou sua voz,
Não lhe deixou falar.
Mas eu gostei tanto,
Tanto, quando me contaram
Que tive mesmo de fazer esforço
Pra ninguém notar.

O remorso talvez seja a causa
Do seu desespero.
Ela deve estar bem consciente
Do que praticou.
Me fazer passar essa vergonha
Com um companheiro,
E a vergonha e a herança maior
Que meu pai me deixou.
Mas, enquanto houver força em meu peito,
Eu não quero mais nada.
Só vingança, vingança, vingança
Aos santos clamar.
Ela há de rolar como as pedras
Que rolam na estrada,
Sem ter nunca um cantinho de seu
Pra poder descansar.

O Pasquim: A ruptura foi pra valer?

Lupicínio: Eu sou muito amigo dos pais-de-santo, os batuqueiros lá de Porto Alegre. Em cada lugar que chegava, ela botava fotografia minha, cabritas, aquele negócio todo para fazer as pazes. Aí eu fiz (canta):

Nunca!
Nem que o mundo caia sobre mim,
Nem se Deus mandar,
Nem mesmo assim,
As pazes contigo eu farei.

Nunca!
Quando a gente perde a ilusão,
Deve sepultar o coração
Como eu sepultei.

Saudade,
Diga a essa moça, por favor,
Como foi sincero o meu amor,
Quanto eu a adorei
Tempos atrás.
Saudade,
Não se esqueça também de dizer
Que é você quem me faz adormecer
Pra que eu viva em paz. 

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