sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Augusto dos Anjos


Poeta: 20.04.1884 – 12. 11.1914

Curiosidades biográficas

→ Um personagem constante em seus poemas é um pé de tamarindo que ainda hoje existe no Engenho Pau d'Arco.

→ Seu amigo Órris Soares conta que Augusto dos Anjos costumava compor "de cabeça", enquanto gesticulava e pronunciava os versos de forma excêntrica, e só depois transcrevia o poema para o papel.

→ De acordo com Eudes Barros, quando morava no Rio de Janeiro com a irmã, Augusto dos Anjos costumava compor no quintal da casa, em voz alta, o que fazia sua irmã pensar que era doido.

→ Embora tenha morrido de pneumonia, tornou-se conhecida a história de que Augusto dos Anjos morreu de tuberculose, talvez porque esta doença seja bastante mencionada em seus poemas.

→ Um exemplar do “Eu” faz parte da biblioteca da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, por causa dos termos científicos que Augusto dos Anjos utilizava em suas composições.

→ “Eu e outras poesias” é a reunião do livro “Eu” (publicado em vida) a outras poesias que foram acrescentadas postumamente à obra.

→ Em 1900, com dezesseis anos, Augusto dos Anjos deixa o Engenho da família e vai completar os estudos formais na capital do Estado, no Liceu Paraibano. O seu tipo magro, taciturno, logo chama a atenção dos estudantes daquele colégio, entre eles Orris Soares (Avô de Jô Soares) que, posteriormente, seis anos após a morte do poeta, escreverá o Elogio de Augusto dos Anjos, um texto de apresentação para a segunda edição do EU. Este texto será, talvez, o responsável pela descoberta que a crítica – e o público – brasileiro irão fazer da força latente da poesia daquele homem triste.

→ Morreu ainda jovem (em 1914) devido a uma enfermidade pulmonar, deixando para trás suas carreiras de promotor público (formou-se em Direito em 1906) e de professor, além de sua única e marcante obra.

→ A que escola se filiou? – a nenhuma.


Vale a pena ler este artigo:

“Histérico, neurastênico, desequilibrado, a esse tipo de julgamento terá que se acostumar o poeta. Na Paraíba foi chamado "Doutor Tristeza". E um professor de primeiras letras, enfurecido com os temas que considerou antipoéticos dos versos do poeta publicados n'O Comércio, deu-se ao trabalho de mandar imprimir e fazer distribuir pelas ruas da Paraíba uma "carta aberta", cheia de impropérios, atacando rudemente o "Poeta Raquítico". Se Cesário Verde, em Portugal, teve pela frente um Ramalho Ortigão, que não entendeu, a princípio, a qualidade da sua mensagem, Augusto dos Anjos, teve um cidadão, um professor, de quem não se guarda sequer o nome. Mas a resposta do poeta, em versos alexandrinos, a essa "carta aberta" há de ficar. E merece ser lembrada.”

(Eu & Outras Poesias - Civilização Itatiaia - 1982)

Bilhete Postal

Ilustre professor de Carta Aberta: - Almejo
Que uma alimentação a fiambre e a vinho e a queijo
Lhe fortaleça o corpo e assim lhe fortaleça
As mãos, os pés, a perna et coetera e a cabeça.
Continue a comer como um monstro no almoço
Inche como um balão, cresça como um colosso
E vá crescendo, vá crescendo e vá crescendo,
E fique do tamanho extraordinário e horrendo
Do célebre Titão e do Hércules lendário;
O seu ventre se torne um ventre extraordinário,
Cheio do cheiro ruim de fétidos resíduos,
As barrigas então de cinqüenta indivíduos
Não poderão caber na sua ampla barriga;
Não mais lhe pesará a desgraça inimiga,
O seu nome também não será mais Antonio.
Todos hão de chamá-lo o colosso, o demônio,
A maravilha das brilhantes maravilhas.
As hienas carniçais, as leoas e as novilhas,
Diante do seu vigor recuarão, e diante
Do estribado metal de sua voz atroante
Decerto correrão mansas e espavoridas.
Se as minhas orações forem, pois, atendidas,
O senhor há de ser o Teseu do universo.
Seja um gigante, pois; não faça porém, verso
de qualidade alguma e nem também me faça
Artigos tresandando a bolor e a cachaça,
Ricos de incorreções e de erros de gramática,
Tenha vergonha, esconda essa tendência asnática,
Que somente possui o seu cérebro obtuso -
Esconda-a, e nunca mais se exponha a fazer uso
Da pena, e nunca mais desenterre alfarrábios.
Os tolos, em geral, são tidos como sábios,
Que sabem calar-se e reprimir-se sabem,
O senhor é papalvo e os papalvos não cabem
No centro literário e no centro político.
Respeite-me, portanto!

O Poeta Raquítico.

Poemas de Augusto dos Anjos

Versos íntimos

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

A árvore da serra

 As árvores, meu filho, não têm alma!
E esta árvore me serve de empecilho...
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!

 Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pôs alma nos cedros... no junquilho...
Esta árvore, meu pai, possui minha alma!...

 Disse – e ajoelhou-se, numa rogativa:
“Não mate a árvore, pai, para que eu viva!”
E quando a árvore, olhando a pátria serra,

Caiu aos golpes do machado bronco,
O moço triste se abraçou com o tronco
E nunca mais se levantou da terra!

A um carneiro morto

Misericordiosíssimo carneiro
Esquartejado, a maldição de Pio
Décimo caia em teu algoz sombrio
E em todo aquele que for seu herdeiro!

Maldito seja o mercador vadio
Que te vender as carnes por dinheiro,
Pois, tua lã aquece o mundo inteiro
E guarda as carnes dos que estão com frio!

Quando a faca rangeu no teu pescoço,
Ao monstro que espremeu teu sangue grosso
Teus olhos - fontes de perdão - perdoaram!

Oh! tu que no Perdão eu simbolizo,
Se fosses Deus, no Dia de Juízo,
Talvez perdoasses os que te mataram!

Debaixo do tamarindo

No tempo de meu Pai, sob estes galhos,
Como uma vela fúnebre de cera,
Chorei bilhões de vezes com a canseira
De inexorabilíssimos trabalhos.

Hoje, esta árvore, de amplos agasalhos,
Guarda, como uma caixa derradeira,
O passado da Flora Brasileira
E a paleontologia dos Carvalhos!

Quando pararem todos os relógios
De minha vida, e a voz dos necrológios
Gritar nos noticiários que eu morri,

Voltando à pátria da homogeneidade,
Abraçada com a própria Eternidade
A minha sombra há de ficar aqui!



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