Cagueta, o último dos vilões.
Em 1964, ao servir no antigo Núcleo
da Divisão Aeroterrestre, Regimento Santos Dumont, 1ª Cia de Fuzileiros
Aeroterrestres, tomei conhecimento de uma palavra que não fazia parte do meu
vocabulário: cagueta, que era a corruptela de alcaguete, pessoa que delata
outra, dedo-duro, traidor.
Você podia ter qualquer defeito, que
até poderia ser perdoado, mas cagueta, nunca! Havia um código de honra entres
os soldados. Nunca se entregava um companheiro. Sofria-se com ele, sofria-se por
ele, mas entregar um parceiro, jamais!
Vou contar um fato que aconteceu
comigo quase no final do ano de 1964, para provar como essa honra de não
delatar um camarada é levada até as últimas consequências.
Faríamos uma competição de patrulhas,
valendo pontos e troféu. Saltaríamos na ZL da Air France, na distante e quase
desabitada Barra da Tijuca. O exercício duraria em torno de 48 horas, com
provas em cada lugar, sendo anotado os pontos por juízes de percurso. Cada
tenente da primeira companhia do RSD comandaria um pelotão. O primeiro pelotão,
da primeira Cia, o meu, comandado pelo tenente Brandão, já estava completo.
Então passei para o segundo pelotão comandado pelo tenente Paulo. Eu não
saltaria no primeiro dia, por isso fui ser rec-fitas com outro companheiro, sob
o comando do subtenente Tamanini.
No dia seguinte, o tenente Paulo
levou seus comandados, no qual eu me agreguei, para fazer um exercício final
para ajustar alguns ensinamentos. No trabalho comandado pelos seus sargentos,
muitos levaram na brincadeira. Eu dei uma rasteira em outro soldado, e o
tenente não gostou. Perguntou: “Quem fez essa brincadeira de mau gosto!” Se eu
me acusasse, provavelmente, por não ser desse pelotão, seria desligado, e eu queria
muito participar desse exercício e dar mais salto, que seria o 11°.
Não me acusei, e o tenente resolveu
punir todo o pelotão com castigos físicos exaustivos e intensos. A cada parada,
fazia a mesma pergunta: “Quem fez a brincadeira?”. Silêncio. Novos castigos,
agora mais fortes e agressivos. Ninguém delatava, ninguém me cobrava nada, nem
olhavam para mim. Ninguém queria ser o cagueta da turma. A lei do silêncio
imperava em rapazes que sofreriam o que fosse necessário, mas manteriam um
código que nunca foi escrito e era um código de honra moral entre os
paraquedistas.
O tenente nos olhou com raiva, mas
creio que também com orgulho interno, pois sabia que entre seus comandados
imperava algo que ele no fundo também admirava. Não havia nenhum delator entre
seus comandados.
Voltamos ao alojamento, ninguém me
cobrou nada, nunca se tocou no assunto, Só doía a minha consciência, pois
queria muito participar e ganhar aquela competição com meus companheiros. Ser mais
um soldado paraquedista de fibra e vibração.
No salto do outro dia, o nosso
pelotão foi o primeiro em aglutinação ao redor do nosso líder, o tenente Paulo.
Tudo deu certo, caminhamos e enfrentamos muitas provas militares. Dormimos no
mato, com mosquitos nos azucrinando toda a noite, até chegarmos, finalmente, no
RSD.
Hoje, relembro e conto esse fato com
sentimento de ver nos rostos dos meus antigos amigos de 50 anos atrás, a
solidariedade de jovens que tinham um código moral que lembro, com orgulho, eu
ter sido o protagonista, pois só eu poderia ser punido, fazendo que ninguém
sofresse por mim, mas ninguém delatou ninguém, prevaleceu, mais uma vez, a
mística paraquedista!
Nilo da Silva Moraes
Pqdt 11.779 - do Turno 1964/4
Nilo (Moraes), o primeiro à esquerda, com dois amigos:
um carioca, no meio da foto, e Almeida, à direita,
também gaúcho, como eu, antes do salto de patrulha na Barra,
com roupas camufladas e rostos pintados a carvão.
(Você, como soldado, pode ficar apenas um ano
na Brigada de Infantaria Paraquedista,
mas a Brigada ficará por toda a vida dentro de você.)
De uma brincadeira, eu vejo alguns ensinamentos, primeiro a lealdade do grupo, ali naquele momento era um por todos e todos por um, e segundo o orgulho do comandante que estava diante de jovens fortes e determinados para qualquer batalha, por estas razões que Os PARAQUEDISTAS, são diferenciados.
ResponderExcluirNilo querido Amigo,no ano passado enquanto aguardava o desfile da nossa Gloriosa Brigada ,comprei de você um almanaque do grafonsos do qual não me canso de ler,tentei conseguir seu telefone para te agradecer a oportunidade mas foi impossível espero encontrar você algum dia para agradecer pessoalmente, um abraço ,Roberto pqd 13500 65/6
ResponderExcluirMeu irmão PQD, José Roberto Silva, esterei novamente, este ano, no Encontrão da Brigada que será no dia 26 de novembro.
ResponderExcluirEstarei sentado na mesma arquibancada, defronte ao QG. Mantenha contato comigo: (051) 3248.5981 ( Porto Alegre-RS)
Caro Nilo,
ResponderExcluirSou o HERINGER, que serviu como voce em 64.
Que saudades daquele tempo.
Tem conhecimento do soldado MADURO?
uM ABRAÇO
HERINGER
Claro que me lembro muito bem de ti, Heringer. Morávamos na primeira Cia, 12 gaúchos, dois mineiros e um carioca. Lembro-me que tu eras um dos mineiros. Tenho até hoje uma Bíblia, que guardo com carinho, que me foi dada pelo teu, creio que, saudoso pai. Tenho um Blog na internet: Almanaque Cultural Brasileiro. Escrevi dois livros sobre a Brigada de Infantaria Paraquedista. Meu e-mail é santamariamoraes@superig.com.br - Estarei no Rio de Janeiro, no Encontrão dos Paraquedistas, em 24.11.2018.
ExcluirMeu fone é (51) 3248.5981. Abraços. Moraes, pqd 11.779.
O Maduro era carioca, no Encontrão de 2014, quando eu o Baques formos receber a nossa medalha e o diploma de 50 anos, encontramos muitos soldados daquele ano, mas o Maduro não foi. PS. Tu és o Apeles Heringer Lisboa, PQD 11561 do 1964/3.
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