Um curandeiro, uma
atendente, uma bola de cristal, um ambiente esfumacento de incenso. O
curandeiro, com roupas de mago, apoiado num cajado, dirige-se à atendente.
- Secretária, pode mandar entrar
o primeiro paciente.
Aparece um senhor amparado
por duas muletas, caminhando com muita dificuldade, totalmente entrevado.
O curandeiro, vendo a
situação do paciente, vai logo dizendo:
- Meu amigo, não precisa
dizer nada. Já percebi o seu terrível problema. Quero que você vá para trás
daquele biombo e se concentre, pois a sua fé e a minha santidade vão curá-lo
para sempre da doença que o aflige.
O senhor, quase se arrastando,
vai para trás do biombo.
O curandeiro dirige-se,
novamente, à atendente e pede:
- Secretária, mande entrar
o segundo paciente.
Aparece um rapaz, jeito
humilde, vestindo um terno surrado, falando com uma certa dificuldade:
- Pode desabafar, meu bom
homem, diga-me o que o aflige?
- U poblema é que xou fanho
e gostaria mutcho di xer cantor brofixional. Mã cu exa voz nu dã.
O curandeiro, após ouvir a
dicção do rapaz fanho, vai logo dizendo:
- Meu filho, não precisa
dizer mais nada. Já percebi perfeitamente a sua dificuldade. A minha capacidade
de curandeiro e a sua fé irão curá-lo, para sempre, daquilo que tanto o aflige.
Vá para trás daquele biombo e se concentre, pois vou começar as minhas
orações.
Dito isso, o curandeiro
começa a se concentrar e a secretária a espalhar mais incenso no ambiente. O
homem olha fixamente para a bola de cristal, suas mãos estão trêmulas e o seu
rosto vermelho e cada vez mais crispado. Com uma voz que parece estar saindo do
além, ele dirige-se ao primeiro paciente:
- Meu filhooooo, a sua fé
vai curá-lo. Jogue a primeira muleta, não tenha medo, confie em mim, jogue a
muleta, meu filho!
Ouve-se um barulho de uma
muleta sendo jogada por cima do biombo.
- Agora, sim, que é o teste
total da sua fé. Meu filho, jogue a segunda muleta, pode confiar em mim, meu
filho, jogue a segunda muleta!
Novamente, ouve-se o
barulho de uma segunda muleta sendo jogada por cima do biombo.
- Agora, o rapaz fanho. Meu
filho, pode falar comigo! Fale, meu filho a minha capacidade e a sua fé vão
curá-lo. Fale comigo, meu filho!
Abrindo a cortina, aparece
o rosto incrédulo e assustado do rapaz fanho, dizendo:
- U rabaz da buleta cãiu!
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