(Excerto)
André Amaral de Toral
As denúncias de que o exército
brasileiro ao lutar na guerra (1864-1870) era formado por escravos não são
novas. Ao contrário, têm pelo menos cento e vinte anos. Seus primeiros autores
foram os redatores dos jornais paraguaios da época. Tratavam de menosprezar o
exército brasileiro com base no duvidoso argumento de que, por ser formados por
negros, deveria ser de qualidade inferior.
Mais recentemente, diversos autores
tentaram ressuscitar o argumento de que o exército brasileiro era formado por
negros escravos alistados compulsoriamente.
Soldados negros, ex-escravos ou não,
lutaram em pelo menos três dos quatro exércitos dos países envolvidos. Os exércitos
paraguaio, brasileiro e uruguaio tinham batalhões formados exclusivamente por
negros. Como exemplos temos o Corpo dos Zuavos da Bahia e o batalhão uruguaio
Florida. Escravos propriamente ditos, engajados como soldados, lutaram
comprovadamente nos exércitos paraguaio e brasileiro.
Para se avaliar corretamente a
participação dos negros escravos na guerra é preciso, primeiramente, esquecer
ou suspender a questão das nacionalidades envolvidas. Com efeito, se os negros
lutaram sob pelo menos três das quatro bandeiras presentes no conflito, o foco
da análise deve ser posto sob a situação dos escravos e de seios descendentes
nesses exércitos e não sobre suas nacionalidades.
Não repito aqui o erro dos ideólogos
lopiztas, que consideravam o exército brasileiro – soldados e oficiais –
formado indistintamente por macacos; e nem o dos detratores do Paraguai, que
consideravam seu exército formado por caboclos, termo depreciativo que no
Brasil designa índios e seus descendentes mais ou menos aculturados, e seu povo
formado por descendentes dos guarani,
uma vaga referência etnográfica. Negros e índios teriam sido, por essas
análises baseadas em simplificações raciais, as maiores vítimas da guerra.
Para além dessas versões ideologizantes,
procurarei esclarecer a convocação do negro, ex-escravo, aos exércitos
paraguaio e brasileiro, bem como sua participação na guerra.
Como matar a los
negros
A frase dita pelo presidente
paraguaio Francisco Solano López depois de receber na barriga o golpe de lança
do cabo de ordens do coronel Joca Tavares, seu xará Francisco Lacerda – Matem a esos diablos de macacos! –, é
reveladora da ideia que seu governo queria fazer dos brasileiros no país.
Na época da guerra (1864-1870), no Paraguai,
o negro era, antes de tudo, o inimigo. O exército brasileiro era o exército macacuno,
e seus líderes, segundo a propaganda lopizta, macacos que pretendiam escravizar
o povo paraguaio, conduzindo-os da liberdade à escravidão.
(Três macacos: Tamandaré, o
Imperador e Polidoro,
jornal El Centinela de 1867)
jornal El Centinela de 1867)
*****
Soldado Zuavo Baiano*
Uniforme estranho usado pelos
negros chamados Zuavos Baianos que lutaram na Guerra do Paraguai, de 1865 a 1870
A origem da expressão “Macacos me mordam!”
Oficiais brasileiros nos momentos finais da Guerra do Paraguai,
entre eles está o
Conde d´Eu (com a mão na cintura), 1870.
Quando o Conde D´eu, genro de Dom Pedro II, foi designado como oficial
para servir na Guerra do Paraguai, ele teria feito uma promessa ao Imperador de
que mataria o ditador paraguaio Solano Lopez. As tropas brasileiras, compostas
de muitos negros e mestiços, eram chamadas de macacos por seus inimigos. Daí o
conde teria inventado a expressão, que seria assim se ele se dirigisse aos seus
comandados: “Macacos, (vocês) me
mordam se eu não conseguir o meu objetivo, que é matar, e, consequentemente,
vencer a guerra, contra Solano Lopez.” Ou ainda: (que) os macacos me mordam, referindo aos seus
superiores (Tamandaré, Marinha; o Imperador, Comandante-em-chefe e Polidor, do
Exército), que foram retratados por um jornal paraguaio como macacos, pois
chefiavam gente escura e eles se aproveitaram disso para retratar o povo brasileiro,
um castigo (mordidas) se ele não fizesse o que havia prometido aos seus
superiores.
Militar brasileiro,
de escravo a soldado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário