Certo
deputado foi escolhido secretário da Saúde sem nada entender do assunto. Fato
raro.
Conta-se que
um assessor entrou em sua sala e, aliviado, informou:
–
Secretário, a cortisona chegou!
– Manda entrar, manda entrar – respondeu o
outro.
O
funcionário anunciou ao presidente da Caixa Econômica Federal do Rio Grande do
Sul:
– Doutor,
está aí uma comissão de membros de fora, que quer falar com o senhor.
– Pois que
guardem os membros e entrem – disse o presidente.
Em seu discurso de inauguração da
agência Partenon da caixa Econômica Federal, em 28 de outubro de 1958, o senhor
Rubem Smidt afirmou, a certa altura, a propósito de poupança:
“... devemos
guardar para as fases incertas do futuro”.
No dia
seguinte, o Diário de Notícias
publicou:
“... devemos
guardar para as fezes incertas do
futuro”.
Conta-se que, em determinada altura
da Revolução de 30 – que levou Getúlio Vargas ao poder – as tropas governistas,
acrescidas da força pública de São Paulo, opuseram firme resistência ao avanço
dos batalhões provisórios, organizados no Paraná e Santa Catarina. Sob intensa
fuzilaria, as comunicações tornaram-se difíceis, gerando noticias confusas. O
comando revolucionário, no entanto, insistia em saber como se desenvolvia as
operações.
Afinal,
chegou o primeiro comunicado. Dizia.
TOMAMOS
AREIAS E EVACUAMOS PEDREIRA.
*Areias e Pedreiras: cidades paulistas da zona do café.
Diz que, em 19 de junho de 1923,
durante o combate da Ponte do Ibirapuitã, no
Alegrete, as metralhadoras dos chimangos
legalistas de Flores da Cunha choviam balas nos maragatos revolucionários do
general Honório Lemes.
– Não tem poblema – disse o general. – Se as bala vier por cima, nóis se
abaixemo.
– E se
vierem por baixo, general?
– Nesse
caso, nóis pulemo.
– Mas, e se
vierem no meio?
– Bueno, aí nóis se quebremo.*
As sondagens do eleitorado revelavam
que aquele candidato ao governo do Estado ficara exatamente no zero por cento das estatísticas.
Procurado
pela imprensa, comentou seu chefe de campanha;
– Bem, acho que, daqui pra frente, a coisa só
deve melhorar,
João Abbott*
clinicava em São Gabriel ,
onde ficara famoso pela competência.
Certa feita, um fazendeiro de Rosário
do Sul, ferrenho inimigo político seu, quebrou a perna, logo tomada por
gravíssima infecção. Quando o doente entrou em coma, os familiares e amigos
decidiram chamar o dr. Abbott, único julgado capaz de evitar-lhe a morte.
Bastante contrariado, o médico
deslocou-se até a fazenda e, após permanecer vários dias de vigília à cabeceira
do moribundo, conseguiu salvá-lo, só retornando após colocá-lo fora de perigo.
Restabelecido, o fazendeiro mandou
telegrama ao dr. Abott, perguntando quais seus honorários profissionais.
Respondeu-lhe o médico:
“A mesma importância prometida para me assassinarem.”
Dias depois,
o banco avisava a chegada de ordem de pagamento no valor de dez contos de
réis...
*João Frederico Abbott (1857-1925): médico e político rio-grandense,
republicano e abolicionista, correligionário de Júlio de Castilhos. Em 1904,
foi secretário de Estado do governo de Borges de Medeiros.
Em 1948, o deputado estadual
Guilherme Mariante, do PTB,* começou a atacar o governo da tribuna, dada a alta
dos preços. Os operários, cujo setor ele dizia representar, estavam submetidos
a padrão de existência incompatível com a dignidade humana. Um seu opositor do PL
(Partido Libertador) pediu aparte e ponderou que aquela questão de preços não
era tão fácil de conjugar, pois decorria da lei da oferta e da procura. Ao que
o petebista respondeu, peremptório:
– E por que
ainda não providenciaram a revogação dessa lei?
Ao outro
deputado recomendou, mal contendo o riso:
– É melhor Vossa Excelência ao avançar
muito nesse assunto. Pelo que estou lembrado, essa lei é da época do doutor
Getúlio...
*O Partido Trabalhista Brasileiro foi fundado por Getúlio Vargas,
ditador de 1930 a
1945 e presidente da República eleito em 1950, tendo assumido em 1951 e se
suicidou em 24.8.1954.
(De “Um livro de
histórias”, de Renato Maciel de Sá Júnior)
*Renato Maciel de Sá Junior
nasceu no Rio de janeiro, em 27 de abril de 1941. Mas, segundo ele próprio diz,
não é carioca, é gaúcho. Morou em Porto Alegre , onde exercia a profissão de
advogado. Apaixonado pelo caso humorístico e pela anedota, Renato preferia se
considerar um contador de histórias a um escritor. Renato Maciel de Sá Junior
faleceu em 31 de julho de 1992, em Porto Alegre , RS.
Um grande praça
Renato e esposa
Permitam que em nome de Porto Alegre
e dos seus amigos, esta coluna chore a morte de Renato Maciel de Sá júnior,
sepultado ontem (1.8.1992). Impossível deixar de derramar lágrimas por tal tipo
inesquecível. As cidades são feitas de pedra e de traçados, mas são sustentadas
pela espessura espiritual de pessoas como Renato, verdadeiros arquitetos de
ternura.
Músico, bacharel, escritor, juiz
eleitoral, mas, acima de tudo, um grande praça. Conviveu com o câncer durante
12 longos anos, mas sua vida parecia ser nesse período ainda mais produtiva. Respondeu
à doença não com o desânimo dos condenados, mas com o sorriso dos venturosos.
Sentava-se à maquina não para contar a melancolia de que devera se possuir, mas
para legar-nos os Anedotários da Rua da Praia, a rua que a cidade e ele amavam,
com as humanidades dela e a sensibilidade dele.
Era um contador de casos, tenho aqui
na minha frente o seu Um livro de
Histórias, mas antes de tudo foi um agregador, um jeitão simples que fazia
amigos por onde fosse, uma alegria de viver transbordante, uma vocação para
criar e recriar, para lembrar, um atleta da solidariedade, um lado só de
atração pelas pessoas e a curiosidade pelo seu meio, um homem orgulhoso do seu
convívio e insaciável pelas manifestações da sua cidade.
A última lembrança que tenho dele foi
no bobó de camarão da Lúcia Veríssimo. Identificava e definia todas as serestas
que cantávamos, os brilho do olhar e da expressão denotando que as saboreava lá
naquele recanto sereno da sua alma musical, agitando a roda de papo com
recordações da sua memória prodigiosa.
Sempre que seu nome surgia lembrado por
alguém, fazia-se a reverência ao belo sujeito em que ele se constituía. Todos o
amavam, todos foram levar a ele ontem no Cemitério São Miguel e Almas o
agradecimento pelo calor humano que dele sempre receberam, uma saudade imperecível
já se precipitando ao redor do esquife.
Renato
e seu Sexteto era o conjunto musical que alegrava os bailes da cidade e do
Estado desde 1960, quando fundou-o. Tinha ele, o Maneca, o Sabino Loguércio, o
Gilberto Brodt, o Jaime Eduardo Machado, o Benatti, o Luís Fernando Veríssimo
como integrantes. Depois cresceram para 10 ou 11, mas ficou ainda o nome,
Renato e seu Sexteto. Foi sempre assim a dádiva do Renatinho, não importava os
nomes, importava o número de seus amigos.
Procurei ontem após o enterro o Luís
Fernando Veríssimo para colocar aqui nesta coluna algumas palavras sobre seu
grande companheiro. Ele estava tão abalado que só me pôde me pronunciar uma
frase: “Foi sempre um grande e presente amigo.”
(Paulo Sant´Ana, em 2
de agosto de 1992, em Zero
Hora )
Meu depoimento:
Quando fiz concurso para professor do
Município de Porto Alegre, fui lotado no Centro Municipal de Cultura, onde
havia um atelier livre para aulas de pintura e modelagem em cerâmica, uma
biblioteca, um teatro, um saguão para exposições de arte e um auditório também
para espetáculos múltiplos.
Numa noite, vi entrar no Teatro
Renascença uma figura da qual eu já havia lido e gostado muito de todos os seus
anedotários, Renato Maciel de Sá
Junior. E eu disse isso a ele. Agradeceu-me o comentário e a gentileza, apertou
a minha mão e deu um largo e bondoso sorriso. Isso foi, provavelmente, em 1985.
Mal sabia eu que ele já estava doente e faleceria sete anos depois, com apenas 51 anos de idade. Realmente,
ele foi um grande praça!
Nilo da Silva Moraes
O herói da novela
Corriam os tempos heroicos das
radionovelas, audiência absoluta antes do advento da televisão. Os capítulos
iam para o ar ao vivo. Ainda não eram usadas gravações.
À massa de ouvintes da Rádio
Farroupilha acompanhava o dramático final de uma comovente história de amor e
violência. A trama fluía emocionante. O galã, interpretado por Walter Ferreira,
finalmente encontrara o odiado vilão, refugiado no último andar de um edifício:
– Ah, canalha, chegou tua hora!
Prepara-te para morrer. Neste revólver está a bala que reservei para ti todos
estes anos. Toma, miserável, morre!
Naquele exato momento, nos estúdios
da Farroupilha, na Duque de Caxias com o Viaduto Borges de Medeiros, o
sonoplasta manuseou rapidamente o disco onde as diversas faixas continham toda
a variedade de sons e ruídos, como tropel de cavalos, trem andando, badalo de
sino, etc. Ao invés do esperado tiro, porém, na transmissão ouviu-se o
desconcertante mugido de uma vaca.
Walter
consertou rápido:
− E não
adianta te esconderes atrás da vaca, miserável!
*****
(Texto do livro
“Anedotário da Rua Praia 1” ,
de Renato Maciel de Sá Júnior)
de Renato Maciel de Sá Júnior)
As capas dos anedotários:
1, 2, 3,
todos de autoria de Renato Maciel de Sá Júnior.
todos de autoria de Renato Maciel de Sá Júnior.
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