quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Emília no País da Gramática



→ Este livro conta a viagem que Pedrinho, Narizinho, Visconde, Quindim e, claro, Emília fazem até o País da Gramática. Lá eles aprendem a língua portuguesa de um jeito muito divertido, usando a imaginação e a criatividade. Como? Caminhando pelos bairros da cidade Portugália, brincando de criar palavras, interjeições, orações e conversando com as senhoras Etimologia, Sintaxe, Ortografia e muitas outras, que ensinam a origem e o significado das palavras e como escrevê-las corretamente, formando frases coerentes e coesas. Como o livro foi lançado pela primeira vez em 1934, muitas regras e conceitos gramaticais antigos foram atualizados e comentados para que o leitor de hoje também viaje por esse país.

Exame e Pontuação

Depois de brincarem por algum tempo naquele jardim de Períodos, e de discutirem novamente a campeação do Visconde, os meninos resolveram ir ao bairro das Sílabas sherlockar o rapto do Ditongo – como dizia a Emília.
– Não ainda – propôs Dona Sintaxe. – Quero correr um exame nos meus alunos. Venham todos cá – e o senhor também, Seu Rinoceronte.
Os meninos e o paquiderme perfilaram-se diante da grande dama.
– Muito bem – disse ela. – Vou agora ver se essas cabecinhas guardaram o que ensinei, e para isso temos que analisar uma frase.
E voltando-se para um grupo de frases passeadeiras:
– Aproxime-se um Período para ser analisado! Depressa!...
Apresentou-se incontinenti aquele assanhadíssimo Período que dizia assim: Tia Nastácia faz bolinhos que todos acham muito gostosos.
– Vamos ver, Emília, quantas Orações há neste Período?
– Duas! – respondeu imediatamente a boneca. – A primeira é a Principal e a segunda é a Subordinada.
– Muito bem. E qual o Sujeito da primeira, Pedrinho?
Tia Nastâcia.
– Muito bem. E qual o Sujeito da segunda, senhor paquiderme?
Todos – rosnou o rinoceronte com um bamboleio de corpo.
– Muito bem. E qual o Predicado da primeira, Narizinho?
Faz bolinhos – disse a menina com água na boca, porque estava chegando a hora do jantar.
– Muito bem. E qual o Predicado da segunda, Quindim?
Acham muito gostosos – respondeu o rinoceronte, lambendo os beiços.
– Muito bem. E qual o Complemento Verbal da primeira, Emília?
Bolinhos! – berrou a boneca. – Bolinhos é o Objeto Direto do Verbo Faz — quem não sabe disso?
– Muito bem. E qual o Complemento Verbal da segunda, Pedrinho?
Que.
– Esse Que a que se refere?
– Refere-se a Bolinhos.
– Bravos! – exclamou Dona Sintaxe. – Vejo que não perdi o meu tempo. Podem ir brincar.
Foi uma gritaria, e todos saíram aos pinotes. Emília espreguiçou-se e Quindim deu uma chifrada no ar, de brincadeira.

– E agora? – disse Narizinho. – Ela nos mandou brincar; mas brincar de quê, nesta cidade de palavras? Uma ideia!... Vamos ver a Pontuação! Onde fica a Pontuação, Quindim?
– Aqui perto, num bazar. Eu sei o caminho – respondeu o paquiderme.
No tal bazar encontraram os Sinais de Pontuação, arrumados em caixinhas de madeira, com rótulos na tampa. Emília abriu uma e viu só Vírgulas dentro.
– Olhem que galanteza! – exclamou. – Vírgulas, Vírgulas e mais Vírgulas! Parecem bacilos do cólera-morbo, que Dona Benta diz serem virgulazinhas vivas.
Emília despejou um monte de Vírgulas na palma da mão e mostrou-as ao rinoceronte.
– Essas Vírgulas servem para separar as Orações, as Palavras e os Números – explicou ele. – Servem sempre para indicar uma pausa na frase. A função delas é separar de leve.
Emília soprou o punhadinho de Vírgulas nas ventas de Quindim e abriu a outra caixa. Era a do Ponto e Vírgula.
– E estes, Quindim, estes casaizinhos de Vírgula e Ponto?
– Esses também servem para separar. Mas separar com um pouco mais de energia do que a Vírgula sozinha.
Emília despejou no bolso de Pedrinho todo o conteúdo da caixa.
– E estes aqui? – perguntou em seguida, abrindo a caixinha dos Dois Pontos.
– Esses também servem para separar, porém com maior energia do que o Ponto e Vírgula.
Metade daqueles Dois Pontos foram para o bolso do menino. Emília abriu uma nova caixa.
– Oh, estes eu sei para que servem! – exclamou ela, vendo que eram Pontos Finais. – Estes separam duma vez – cortam. Assim que aparece um deles na frase, a gente já sabe que a frase acabou. Finou-se...
Em seguida abriu a caixa dos Pontos de Interrogação.
– Ganchinhos! – exclamou. – Conheço-os muito bem. Servem para fazer perguntas. São mexeriqueiros e curiosíssimos. Querem saber tudo quanto há. Vou levá-los de presente para Tia Nastácia.
Depois chegou a vez dos Pontos de Exclamação.
– Viva! – gritou Emília. – Estão cá os companheiros das Senhoras Interjeições. Vivem de olho arregalado, a espantar-se e a espantar os outros. Oh! Ah! Ih!
A caixinha imediata era a das Reticências.
– Servem para indicar que a frase foi interrompida em certo ponto — explicou Quindim.
– Não gosto de Reticências – declarou Emília. – Não gosto de interrupções. Quero todas as coisas inteirinhas – pão, pão, queijo, queijo – ali na batata! – e, despejando no assoalho todas aquelas Reticências, sapateou em cima.
Depois abriu outra caixa e exclamou com cara alegre:
– Oh, estes são engraçadinhos! Parecem meias-luas...
Quindim explicou que se tratava dos Parênteses, que servem para encaixar numa frase alguma palavra, ou mesmo outra frase explicativa, que a gente lê variando o tom da voz.
– E aqui, estes pauzinhos? – perguntou Emília, abrindo a última caixa.
– São os Travessões, que servem no começo das frases de diálogo para mostrar que é uma pessoa que vai falar. Também servem dentro duma frase para pôr em maior destaque uma Palavra ou uma Oração.
– Que graça! – exclamou Emília. – Chamarem Travessão a umas travessinhas de mosquito deste tamanhinho! Os gramáticos não possuem o “senso da medida”.
Quindim olhou-a com o rabo dos olhos. Estava ficando sabida demais...



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