Diz que era uma vez quatro ladrões
muito sabidos e finos. Num domingo de manhã estavam deitados, gozando a sombra
de uma árvore, quando viram passar na estrada um homem levando um carneiro
grande e gordo. Palpitaram furtar o carneiro e comê-lo assado. Acertaram um
plano e se espalharam por dentro do mato.
O primeiro
ladrão foi para o caminho, encontrando o homem do carneiro e salvou-o:
– Louvado
seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
– Para
sempre seja louvado!
– O senhor,
que mal pergunto, para onde leva este cachorrinho?
– Que
cachorrinho?
– Esse aí
que está amarrado numa corda! Bem bonitinho!
– Isso não é
cachorro. É carneiro. Repare direito.
– Estou reparando, mas é cachorro
inteiro. Vigie o focinho, as patas, o pelo. É cachorro e dos bons.
Separaram-se e o dono do carneiro
ficou olhando o animal meio desconfiado. Adiante saiu o segundo ladrão, deu as
horas, e foi logo entrando na conversa:
– Cachorro bonito! Esse dá para tatu
e cutia. Focinho fino, bom para farejar. Perna fina corredeira. É capaz de
correr veado. Onde comprou o bicho?
– O senhor repare que não é cachorro.
É um carneiro. Já outro cidadão ali atrás veio com essa palúxia para meu lado.
Bote os olhos direito no bicho.
– Homem, desde que nasci que conheço
cachorro e carneiro. Se esse aí não é o cachorro eu ando espritado. Deixar de
conhecer cachorro?
O homem seguiu sozinho, mas não
tirava os olhos do carneiro, quase convencido de que comprara o bicho errado. O
outro ladrão apareceu e fez a mesma conversa, misturando os dois animais, e
ficando espantado quando o dono dizia que era um carneiro. Discutiram um bom
pedaço e o terceiro ladrão espirrou para dentro do marmeleiro.
O quarto camarada veio e puxou
conversa, oferecendo preço para o cachorro que dizia ser bom caçador de preás.
Deu os sinais de cachorro de faro e todos encontravam no bicho que o homem ia
levando.
Assim que despediu, o dono do
carneiro, que ia comendo o animal com os olhos, parou, desatou o laço da corda
e soltou o carneiro, certo e mais que certo que o carneiro era cachorro. Os
quatro ladrões que vinham acompanhando por dentro da capoeira agarraram o
carneiro e fizeram dele um almoço especial.
Luís da Câmara
Cascudo:
“Contos tradicionais
do Brasil”. São Paulo: Global, 2009.
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