segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Os quatro ladrões



Diz que era uma vez quatro ladrões muito sabidos e finos. Num domingo de manhã estavam deitados, gozando a sombra de uma árvore, quando viram passar na estrada um homem levando um carneiro grande e gordo. Palpitaram furtar o carneiro e comê-lo assado. Acertaram um plano e se espalharam por dentro do mato.

O primeiro ladrão foi para o caminho, encontrando o homem do carneiro e salvou-o:

– Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

– Para sempre seja louvado!

– O senhor, que mal pergunto, para onde leva este cachorrinho?

– Que cachorrinho?

– Esse aí que está amarrado numa corda! Bem bonitinho!

– Isso não é cachorro. É carneiro. Repare direito.

– Estou reparando, mas é cachorro inteiro. Vigie o focinho, as patas, o pelo. É cachorro e dos bons.

Separaram-se e o dono do carneiro ficou olhando o animal meio desconfiado. Adiante saiu o segundo ladrão, deu as horas, e foi logo entrando na conversa:

– Cachorro bonito! Esse dá para tatu e cutia. Focinho fino, bom para farejar. Perna fina corredeira. É capaz de correr veado. Onde comprou o bicho?

– O senhor repare que não é cachorro. É um carneiro. Já outro cidadão ali atrás veio com essa palúxia para meu lado. Bote os olhos direito no bicho.

– Homem, desde que nasci que conheço cachorro e carneiro. Se esse aí não é o cachorro eu ando espritado. Deixar de conhecer cachorro?

O homem seguiu sozinho, mas não tirava os olhos do carneiro, quase convencido de que comprara o bicho errado. O outro ladrão apareceu e fez a mesma conversa, misturando os dois animais, e ficando espantado quando o dono dizia que era um carneiro. Discutiram um bom pedaço e o terceiro ladrão espirrou para dentro do marmeleiro.

O quarto camarada veio e puxou conversa, oferecendo preço para o cachorro que dizia ser bom caçador de preás. Deu os sinais de cachorro de faro e todos encontravam no bicho que o homem ia levando.

Assim que despediu, o dono do carneiro, que ia comendo o animal com os olhos, parou, desatou o laço da corda e soltou o carneiro, certo e mais que certo que o carneiro era cachorro. Os quatro ladrões que vinham acompanhando por dentro da capoeira agarraram o carneiro e fizeram dele um almoço especial.

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Luís da Câmara Cascudo:

Contos tradicionais do Brasil”. São Paulo: Global, 2009.


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