Escrito por Joel
Rufino dos Santos
Os dois escritores ficaram em lados
opostos. Bilac era civilista e neoliberal (diríamos hoje). O Brasil só iria pra
frente se o Estado não se metesse, se tratássemos bem o capital estrangeiro
etc. Pompeia, ao contrário, era jacobino: só o nacionalismo nos salvaria
através de um Estado forte que controlasse o capital estrangeiro etc.
Em abril de 1892, estava marcado um
duelo no Rio Comprido, zona norte do Rio de Janeiro. Raul Pompeia se bateria
com um poeta cujo nome é um verso de 12 sílabas, alexandrino perfeito, Olavo
Brás Martins dos Guimarães Bilac. Motivo: Bilac insinuou, na imprensa, que o
autor de O Ateneu se masturbava toda noite. Pompeia, em resposta, insinuou que
Bilac era filho de um incesto.
De fato, a briga era mais séria e
antiga. Ex-colegas na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, São Paulo,
os dois divergiam politicamente. Com o governo Floriano Peixoto (1892-94), a
opinião pública chegou àquele ponto em que os nós não se desamarram mais:
cortam-se. Os dois escritores ficaram em lados opostos. Bilac era civilista e neoliberal
(diríamos hoje). O Brasil só iria pra frente se o Estado não se metesse, se
tratássemos bem o capital estrangeiro etc. Pompéia, ao contrário, era jacobino:
só o nacionalismo nos salvaria através de um Estado forte que controlasse o
capital estrangeiro etc.
Escreviam em jornais inimigos e, com
pouco, partiram para ofensas pessoais. Estas levaram ao duelo. Pediram a
Pompeia que escolhesse as armas. “Tanto faz. Nunca usei nenhuma.” A polícia
soube e chegou a tempo. Marcaram uma segunda vez, agora no ateliê do escultor
Bernadelli, na Lapa. Sacaram os floretes, depois de desinfetados, mas os
padrinhos decidiram dar por encerrado o desafio.
Honras lavadas, os amigos de outrora
se apertaram as mãos, meio sem jeito. A briga, porém, não acabou. Pompeia era
diretor da Biblioteca Nacional. Floriano morreu e seus restos iam ser
trasladados. No cemitério São João Batista, Pompeia fez um discurso vermelho. A
oligarquia latifundiária e o imperialismo iam acabar com o Brasil etc. A
polícia do governo Prudente de Morais, que era o contrário de Floriano, acabou
com o comício fúnebre. Bilac aprovou, pediu a demissão de Pompeia. Prudente o
demitiu.
Outra vez, desmanchar o nó era tarde,
só cortando. Dias depois, Pompeia tirou férias da imprensa. Enquanto isso,
outro adversário, Luís Mürat, continuou a desancá-lo. Pompeia soube um mês
depois, se queimou. Que pensariam os amigos e leitores? Que não respondeu por
covardia.
O Natal de 1895 chega um pouco
nublado. No palacete número 116 da Rua São Clemente, em Botafogo, o único homem
da família está inquieto e sozinho. Não quer conversa com a mãe nem com a irmã.
Três dias antes, disse a um amigo:
“No Brasil, só há um ato digno para
um homem honesto: pegar de um revólver e salpicar com os miolos esta terra sinistra
e ao mesmo tempo pulha.” Por volta do meio-dia, ouviram um estampido num dos
quartos que dava para a rua. Acharam agonizante o autor de O Ateneu, o filho
querido daquela abastada família de Jacuecanga, em Angra dos Reis. Não estourou
os miolos. Deu um tiro na altura do coração. Deixou um bilhete:
“À Notícia e
ao Brasil declaro que sou um homem de honra”.
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