Uma personagem da Porto Alegre antiga...
Maria Chorona
Pergunto a
você: a voz de Maria Chorona, que impressão lhe dava?
Lembro bem o pregão que ela soltava
lá na esquina da Ladeira. A voz lamentosa, não sei por quê, trazia-me à
lembrança noites de inverno já sumidas, quando o vento espichava longos gemidos
nos lampiões a gás. E compunha o mais tristonho dueto que já ouvi, com os
vendedores noturnos – “Pinhão quente!... Tá quentinho o pinhão!” No sótão da
velha casa da Rua da Igreja a gente se encolhia entre as cobertas. O minuano
galopava solto pelas ruas.
A voz de Maria Chorona me parecia
assim, gemido de lampião, pinhão quente gritando no frio.
Dona do lugar, ela enxotava os
pequenos vendedores de jornais que lhe faziam concorrência. O pregão era desolado
e sóbrio: “Correio... Diá...” mal a rua amanhecia. Os outros, mais ágeis e
imaginosos, infiltravam-se pelos grupos, gritando manchetes que pareciam pingar
sangue: “A Fôia!... o retrato da vítima!”. Mesmo assim a Maria tinha clientela
particular, que caminhava mais um pouco para buscar na pilha dela o seu jornal.
Enrolada em panos, enfrentava o cruzamento frio da esquina, misturando lamentos
ao tinir das campainhas lotéricas, ao rumor do povo, ao apito do guarda.
Passa mais uma lufada e também ela é
carregada pelo vento.
(Do livro “Rua da
Praia”, de Nilo Ruschel)
Rua da Praia, Largo
dos Medeiros e Rua da Ladeira,
local onde Maria Chorona vendia seus jornais.
local onde Maria Chorona vendia seus jornais.
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