Eu caminhando em Portugal, próximo da
fronteira com a Espanha, Caminho de Compostela, perguntei a um sujeito parado
em uma porteira de uma fazendola:
− Esta
estrada vai para a Espanha?
Respondeu sério e meio contrariado:
− Se vai,
não sei, mas se for, vai fazer muita falta...
Meus pais e meus tios estão em Lisboa. Vão ao
restaurante almoçar. No final, o garçom pergunta:
− Café?
Meu pai:
− Um, por favor.
Meu tio:
− Dois!
Minha tia:
− Três!
Passam alguns minutos e lá vem
o garçom. Com seis cafés.
Querendo me informar mais sobre os
acompanhamentos de um dos pratos de um restaurante em Alfama, perguntei ao
garçom:
− Mas como
vem esse bife aqui?
Ele prontamente me respondeu:
− Alguém o traz da cozinha!
Uma vez fui
a um restaurante que servia leitão à bairrada:
− Oi, como é o leitão à
bairrada?
− Ora, não sabes o que é um
leitão?
− Sim, mas o que é à bairrada?
− A região onde estamos.
Meu padrasto estava em um ônibus em
Portugal com a família e viram em um outdoor escrito algo como “Pasteizinhos de
Belém, desde 1920”
e uma foto dos pasteizinhos.
Ele comentou
com a família, brincando:
− Olha, gente! Desde 1920!
No que uma senhora portuguesa
interrompeu:
− Me perdoem, mas aqueles já foram
comidos, chegando lá vão encontrar outros fresquinhos.
Um cliente estava indeciso sobre o
que pedir. Viu um garçom passando com um prato que o agradou e falou para o que
o atendia:
− Pode me
trazer aquele.
A resposta do garçom:
− Não será possível porque
aquele já é do senhor da mesa ao lado.
Minha amiga estava almoçando no mesmo
restaurante que Fernando Pessoa frequentava assiduamente.
Como ela é formada em Letras, com
mestrado em Literatura, estava mais interessada nas histórias do lugar do que
na culinária.
No momento de escolher, chama o
garçom e pergunta qual era o prato preferido de Fernando Pessoa. Sem
pestanejar, ele responde:
− Já se
quebrou há muito tempo!
Estávamos num hotel em Lisboa e
descemos para fumar. Decidi ir até a recepção para pedir um táxi. Perguntei à
funcionária:
− Por favor, você poderia chamar
um táxi pra mim?
A funcionária disse que sim,
continuou a fazer o que estava fazendo e não chamou o táxi. Daí eu percebi que
estava dentro da piada.
Voltei para fora para rir um
pouco com minha amiga e voltei novamente para a recepção, como se nada tivesse
acontecido.
Claro que ela poderia chamar um
táxi, não havia nada que a impedisse de fazê-lo.
Daí eu falei:
− Eu preciso de um táxi agora.
E ela:
− Pois não, senhoire.
E ligou para o táxi.
Um dia em Lisboa eu parei um sujeito
na rua e perguntei: “O senhor sabe como chegar no castelo de São Jorge?” Ele
respondeu “sei!” e continuou andando.
Meus tios
estavam passeando em Portugal e pediram a um senhor:
− Por favor, pode tirar uma
foto?
− Claro!
Foi lá e abraçou a minha tia
posando pra foto.
Eu estava
saindo do hotel e perguntei a alguém:
− Esse ônibus parado aí passa no aeroporto?
O cara responde:
− Não, passa em frente a ele.
Uma vez eu
pedi no balcão de uma confeitaria:
− O senhor me vê dois pasteis
de Belém?
O cara foi, olhou e não pegou
nada.
Eu perguntei:
− Os meus pastéis de Belém?
E ele:
− Ah, a senhora quer que eu lhe
dê dois pasteis? Porque só me pediu que os visse.
Um dia, eu estava no aeroporto em
Lisboa e ia pegar uma conexão para Londres. Vi uma fila, perguntei a uma
senhora que trabalhava no aeroporto:
− Londres é
aqui?
Ela muito simpática, disse:
− Não, aqui
é Lisboa, e sorriu.
Fui numa
doceria no Porto e perguntei para o garçom:
− Posso pedir aqui no balcão ou pode sentar
na mesa?
Ele:
− Prefiro que você sente na
cadeira mesmo.
Fui comprar
pastéis de Belém no local onde eles são fabricados.
Lugar lotado, balconistas concentrados,
atendendo todo mundo super-rápido e com muita seriedade.
Os pastéis
de Belém vêm (ou pelo menos vinham) numa caixinha sextavada de papelão.
Eu e minha mãe nos aproximamos
do balcão, e ela pergunta a um dos atendentes:
− Os pastéis de Belém são
aquela caixinha?
O balconista responde:
− Não, senhora, é o que tem
dentro!
Ele continuou os atendimentos
supersério e eu e minha mãe caímos na gargalhada.
Num bar no
centro histórico de Lisboa, uma brasileira entra e pergunta:
− Posso estacionar aqui na
frente?
O balconista responde:
− Claro que pode. Só corre o
risco de levar uma multa.
Minha tia
estava com uma amiga no restaurante. O garçom criou coragem e indagou:
− Que língua estás a falar que
estou entendendo tudo?
*****
Mas qual é a explicação para essas
histórias? No post de Alexandre Rosas, Felipe Cortez de Sá escreveu:
Eu tive um professor de Lógica que estudou
por um tempo em Portugal e um dia ele disse à turma que português não é burro,
e sim 'lógico'. Depois que ele disse isso eu passei a ouvir essas histórias
pensando de outro jeito.
No mesmo post, a portuguesa Inês Azevedo
levantou duas hipóteses:
Perdoem-me, mas nunca vi nada do gênero
em tempo real, parece que só acontece na comunicação entre portugueses e
brasileiros.
O erro está em pensarmos que somos a mesma língua quando, na prática, não é bem assim.
Também ponho a hipótese de que muitas vezes possa ser o humor português a atacar, é bem irônico e sutil, quando não se está familiarizado com a cultura não se distingue quando é brincadeira ou não.
Ana Luisa Prado, também portuguesa,
ofereceu seu ponto de vista sobre a história dos cafés:
Como portuguesa te digo que considero
esta história perfeitamente possível e compreensível. Porque em Portugal não é
comum que se faça pedidos dessa forma.
Normalmente cada um diz o que quer, o garçom que faz a soma. E a ele não cabe julgar se alguém quer encher-se de café ou não. Ele vai te dar exatamente o que pedires, mesmo que considere teu pedido um tanto estranho.
É verdade, somos bem mais
literais que os brasileiros!
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