Versos de Xano*
* Filho da Paraíba, jangadeiro de
profissão, Xano, ou melhor, Feliciano Gonçalves Simões escreveu boa poesia
popular, recolhida, em parte, pelos pesquisadores do nosso folclore. Aqui vai
uma amostra da inspiração de Xano:
Houve um
barulho dos diabos
Lá na casa do
Gonçalo;
A mulher deu
no marido,
A galinha deu
no galo.
O pinto foi
se meter,
Apanhou como
um cavalo!
Valha-me
Nossa Senhora,
Mãe de Deus,
ó Virgem Pia!
Ainda não vi
o mar
Mas senti a
maresia;
O sol pendeu −
é de tarde.
Deu doze
horas – é meio-dia;
Cachorro que
engole osso
Nalguma coisa
se fia...
O casamento
civil
É lei da
maçonaria...
É pecado
muié-dama
Ter o nome de
Maria.
E home, até
mesmo padre,
Ter o nome de
Messia.
A luz do sol
gratuite
A todo o mundo
alumeia;
Ferro de
bronze não quebra
E pau pixe
não brandeia.
Doce bom não
desonera,
Quem é bom
não titubeia,
A água corre
no rio,
O sangue
corre na veia.
Os olhos
dançam na caixa,
Cobertos c′as
sobranceia;
O amor, não
sendo firme,
Com qualquer
coisa vareia.
Não hai moita
como a casa
Nem mau
patrão como o nobre,
Nem marido
como o galo,
Nem devoto
como o pobre.
Não hai
fruita como a uva,
Nem riqueza
como a chuva,
Nem crise
como a de cobre...
Eu comprei
uma galinha
Por quatro
mil e quinhentos,
Depois da galinha
morta,
Os pintos
piaram dentro.
Boi gordo tem
é gordura,
Porco gordo
tem toicinho.
Todo cristão
tem é cara
E porco tem é
focinho.
Caçador anda
no mato.
Comboeiro no
caminho;
Filho de vaca
é bezerro,
Filho de
besta é padrinho,
O rico tem
inimigo,
O pobre tem
mau vizinho.
Quem anda bem
amontado
Entende que
tudo é perto;
Quem tem
dinheiro no bolso
Acha o mundo
um céu aberto;
Muita coisa
eu posso errar,
Mas a maior
parte eu acerto!
Ninguém sabe
o que eu vi hoje
Na varge da
Paraíba;
Vi uma velha
rezando
Com a sola
dos pés pra riba.
Água
espalhada é lagoa.
Poço fundo é
cacimbão.
Eu sou espinho
de favela
Quem duvidar
bote a mão.
O prometido é
devido
Quando chega
a ocasião.
Às vezes me
faço de besta
Pra poder
melhor passá...
Infeliz do
cantador
Que armar a
mão pra me dá:
Tiro-lhe a
carne dos ossos,
Faço manta e
boto sá!
(Do Almanaque do
Barão de Itararé de 1949)
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