segunda-feira, 9 de abril de 2018

Sinfonia do Rio de Janeiro

Autores: Billy Blanco e Tom Jobim


(Capa do LP de 1954)

A parceria de Billy Blanco e Tom Jobim deu origem a uma obra de capital importância na história da fonografia brasileira, a Sinfonia do Rio de Janeiro, registrada num LP lançado em dezembro de 1954. Em verdade era uma suíte formada por movimentos, com quadros musicais que, intercalados por um tema principal, se sucediam na interpretação individual de vários cantores. Ocupando o lado A de um LP de dez polegadas, foi considerado uma grande ousadia na época.

“A Sinfonia do Rio de Janeiro”, relembrou Billy Blanco, “é uma espécie de viagem no tempo da cidade, uma memória musical da cidade porque falava de todas as coisas possíveis. A sinfonia foi feita na casa do Tom. Eu estava mais imbuído do assunto, certo dia saltei de um lotação e para não esquecer entrei num botequim, telefonei para a casa do Tom e disse:

− Tom, pega papel de música aí, rapidinho. Escreve um negócio aí. Páá-pa-pa-páá-pa-pa-pááá-pa-pa-pá-pááá, é devagar, devagar.

− O que é isso?

− Olha, a letra disso é: “Rio de Janeiro que eu sempre hei de amar/Rio de Janeiro, a montanha, o sol e o mar”. Isso é um tema de uma coisa que eu bolei aqui no meio da rua, chamada Sinfonia do Rio de Janeiro. Agora vamos pegar os morros, as coisas que acontecem, e vamos fazer uma música sobre esse assunto.

Eu fui e nós começamos a fazer. Ele sentado ao piano e eu andando no meio da sala conversando. Ele dizia uma coisa e eu outra. Letra e música foram saindo em comum a partir do tema. O título é ʽRio de Janeiro, a montanha, o sol e o mar: sinfonia popular em tempo de sambaʼ. Aí nós aparecemos no meio musical como compositores diferentes.”

(...)

A gravação da Sinfonia, com 15 minutos e 37 segundos de duração, exigiu uma produção custosa e difícil, pois, como ainda não existia gravação de fita, foi feita diretamente em acetato, impedindo a correção de erros dos cantores ou da grande orquestra. Com uma câmara de eco no banheiro do estúdio, foram gravados dois acetatos, um com a orquestra e outro incluindo vozes

(Do livro “Copacabana – A trajetória do samba-canção”,
de Zuza Homem de Mello)

Abertura

Rio de Janeiro,
Que eu sempre hei de amar.
Rio de Janeiro,
A montanha, o sol e o mar.

Rio de Janeiro,
Que eu sempre hei de amar.
Rio de Janeiro,
A montanha, o sol e o mar.

Festival de beleza,
Natureza sem par,
Rio de Janeiro,
Que eu sempre hei de amar.

Hino Ao Sol

Eu quero morrer num dia de Sol,
Na plenitude da vida,
Tão bela e querida,
Que acaba amanhã, de manhã.
Quem sabe eu voltarei outra vez,
Num raio claro de sol,
Num pingo de chuva,
Que cai de manhã
No meu Rio...

Rio de Janeiro,
Que eu sempre hei de amar.
Rio de Janeiro,
A montanha, o sol e o mar.

Coisas do Dia

Sete horas, quanta gente
Vai à rua procurando ônibus, trem...
Não vem o lotação.
Atrasado no trabalho.
Resultado: confusão.
Segue o dia, sol bem quente,
Derretendo toda a gente.
Calor! Calor!
Não posso trabalhar,
Com licença, um momentinho,
Vou tomar um cafezinho.
Cafezinho! Cafezinho! Cafezinho!
Cafezinho... Cafezinho...

Matei-me no trabalho

Que dia de canseira,
Matei-me no trabalho.
Vou espairecer
Na gafieira ou no baralho.
Talvez, com este Sol,
Eu vá ao futebol,
Porém o céu azul
É um convite à zona sul.
O Mengo vai perder,
Não vou ao futebol.
Lutei semana inteira,
Quero o meu lugar ao Sol.
Um bom fim de semana
Será Copacabana.
Eu quero visitar
Um morador chamado mar.

Zona Sul

O mar, o sol e o céu azul
Me obrigam a procurar
A zona sul.
Copacabana sempre cheia,
Não há lugar naquele
Mundo de areia.
Eu vou correr para o Leblon,
Ou fico em Ipanema,
Que também é bom.
Se eu encontrar por aí
Algum amor,
Vou me esconder no Arpoador...

Arpoador

Arpoador... meu cantinho de areia,
O cartão de visita da zona sul
Convidando a sereia.
Arpoador, meu recanto encantado,
Onde eu deixo de lado
As mágoas do amor,
Com outro amor ao lado.
O Sol, que ilumina meu Rio de Janeiro,
Beijando a mais linda mulher do país.
Guardou pra você o olhar derradeiro,
E ao descer no horizonte, ele morre feliz...

Noites do Rio

Quando a noite desce,
Uma Lua vem sempre espiar
O namoro da praia
Com as ondas do mar.
Copacabana que desperta,
Banco de praia sem lugar,
Canta a canção
Que a noite convida a cantar.

Noites do Rio, perto do mar.
É uma boate, ou é um bar.
Um Cadilac, um picolé,
Ou um cinema, passeio a pé.
Se estou com frio, entro num bar.
Se faz calor, entro num bar.
A noite acaba, grande criança,
Vem novo dia, nova esperança...

O Mar

O mar, quanto tempo esperou
A cidade crescer.
O mar, quanto tempo esperou
A cidade chegar.
Um dia rasgaram a montanha,
E o túnel do Leme se abriu.
O mar recuou gentilmente,
E o bairro bonito surgiu...

Copacabana, cidade menina,
Onde o mar, o mais velho
Habitante da areia,
O mais íntimo amigo,
De tanta sereia,
Zangado no inverno,
Pois é desprezado
E tão sossegado,
Durante o verão,
O mar, na mudez barulhenta,
Não quer solidão...

A Montanha

No alto, bem alto, tão alto,
Pertinho do sol,
Que ilumina esse mar,
Mantendo a seus pés a beleza,
Sua grande riqueza,
É a luz do olhar.
Quem é que não
Perde a esperança
No dia melhor, o eterno amanhã.
Os morros, os morros do Rio de Janeiro,
Favela, Mangueira e Salgueiro...

O Morro

Morro, eu conheço a tua história,
Um passado que é só glória,
Mesmo sem orquestração.
Morro, da desforra e da intriga,
Até mesmo numa briga,
Vais buscar inspiração.
Morro, que na roupa és mal-vestido,
Deus te fez o escolhido
Pra fazer samba melhor.
O morro, bem distante do pó da cidade,
Onde o samba é Brasil de verdade,
E o progresso ainda não corrompeu.

O morro, onde o dono de todo barraco,
É forte no samba, o samba é seu fraco.
Um samba tão bom que a cidade esqueceu. (bis)

E quando a tristeza do morro
Consegue descer,
Contando o seu mal,
O pranto nos é ofertado
Na forma bonita do seu carnaval.

Descendo o Morro

Dá licença, meu senhor,
Dá licença de passar.
O samba, que é verdadeiro,
Que nasce no alto,
Que desce do morro
Pra vir no asfalto
Chorar tanta dor.
Ai, ai, ai Lá, lá, lá, lá, lá. (bis)

Meu senhor,
Quando fizer calor
Não peça pra chover,
Por caridade.
Barracão não conhece cobertor,
E dentro dele chove de verdade.

O Samba de Amanhã

Com este sol, a montanha e o mar,
Encontrei três razões de beleza da vida,
Que acaba amanhã.
Depois de ver, de sentir e amar,
Não importa morrer,
Pois pra mim só o fim é depois
Do Rio de Janeiro,
Meu eterno e belo.

Rio de Janeiro a montanha, o sol e o mar.
Rio de Janeiro,
Que eu sempre hei de amar.
Rio de Janeiro,
A montanha, o sol, o mar.

Rio de Janeiro, a montanha, o sol e o mar
Que eu sempre hei de amar...

Rio de Janeiro,
A montanha, o sol, o mar.
Rio de Janeiro, a montanha, o sol e o mar
Que eu sempre hei de amar...

No YouTube, há um vídeo com a gravação da Sinfonia do Rio de Janeiro de Billy Blanco e Tom Jobim - Regência Gilson Peranzzetta - Sala Cecília Meireles, centro do Rio de Janeiro, dezembro de 2011. No final, Billy Blanco, ainda vivo, de terno de linho branco, é carinhosamente ovacionado pelo público.

P.S. Há, também, na internet, uma gravação, sem imagens, da Sinfonia do Rio de Janeiro, de Tom Jobim e Billy Blanco, do ano de 1954, e outras regravações, como a gravação da capa abaixo.



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