segunda-feira, 29 de abril de 2019

O Conselheiro Acácio



O Conselheiro Acácio por Arnaldo Ressano-1945

→ Conselheiro hipócrita e enfatuado, ridículo e convencido. É o símbolo do convencionalismo e da respeitabilidade burguesa. Representa o constitucionalismo e o formalismo oficial.

→ Natural de Lisboa, ex-director geral, fora nomeado conselheiro por carta régia.

→ Os seus gestos eram sempre medidos. Crítico severo e autor. Não tinha família e habitava o 3º andar da Rua do Ferragial. Vivia amantizado com uma criada.

→ Ocupava-se da economia política e era cavaleiro da Ordem de Santiago.

→ Fisicamente, era alto, magro, de rosto comprido, afilado e calvo, vestia-se habitualmente de preto, “com o pescoço entalado num colarinho direito”.

Descrição de Eça de Queirós no livro “O Primo Basílio”

Era alto, magro, vestido todo de preto, com o pescoço entalado num colarinho direito. O rosto aguçado no queixo ia-se alargando até à calva, vasta e polida, um pouco amolgada no alto; tingia os cabelos que de uma orelha à outra lhe faziam colar por trás da nuca - e aquele preto lustroso dava, pelo contraste, mais brilho à calva; mas não tingia o bigode: tinha-o grisalho, farto, caído aos da boca. Era muito pálido; nunca tirava as lunetas escuras. Tinha uma covinha no queixo, e as orelhas grandes muito despegadas do crânio.

Fora, outrora, diretor-geral do Ministério do Reino, e sempre que dizia “El-rei!” erguia-se um pouco na cadeira. Os seus gestos eram medidos, mesmo a tomar rapé. Nunca usava palavras triviais; não dizia vomitar, fazia um gesto indicativo e empregava restituir. Dizia sempre “o nosso Garrett, o nosso Herculano”. Citava muito. Era autor. E sem família, num terceiro andar da Rua do Ferregial, amancebado com a criada, ocupava-se de economia política: tinha composto os Elementos genéricos da ciência da riqueza e a sua distribuição, segundo os melhores autores, e como subtítulo: Leituras do serão! Havia apenas meses publicara a Relação de todos os ministros de Estado desde o grande Marquês de Pombal até nossos dias, com datas cuidadosamente averiguadas de seus nascimentos e óbitos.

*****

→ Conselheiro Acácio é uma das personagens da obra O Primo Basílio, de Eça de Queirós. Esta figura fictícia tornou-se célebre como representação da convencionalidade e mediocridades dos políticos e burocratas portugueses dos finais do século XIX, sendo até à atualidade utilizada para designar a pompa balofa e a postura de pseudo-intelectualidade utilizada por muitas das figuras públicas portuguesas. Deu origem ao termo acaciano, designação utilizada para tais figuras ou para os seus ditos.


Conselheiro Acácio por Bernardo Marques

 Vocábulos Literários

Acaciano → deriva do ridículo Conselheiro Acácio, personagem do romance “O Primo Basílio”, de Eça de Queirós. Embora a figura do Conselheiro seja vista como uma crítica ao moralismo hipócrita e ao apego às meras aparências sociais, o termo imortalizou outra faceta da personagem: o hábito de proferir, com toda a pompa e solenidade, frases absolutamente ocas e triviais. Por isso, “frases acacianas” ou “verdades acacianas” servem para criticar a banalidade ou o absurdo de qualquer afirmação. Um bom exemplo é a frase “em futebol, ou se ganha, ou se perde, ou se empata”, dita em tom sério e solene.

(Prof. Cláudio Moreno)


“O Primo Basílio” faz parte da segunda fase da obra de Eça de Queirós, iniciada com a publicação de “O crime do Padre Amaro”. O objetivo central do autor nessa fase foi destruir a burguesia através de críticas mordazes e da ironia corrosiva que marcou seu estilo, daí as sátiras destrutivas à sociedade portuguesa. Foi também a forma encontrada para levar avante os objetivos da geração realista portuguesa, que se pretendia socialista.

A crítica de “O Primo Basílio” é contra toda a sociedade lisboeta, marcada pela ociosidade burguesa, a futilidade, a devassidão, a imoralidade, a hipocrisia social, a superficialidade nos relacionamentos, a falsidade e a arrogância que o dinheiro parece criar em certos indivíduos.

 “O Primo Basílio” procura atacar a mediocridade burguesa, representada de maneira às vezes caricatural em Jorge e Luísa, através de um episódio doméstico, inspirado em “Madame Bovary”, de Gustave Flaubert, e em “Eugênia Grandet”, de Honoré de Balzac. O casal estampa, por assim dizer, essa sociedade aparentemente tranquila, mas que oculta em seus subterrâneos, imoralidades mantidas secretas para o grande público: desejos sexuais inconfessáveis, relacionamentos amorosos vulgares, ambições pessoais indisfarçáveis e um culto zeloso da aparência, que nem sempre conseguem sufocar o ranço de decadência e ascensão social forçada.

(Do Blog Travessia Poética)



Você conhece a origem da expressão:

“à moda Miguelão”?

Surgimento do dito está relacionado ao ex-prefeito de Giruá,
Miguel Szostkiewicz.


Esta história tem início no ano de 1896, quando o padre polonês Miguel Francisco Szostkiewicz foi designado pela diocese de Porto Alegre para a cidade de Caxias do Sul. Lá, foi indicado para trabalhar nos distritos do município, nas colônias. Após um ano, conheceu e apaixonou-se por uma jovem de família também polonesa, chamada Helena Rimer Zehanoski. O jovem padre resolveu abandonar a batina para casar-se com a conterrânea.

Para isso, consultou o bispo de Caxias do Sul, que, por sua vez, transferiu a questão ao arcebispo da Arquidiocese Eclesiástica de Porto Alegre, que a encaminhou ao seu superior, o papa. Transcorrido um ano, veio a autorização papal. Casaram-se. Após um ano, nasceu um filho, ao qual deram o nome de Miguel Francisco Szostkiewicz Filho. Depois, o casal Szostkiewicz transferiu-se para Santa Maria e, mais tarde, para Ivorá.

Posteriormente, mudou-se para Santo Ângelo, onde Miguel Filho passou a trabalhar em uma firma exportadora de madeira chamada Scarpelini. Como o distrito de Giruá era grande exportador de madeira, Miguel passou a morar e a comprar a matéria-prima em Mato Grande, também distrito de Santo Ângelo. Miguel, uma pessoa cordial, fez amizade em toda a região noroeste do Estado. Por ser simples e comunicativo, elegeu-se vereador para a Câmara de Santo Ângelo. Com a emancipação de Giruá, em 1955, na primeira eleição lá realizada, outra vez elegeu-se vereador.

No segundo pleito, Miguel candidatou-se a prefeito e venceu. No término de sua gestão, em 1963, concorreu ao cargo de vereador e, novamente, foi eleito. Provavelmente num fato inédito na política brasileira, em 1964, Miguel, como vereador em Giruá, foi convidado a candidatar-se a prefeito do recém-emancipado município de Campina das Missões. E foi eleito! Mas, para essa mesma legislatura, de 1964 a 1968, também se candidatou a deputado estadual, ficando como suplente. Miguel não respeitava protocolos e, inquieto, não era de esperar muito tempo quando se tratava de trabalho.

Em certa ocasião, na sala de espera do Palácio Piratini, aguardava para falar com o governador Ildo Meneghetti. Miguel já estava nervoso pela demora. Quando surgiu um garçom com uma bandeja com café, levantou-se, tomou-a das mãos do garçom e entrou no gabinete do governador. Meneghetti, que conhecia a irreverência do companheiro de partido, não se preocupou e mandou que ele sentasse. Após despachar com os secretários, chamou Miguel para conversar. Depois de um bate-papo político, segundo a lenda, o governador perguntou para Miguel:

“E daí, polaco, como está a zona por lá?”. Miguel teria respondido: “Olha, governador, andei meio adoentado, por isso, não tenho ido até lá. Mas me disseram que chegou uma mulher nova, lá de Cruz Alta”. “Não, polaco, quero saber é da política lá da tua região.”

O titular eleito renunciou e Miguel também se tornou deputado. Convocado para assumir o cargo, o fez e, no dia seguinte, renunciou, voltando a Campina das Missões para reassumir a prefeitura.

Na década de 1980, ou pouco antes disso, em Capão da Canoa, havia um quarteirão da Avenida Paraguaçu onde a maioria dos terrenos era de propriedade de famílias de Giruá. Ali, havia um terreno desocupado, onde, todas as tardes, uma turma se juntava para bater bola. Entre esses “atletas” figurava o jornalista e comentarista esportivo Lauro Quadros.

O grupo de Giruá formava duas equipes. Quando estava perdendo, reclamava: “A nossa defesa está furada, os adversários entram à moda Miguelão, quando querem!”. Lauro Quadros, o comentarista que garimpava ditos populares para aproveitar em suas locuções, de tanto ouvir aquela expressão, perguntou o que ela queria dizer. Afinal, do que se tratava?

Dadas as devidas explicações, Lauro, que criou inúmeros bordões no rádio gaúcho, como a alusão que fazia à “gangorra” da dupla Gre-Nal, passou também a usá-la em seus comentários esportivos.

Muitos gaúchos que utilizam a expressão e sabem, intuitivamente, o que ela significa talvez estejam tomando conhecimento só agora da história que está em sua origem.

Colaboração enviada por Luiz Carlos Mello.

(Do Almanaque Gaúcho de Zero Hora, junho de 2018)


Tem jangada no Guaíba


Aquela miniatura de jangada, cheia de detalhes, que ganhei ainda menino, de uma “tia” nordestina, casada com um amigo do meu pai, fez mais sentido quando, maiorzinho, visitei o Museu Júlio de Castilhos* e conheci, além de uma jangada de verdade, em tamanho natural, a história fantástica de uma viagem improvável. Aquela precária embarcação que eu via diante dos meus olhos tinha vindo desde muito longe, navegando pelo mar e trazendo a bordo alguns homens.


Fotos: Antonio Ronek, Revista do Globo

Esta semana, quase meio século depois, examinando uma antiga Revista do Globo, encontrei o registro documental dessa aventura, que nunca saíra da minha cabeça. Numa bela reportagem de Rubens Vidal com fotos de Antônio Ronek, publicada em março de 1952, estava o relato da chegada, depois de 127 dias e 4 mil quilômetros, da jangada N. S. de Assunção, trazendo de Fortaleza (CE) quatro pescadores e um jornalista. Vinicius Lima, repórter do jornal O Globo, que patrocinava a travessia, aproveitou o desembarque do pescador Tatá – que, enfermo, ficou no Rio, quando a expedição fez uma escala por lá – e juntou-se a Jerônimo, João Pereira, Manuel Preto e Manuel Frade na segunda etapa da jornada.

* Essa jangada ficou muito tempo no pátio do Museu Júlio de Castilhos e acabou apodrecendo, pois ninguém deu a ela o seu devido valor. Eu tinha sete anos quando eles, os jangadeiros, vieram do Ceará, parando no Rio de Janeiro, até Porto Alegre. Um irmão mais velho e um tio nadaram perto dela ao passar pela Praia de Belas. Na foto abaixo, as pessoas estão nessa praia.


Jangadeiros na antiga Praia de Belas

Veja os retratos dos viajantes

(Fotos de Stênio Azevedo, Revista do Globo)


O objetivo dos viajantes era chamar a atenção e protestar contra as más condições de vida dos pescadores nordestinos. Foram recebidos como heróis por uma multidão e, depois, pelo governador e pelo prefeito.

A jangada foi exposta à curiosidade popular no Paço Municipal e, posteriormente, recolhida ao museu – onde, após alguns anos, acabou por desfazer-se.




domingo, 28 de abril de 2019

Os efeitos do anúncio



Um jornal alemão de há anos estudava os efeitos que produzem no público os anúncios publicados na imprensa. Segundo ele, para ter algum êxito, um anúncio deve publicar-se, pelo menos, dez vezes seguidas, e sendo possível no mesmo lugar do jornal. Os efeitos seguem-se então desta forma:

Primeiro dia de publicação: o leitor nem sequer vê o anúncio.

Segundo dia: vê-o, mas não se detém a lê-lo.

Terceiro dia: dá-lhe a curiosidade e lê-o.

Quarto dia: o leitor repara no preço do artigo anunciado.

Quinto dia: repara nos sinais da casa onde se vende o artigo.

Sexto dia: fala do anúncio a sua mulher.

Sétimo dia: fala da intenção de adquirir o objeto anunciado.

Oitavo dia: adquire-o.

Nono dia: fala do anúncio aos amigos.

Décimo dia: torna a falar do assunto aos amigos, e estes, falam dele a suas mulheres. Então, a família de cada um dos amigos compra, por sua vez, o jornal, e se o anúncio continua a vir publicado, os efeitos são os da bola de neve; o êxito é completo.

E acrescenta o jornal alemão, não sem uma certa ironia: “Os comerciantes deviam ter presente estes fatos, que parecem ignorar”.
  
(Do Almanach Bertrand, 1925)



sábado, 27 de abril de 2019

Curiosidades históricas Sul-Rio-Grandenses



Coruja Neto
(Antônio Álvares Pereira)

Bento Manoel Ribeiro

É geralmente sabido que Bento Manoel Ribeiro, um dos chefes revolucionários de 1835, passou-se logo para os legais, voltando, pouco depois, às fileiras republicanas, para mais tarde, tornar a incorporar-se no exército monárquico. Como é natural, o seu primeiro bandeamento provocou indignação entre os republicanos que sentenciaram:


Pode um altivo humilhar-se,
pode um teimoso ceder,
pode um pobre enriquecer,
pode um pagão batizar,
pode um avaro prestar-se,
um lascivo confessar-se,
pode um mouro ser cristão,
um arrependido salvar-se.
Tudo pode ter perdão,
só o Bento Manoel - não!

Correio do Povo, 16/10/1910.

Honra farroupilha

De uma feita, durante a memorável jornada de 35, uma escolta republicana aprisionou diversos imperiais, em Dores de Camaquã. Iam ser fuzilados, quando os incumbidos do cortejo descobrem que um dos prisioneiros trazia uma guaiaca cheia de onças de ouro, sendo logo prevenido o chefe da escolta, Amaral Ferrador. Incontinenti, deu Amaral esta contra-ordem: “Soltem-nos; não quero que se diga que os republicanos os mataram para roubar.”

E assim eram todos os heróis que escreveram a gloriosa epopeia dos farrapos.

Correio do Povo, 16/10/1910

Abolicionista

Antônio José Gonçalves Chaves, rico charqueador de Pelotas, homem muito instruído e empreendedor, foi o primeiro abolicionista que houve no Rio Grande do Sul. E o Noticiador, que se publicou de 1832 a 1835, foi o primeiro jornal rio-grandense que se declarou abolicionista. Em 1844, por ocasião da Assembleia Constituinte da República Rio-Grandense, o major José Maria de Mattos propôs que fosse abolida a escravatura.

Correio do Povo, 5/10/1910

Primeira sociedade científica


Sob a presidência do Dr. Manoel José de Campos, barão do Guaíba, instalou, a 8 de setembro de 1850, nesta capital, a Associação Médico Farmacêutica, que foi a primeira sociedade científica criada no Estado. Seguiram-se-lhe: o Instituto Histórico e Geográfico Rio-Grandense, instalado a 7 de setembro de 1853, por iniciativa do Dr. Manoel Pereira Ubatuba; e a 16 de fevereiro de 1860 o Instituto Histórico da Província de São Pedro, do qual foi primeiro presidente o então barão de Porto Alegre.

Correio do Povo, 25/9/1910

A Catedral Missioneira



Ouça, paisano, são os sinos da catedral mais xucra do pago! A que foi erguida com pedras mouras, fé e esperança, cujas ruínas ainda estão lá, há mais de 300 anos ao relento. Escute, eles estão repicando, tonitruando pelos coxilhões verdejantes, pelo céu azul deste fim de tarde. Eles não param nunca. Nunca. A majestosa catedral missioneira foi devastada, saqueada, vilipendiada, mas se manteve em pé, impávida a nos dizer que devemos resistir, não nos achincalhar perante as potências estrangeiras. Perdemos muitas batalhas para o monstruoso exército de duas potências (mais os sanguinário aqui contratados), que dizimou nosso povo que vivia de forma livre, sem propriedade privada. Era isso que causava temor aos invasores. Levante e olhe, paisano, está vendo? Não é linda demais nossa querida e altaneira Catedral de São Miguel Arcanjo?

Veja, firme bem a vista, as grandes pedras quadradas retiradas do rio e trazidas de padiola ainda estão firmes, sustentando o tempo, a memória e a nossa identidade. Que coisa, paisano, saber que descendentes de imigrantes europeus se dizem hoje missioneiros, pela posse da terra que ganharam de mão beijada dos tiranos colonizadores, e os verdadeiros donos da terra morrendo à míngua, vendendo artesanato sentados no atual sítio arqueológico, mirando com olhos rasos dʼágua o sagrado altar de seus antepassados. Por quê? Por quê? É possível tamanha humilhação aos guaranis depois de tudo o que lhes foi imposto? Não bastaram as ponchadas de sangue derramadas daquelas gargantas afinadas que cantavam nos corais, as mãos decepadas dos tocadores de violinos e de flautas, dos moldadores do barro vermelho que se transformava em lindas esculturas? Aquelas mãos hábeis que moldavam a madeira bruta em magníficas imagens barrocas foram cortadas, arrancadas dos braços e a carne ficou exposta ao sol, apodrecendo e servindo de comida aos bichos carniceiros. As mesmas mãos e braços que amansavam bois e faziam gemer a terra, fabricavam pães, mãos que tiravam leite e faziam revigorar as sete cidades de sete ruas.

Eles, os imperialistas, tiveram medo, paisano! Não suportaram ver tanta fartura, riqueza, o gado se reproduzindo aos milhares pelos campos, a terneirada nascendo pelas macegas, o trigo e o linho florescendo nas Missões. Na Europa, corria o boato de que os índios missioneiros e os jesuítas iriam fundar uma nova nação, eles que seguiam fielmente as ordens de Espanha. Então, covardemente, esses lusos e espanhóis os mataram. Não foi nem combate, foi um massacre, um assassinato grandioso e coletivo.

Ah, paisano, ajude-me a mirar para esta velha redução. Esse passado imenso pesa nos ombros e sinto-me tão pequeno. Contemple e reze, trançando os dedos, uma prece para que nunca haja outro genocídio. Vamos pedir perdão aos bravos de Sepé* que tombaram em Caiboaté de lança firme na mão, sem pedir clemência. Benditos sejam todos os filhos de Tiaraju, o guarani de lunar na testa que foi mitificado depois de ter o corpo transpassado pela lança de Portugal e pelo tiro de Espanha. Esta catedral será sempre um símbolo contra a prepotência. A cruz de dois braços suplica para que sigamos defendendo esta terra e este legado até o fim de nossos dias...

(Na coluna Campereada, por Paulo Mendes,
Correio do Povo, abril de 2019)


Sepé tombou num dia sete de fevereiro de 1756, numa batalha às margens da sanga da Bica, um afluente do rio Vacacaí, no município gaúcho de São Gabriel. Com sua morte, perdidos da mais importante liderança, os Guarani acabaram derrotados, sendo mortos às centenas, junto com vários padres, tanto pelos luso-brasileiros como pelos espanhóis.


sexta-feira, 26 de abril de 2019

Origem das cores



Sorriso amarelo:

Na Antiguidade, pensava-se que a icterícia, uma doença que deixa as crianças amareladas, vinha da bílis, secreção produzida pelo fígado que era chamada “humor amargo”. No latim, amargo era amargus, que no diminutivo virava amarellus, que acabou virando amarelo.

Agente laranja:

Quando os árabes resolveram fazer uma “visitinha” à Europa, trouxeram na bagagem a fruta laranja − nárandja, em árabe. De lambuja, acabaram batizando a cor.

Carta branca:

Em geral, dizemos que algo bem liso e brilhante é “branquinho”. Os latinos também achavam isso e pegaram o germânico blank, que significa polido, para falar da cor. Aliás, o termo “armas brancas”, usado para facas e punhais, vem daí: branco de polido, reluzente.

No “apreto”:

O nome da cor preta vem do latim appectoráre, que queria dizer “comprimir contra o peito”. Como assim? É que, com o tempo, o appectorár virou apretar. E, por uma analogia muito criativa, deu no preto, querendo dizer algo denso, espesso, “apertado”.

Sangue azul:

Foi uma pedra preciosa chamada lápis-lazúli que batizou a cor azul. Lápis não conta, porque já queria dizer pedra em latim, mas o lazúli veio do árabe lázúrd, nome da rocha azulada. Em latim, o que era pedra continuou pedra, e a cor ficou simplesmente azul.

Marrom-glacê:

A castanha portuguesa, aquela do Natal, chama-se marron, em francês. E foi da cor desse fruto que veio o nosso marrom. Aliás, o marrom-glacê é isso: um doce escuro feito de castanha portuguesa.

Massa cinzenta:

O cinza nasceu daquela massa de pó misturado com brasas que sobra no fim das fogueiras. Por associação, a palavra latina cinisia, que queria dizer cinzas, transformou-se também no nome do tom preto-claro.

Vermelho-sangue:

Antigamente, como ninguém conhecia urucum nem pau-brasil na Europa, o único jeito de fazer tinta vermelha era usar um inseto − hoje chamado de cochonilha − que, esmagado, virava um vermelhão. O nome dessa cor vem do latim vermiculum, vermezinho.

Verdes anos:

Aqui chegamos a uma das poucas cores que já nasceu cor. O verbo latino vivere significava estar verde, verdejar. Dele é que nasceu a associação do verde com algo que está nascendo, que ainda não está pronto.

Consultoria − Mário Viaro, filólogo da Universidade de São Paulo - (USP).

O primeiro Gre-Nal da história de Porto Alegre



Estádio da Baixada, no Moinhos de Vento

MATCH DE FUTEBOL

No ground dos Moinhos de Vento o desafio entre os 1ºs teams do
Grêmio Foot-Ball Porto-Alegrense e do Sport Club Internacional
– Várias Notas –
O público porto-alegrense vai ter o ensejo de assistir hoje, à tarde, mais um importante match de foot-ball. Outrora raros eram os torneios dessa natureza que se efetuavam, pois o apreciado divertimento contava com pequeno número de adeptos. Hoje a mocidade que abraçou os vários gêneros de sport, entrega-se com entusiasmo a todos os exercícios ao ar livre, tais como sejam, os do remo, tiro, lawn-tennis, ciclismo, corridas a pé etc. Dentre esses gêneros de sport conta-se o foot-ball, o qual, apesar de possuir, entre nós, poucos anos de existência, progride de forma considerável. Os matches são muito apreciados e a eles comparece o nosso escol social. Assim é que, hoje, teremos o prazer de assistir a mais um desses importantes torneios, entre duas estimadas sociedades: o veterano Grêmio Foot-Ball Porto-Alegrense, que já tem seu nome feito no nosso meio esportivo; e o Sport Club Internacional, agremiação que apesar de ter pouco tempo de existência, promete ter um futuro brilhante. Às 3:10, precedidos de uma banda de música, os teams azul e encarnado farão sua entrada no ground sendo eles assim constituídos:

O signal de kick-off será dado às 3h10min em ponto pelo refferée Sr. Waldemar Bromberg, que será auxiliado pelos juízes de linhas João de Castro e Silva e H. Sommer e de goals, Theobaldo Foernges e Th. Bugs. Constará o match de dois half-times, sendo o primeiro das 3:10 às 3:50 da tarde e, o segundo, das 4 às 4:40 da tarde.

Team Azul

Callfelz;
Deppermann, Becker, G. Carls, Black;
Mostardeiro, Brochado;
Moreira, Booth, Schröder, Grünewald.

Team Encarnado

Poppe I;
Horácio, Cezar, Mendonça, Carvalho;
Vinhola, Pires;
Wetternich, Portela, Simoni, Poppe II.

COMPORTAMENTO

Somos obrigados, a fim de evitar fatos desagradáveis, a aconselhar aos espectadores a que não se pronunciem, por ocasião do jogo, em favor de um ou de outro team. Ainda no último domingo, durante o torneio, deu-se entre um dos juízes e um grupo de assistentes, lamentável incidente, tendo os espectadores imprudentes ouvido frases pouco gentis. Como se sabe, em todos os matches numerosa é a assistência nos grounds, notando-se entre ela, grande número de senhoras e senhoritas, às quais não se deve dar o desgosto de testemunhar discussões inconvenientes. Si fazemos esta pequena observação é porque desejamos ver o progresso do sport bretão, que está caindo no agrado da mocidade porto-alegrense.

Correio do Povo de 18 de julho de 1909

(Notícia repetida no Correio do povo de 18 de julho de 2009, 
com a grafia parcialmente atualizada)

Detalhe sem importância: O jogo terminou com vitória do Grêmio sobre o Internacional por 10 a nihil (10 x 0), conforme noticiou o Correio do Povo na época.



Delfina Cunha, primeira poetisa cega.



1791 – Nasce na estância do Pontal (São José do Norte) a poetisa Delfina Benigna Cunha. Conforme João Pinto da Silva escreveu nas duas edições de sua 'História Literária do Rio Grande do Sul' (1924 e 1930): 'Cronologicamente, o primeiro livro rio-grandense que se publicou foi, talvez, o da poetisa Delfina da Cunha, a cega, datado de 1834'. Segundo afirmou o pesquisador Guilhermino César, peremptoriamente: 'Essa pobre mulher é a primeira figura literária de alguma importância que surge nestas paragens'. E é seu, do mesmo modo, o primeiro livro de versos que se publicou em prelos rio-grandenses. Perdendo a visão aos 20 meses de idade, acometida de varíola, Delfina se defrontou com um mundo de escuridão completa. Todavia, sua intensa luz interior lhe escancarou as portas do universo por meio do lirismo romântico de suas rimas. A par do conteúdo psicológico sombrio que matiza uma inspiração dolorida, a obra de Delfina constitui-se num marco histórico de especial relevo nas letras rio-grandenses. Delfina faleceu no Rio de Janeiro, a 13 de abril de 1857, amparada pelos favores da magnanimidade imperial.

SONETO

Vinte vezes a lua prateada
Inteira o rosto seu mostrado havia,
Quando um terrível mal, que então sofria,
Me tornou para sempre desgraçada.

De ver o céu e o sol sendo privada,
Cresceu a par comigo a mágoa ímpia;
Desde a infância a mortal melancolia
Se viu em meu semblante debuxada.

Sensível coração deu-me a natura,
E a fortuna, cruel sempre comigo,
Me negou toda a sorte de ventura;

Nem sequer um prazer breve consigo:
Só para terminar minha amargura
Me aguarda o triste, sepulcral jazigo.

Extraído de “Sonetos Brasileiros Século XVII – XX”. 
Coletânea organizada por Laudelino Freire. Rio de Janeiro: F. Briguiet & Cia.- 1913


Os primeiros bondes de Porto Alegre


Em 4 de janeiro de 1873,
o primeiro bonde a burro trafegou pelas ruas da Capital.


Bonde puxado a burro na Avenida Venâncio Aires.

O primeiro bonde que houve no mundo não conduzia passageiros, e sim carvão. Um engenheiro inglês, chamado Outron, tendo observado quanto era penoso, para os cavalos em serviço nas minas de hulha, arrastar os vagonetes, quando carregados, ideou uma espécie de trilhos de madeira, sobre os quais aqueles veículos pudessem rodar com mais facilidade. O resultado foi assombroso: um cavalo, que antes, apenas podia arrastar uma tonelada de mineral, já conseguia transportar, sobre os trilhos de madeira, até três toneladas. O novo sistema triunfou em toda linha, e tornou-se famoso com a denominação de Outranway (Caminho de Outran), nome que, por abreviatura, se transformou em tranway. Como, porém, os trilhos de madeira se estragavam logo, e ficavam empenados, após as chuvas, tornou-se necessário substituí-los por outros, de ferro.

À vista do bom resultado obtido com essa inovação, logo se pensou em adaptar o mesmo sistema para o transporte de pessoas. O primeiro tranway, propriamente dito, foi estabelecido em New York, na Quarta Avenida, no ano de 1832. Era uma espécie de diligencia gigantesca, que deslizava sobre trilhos, e tinha duas boleias, uma em cada extremo, pois, como não se podia dar volta, ao chegar ao fim da linha, tornava-se preciso mudar os animais, como se fazia, ainda há bem pouco tempo, em Porto Alegre, com os nossos bondes tirados por bestas. Aqueles veículos eram tão pesados e tão grandes, que frequentemente, interrompiam o transito publico, causando danos a outros veículos. Por isso, levantaram-se gerais protestos contra os primitivos tranways, e não houve remédio senão suprimir aquela linha. Entretanto, todos reconheciam as grandes vantagens de bonde, e, assim, quando, em 1852, um engenheiro francês, chamado Loubat, inventou uma nova espécie de bondes, que tomaram o seu nome, a inovação foi recebida jubilosamente, nos Estados Unidos, que se apressaram em adaptá-los, estabelecendo, de novo, linhas de bondes em New York, em Nova Orleans e em outras cidades. Nada mais ridículo do que aqueles bondes de Nova Orleans, com imperial, para qual se subia por meio de grandes escadas, dignas de um sobrado, e com plataformas adiante e atrás, e onde tomava assento o cocheiro. Dois anos mais tarde, o mesmo engenheiro Loubat construiu, em Paris, a primeira linha de bondes (do Louvre a Saint Cloud) e em 1869 começaram a estabelecer-se as de Londres.

(Correio do Povo de 24.12.2008)


Bonde puxado a burro no Arraial do Menino Deus

Cafezinho em Bagé

(Uma antiga crônica política)

Lourenço Cazarré*


Depois de tirar foto com poncho e boina e ainda empolgado com aquele comovente discurso em que nos informou, pela primeira vez, que tem vergonha na cara, o presidente Lula foi tomar um cafezinho num bar da Sete de Setembro, a principal rua de Bagé. Lá, defrontou-se com um gauchão, já meio mamado, que puxou assunto:

- E aí, Presidente, dizem que em Brasília a situação tá mais quente que frigideira sem cabo!

- O Corinthians ganhou do...

- Mas o povo, aqui em Bagé, anda mais sobressaltado que cozinheiro de hospício.

- Fique calmo. Com o companheiro Meirelles no Banco Central, não tem crise.

- Presidente, eu sei que cusco não se mete em briga de cachorro grande, mas é verdade que o senhor cortou mesmo o mensalão?

- A minha assessoria já emitiu nota oficial sobre este assunto.

- O Roberto Jefferson disse que os deputados ficaram de boca aberta, como burro que comeu urtiga.

- Isso de mensalão não existe neste país.

- Bah, mas o Roberto Jefferson sabe das coisas! Ele é mais bem informado que gerente de funerária e barbeiro.

- Se alguém errou, tem que pagar.

- Presidente, me desculpe, eu sou mais grosso que papel de enrolar prego, mas o que o senhor fez não tem sentido. Os pobres deputados já estavam acostumados com a mesadinha. Ficaram mais atazanados que galinha agarrada pelo rabo.

- Eu estou tranquilo! Neste país ninguém é mais ético do que eu! Está ouvindo?

- Calma, presidente! O senhor me parece mais nervoso do que potro com mosca no ouvido.

- Me respeite! Eu tenho um diploma do Senai que vale mais do que muito doutorado.

- Concordo. Meu irmão, que se formou na faculdade, é mais chato que chinelo de gordo. Mas, voltando à vaca fria, me diga: por que o Zé Dirceu anda mais ansioso que anão em comício?

- O companheiro Zé Dirceu está recolhido, preparando sua defesa.

- O Dirceu vivia alegre, dando ordem pra todo mundo, mas agora anda mais nervoso que nem velha em canoa. Não fala mais com a imprensa. Está mais calado que guri que se borrou nas bombachas.

- Fique sabendo que, doa a quem doer, eu vou cortar na minha própria...

- E o Delúbio na CPI? Estava mais escorregadio que telefone de açougueiro. É um bicho matreiro. Se fez de leitão pra mamar deitado. Simpatizei com ele, mas aquele goiano é mais falso que idade de mulher.

- Enquanto não surgirem provas, o companheiro Delúbio é inocente.

- E aquele tal de Sílvio? Falava mais rápido que enterro de bexiguento. Não entendi nada do que ele disse... ou não disse.

- No momento oportuno, no fórum adequado, os companheiros apresentarão suas defesas.

- E o carequinha? O tal de Marcos Valério parecia mais assustado que barata atravessando galinheiro. Acho que ele estava com medo de sair de lá preso.

- O PT é o PT e o governo é o governo...

- Os jornais estão dizendo que, nos dias de pagamento, no Banco Rural, se juntavam por lá mais assessores do que corvos em carniça de vaca atolada.

- Isso é maldade dos tucanos. FHC tem inveja do meu maravilhoso governo.

- Pode ser. Fernando Henrique é mais manhoso do que gato que quer pegar passarinho. Ele disse que, no que se refere a tocar o governo, o senhor é mais vagaroso do que tropeiro de lesma.

- Vamos mudar de assunto. FHC me deixa irritado.

- Está bem. Dizem que o senhor ficou muito amigo do Severino. Que andam juntos pra todo lado, mais grudados que cocô em tamanco de leiteiro. É verdade?

- O companheiro Severino merece o maior respeito. É nordestino e pobre como eu.

- Estou sabendo, mas tome cuidado! O Severino é mais esperto que cavalo de contrabandista. Dizem que ele é mais ligado do que rádio de preso.

- Será que o companheiro gauchão poderia me deixar em paz?

− Mas, bah, é claro. Sei que o senhor anda sofrendo mais que joelho de freira em Semana Santa. Me desculpe, mas eu gosto de espichar assunto. Minhas conversas são mais compridas que trova de gago. Mas eu não resisti: o senhor é um homem mais conhecido do que parteira de campanha, e aí, eu...

- Me dê licença. Agora, vou pegar o Aerolula. Estou em cima da hora.

- Sei como é. Todo político é apressado que nem cavalo de carteiro.

- Fui!


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*Lourenço Cazarré é jornalista e escritor. Mora em Brasília.





O dinheiro e seus nomes


Para os soberanos Þ “lista civil”. 

Para os médicos Þ “honorários”. 

Para os empregados Þ “ordenados”. 

Para os militares Þ “soldo”. 

Para os prestamistas Þ “juro”. 

Para os funcionários Þ “salário”. 

Para os queixosos Þ “indenização”. 

Para os beneméritos Þ “legado”. 

Para as noivas Þ “dote”. 

Para os magistrados Þ “emolumentos”. 

Para os acionistas Þ “dividendo”. 

Para os intermediários Þ “comissão”. 

Para os segurados Þ “prêmio”. 

Para os autores Þ “direitos”. 

Para os pensionistas Þ “pensão”. 

Para os operários Þ “féria”. 

Para os herdeiros Þ “herança”. 

Para os flanelinhas Þ “gorjeta”. 

Para os comerciantes Þ “lucros”. 

Para os cobradores Þ “cobrança”. 

Para o Estado Þ “impostos”. 

Para as prostituas Þ “ajuda de custo”. 

Para os filhos Þ “mesada”. 

Para os políticos corruptos Þ “mensalão”. “rachadinha”. 

Para os garotos de sinaleiras Þ “uma moedinha”.