Malba Tahan
Há muito tempo, na cidade de Zahlé,
ocorreu uma rixa entre um jovem poeta, de nome Fauzi, e um oleiro, chamado
Nagib. Para evitar que o tumulto se agravasse, eles foram levados à presença do
juiz do lugarejo. O juiz, homem íntegro e bondoso, interrogou primeiramente o
oleiro, que parecia muito exaltado.
- Disseram-me
que você foi agredido? Isso é verdade?
- Sim, senhor juiz. -
confirmou o oleiro -
fui agredido em minha própria casa por este poeta. Eu estava, como de costume,
trabalhando em minha oficina, quando ouvi um ruído e a seguir um baque. Quando
fui à janela pude constatar que o poeta Fauzi havia atirado com violência uma
pedra, que partiu um dos vasos que estava a secar perto da porta. Exijo uma
indenização! - gritava o oleiro.
O juiz
voltou-se para o poeta e perguntou-lhe serenamente:
- Como
justifica o seu estranho proceder?
- Senhor juiz, o caso é
simples. -
disse o poeta. Há três dias eu passava pela frente da casa do oleiro Nagib,
quando percebi que ele declamava um dos meus poemas. Notei, com tristeza, que
os versos estavam errados. Meus poemas eram mutilados pelo oleiro. Aproximei-me
dele e ensinei-lhe a declamá-los da forma certa, o que ele fez sem grande
dificuldade. No dia seguinte, passei pelo mesmo lugar e ouvi novamente o oleiro
a repetir os mesmos versos de forma errada. Cheio de paciência tornei a
ensinar-lhe a maneira correta e pedi-lhe que não tornasse a deturpá-los. Hoje,
finalmente, eu regressava do trabalho quando, ao passar diante da casa do
oleiro, percebi que ele declamava minha poesia estropiando as rimas e mutilando
vergonhosamente os versos. Não me contive. Apanhei uma pedra e parti com ela um
de seus vasos. Como vê, meu comportamento nada mais é do que uma represália pela
conduta do oleiro.
Ao ouvir as
alegações do poeta, o juiz dirigiu-se ao oleiro e declarou:
- Que esse caso, Nagib,
sirva de lição para o futuro. Procure respeitar as obras alheias a fim de que
os outros artistas respeitem as suas. Se você equivocadamente julgava-se no
direito de quebrar o verso do poeta, achou-se também o poeta egoisticamente no direito
de quebrar o seu vaso.
E a sentença
foi a seguinte:
- Determino que o oleiro
Nagib fabrique um novo vaso de linhas perfeitas e cores harmoniosas, no qual o
poeta Fauzi escreverá um de seus lindos versos. Esse vaso será vendido em
leilão e a importância obtida pela venda deverá ser dividida em partes iguais
entre ambos.
A notícia sobre a forma inesperada como o
sábio juiz resolveu a disputa espalhou-se rapidamente. Foram vendidos muitos
vasos feitos por Nagib adornados com os versos do poeta. Em pouco tempo Nagib e
Fauzi prosperaram muito. Tornaram-se amigos e cada qual passou a respeitar e a
admirar o trabalho do outro. O oleiro mostrava-se arrebatado ao ouvir os versos
do poeta, enquanto o poeta encantava-se com os vasos admiráveis do oleiro.
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