O domingo é um moço que veste camisa Volta ao Mundo para ver sua namorada. Leva caramelos nos bolsos para dar de regalo. Domingos têm cheiro de velas no altar e gosto de costela assada no fogo de chão. É a risada do tio, do pai e do irmão. A mãe de avental atiçando as labaredas do fogão e arrumando a mesa. Nos domingos se ama e se chora. Vejo-me caminhando rumo ao açude, atirando outra vez meus anzóis de prata e pescando do fundo das águas a minha ilusão.
Ah, os domingos! Eu adorava ver a
gauchada chegar pilchada a capricho em nosso bolicho lá da minha hoje tão
longínqua Vila Rica. Eram dias radiantes em que eu pensava que eles nunca
sairiam da minha memória. Pensando nisso, gostaria de ter o dom de esculpir
painéis como aqueles artistas italianos que desenharam a história em
alto-relevo no Batistério da Catedral de Florença. Assim, eu eternizaria meus
domingos, a ferro, a bronze e a fogo e eles nunca morreriam. Mas ainda tenho a
minha palavra, a minha vontade de contar, para que nunca sejam esquecidos e,
assim, seguirem perpetuados e eternos.
Lembro do Mota, um capataz de
estância solteiro que muito pouco tinha de seu, um mulato de poucas posses, mas
era um espetáculo vê-lo aos domingos. Chegava cedo, montado em seu cavalo
gateado, trazendo os “luxos” que se permitia. Um apero que era um brinco, com
rédeas e a cabeçada do freio repletas de argolas e corredores de prata. O
serigote com cabeça de metal, pelegos vermelhos, uma bandana de cervo, um
conjunto admirável. O pelo do gateado, mantido na estrebaria, estava sempre
liso e rasqueado. E a pilcha? Nem conto. Bombacha preta de favos, camisa e
colete, botas de cano alto, adornadas por um par de esporas prateadas,
brilhantes, cujas rosetas pareciam estrelas faiscando no céu. Além do chapéu e
do lenço, exibia na cintura uma rastra enfeitada por patacões e uma adaga
Solingen nela atravessada. “Um homem, mesmo simples, precisa ter seus
caprichos”, sentenciava, enquanto sorvia um copo de vinho. Depois montava e ia rever
sua prenda na cidade.
Hoje, meus dias se parecem com
segundas-feiras. Chuvosas e cinzentas. Mas, teimoso que sou, costumo abrir as
venezianas e vislumbrar, clareando na distância, uma linda manhã de domingo...
Texto de Paulo Mendes, do livro “Campereadas”
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