Onofre Pires, meu possível tataravô,
brigou com Bento Gonçalves, seu primo, por causa da morte de Paulino da
Fontoura, vice-presidente da República, signatário de um manifesto polêmico
contra Bento. Resumo essa turbulenta história, por demais conhecida, em “História
Regional da Infâmia, o Destino dos Negros Farrapos e Outras Iniquidades
Brasileiras”: Indignado, Onofre Pires mandou rezar missa pela alma do
assassinado. Nos convites para o ato religioso, sem a menor vontade de negar a
realidade, tratou de provocar os inimigos internos: '”Faz amanhã sete dias que
deixou de existir neste vale de lágrimas o vice-presidente Antônio Paulo da
Fontoura, vítima do crime que o roubou à pátria, aos seus parentes, aos seus amigos
e aos seus concidadãos'”. Toda Alegrete sabia das desavenças dos farroupilhas e
do ódio votado por alguns ao ferino e loquaz Paulino da Fontoura.
Em carta de 26 de fevereiro de 1844,
Bento Gonçalves, que teria sido chamado novamente de ladrão por Onofre Pires,
tirou satisfações com seu primo: “Havendo chegado ao meu conhecimento que, em
princípios do corrente mês, em presença de vários indivíduos do Exército,
quando vinha em marca V. S ª.
avançara proposições ofensivas à minha honra, e ousara até chamar-me de ladrão
(...) sufocando, repito aquele com que em todos os tempos busquei o desagravo
da minha honra, recorri aos meios legais, únicos exequíveis nas presentes
circunstâncias; como, porém, a sua posição de deputado o põe a coberto desse meio,
e deva eu em tal caso lançar mão do que me resta como homem de honra, quisera
que, com a honra que dá esse caráter a um homem na posição de V. Sª, houvesse
de me dizer com urgência, por escrito, se é verdadeiro ou falso o que a
respeito me informaram. Deixo de fazer qualquer outra reflexão a respeito
porque V. Sª as deve perfeitamente compreender”. Era uma intimação.
Onofre Pires respondeu com pompa e
violência: “Ladrão da fortuna, ladrão da vida, ladrão da honra e ladrão da
liberdade, é o brado ingente que contra vós levanta a nação rio-grandense, ao
qual já sabeis que, junto à minha convicção, não pela geral execração de que
sois credor, o que lamento, mas sim pelos documentos justificativos que
conservo. Não deveis, pois, o Sr. general pôr em dúvida a conversa que a
respeito tive e da qual vos informou tão prontamente esse correio tão vosso...
Deixai de afligir-vos por haverdes esgotado os meios legais em desafronta dessa
honra, como dizeis; minha posição não tolhe que façais a escolha do mais
conveniente para o que sempre me encontrareis. Fica assim contestada a vossa
carta de ontem”. O duelo foi marcado.
Bento Gonçalves ganhou a parada. Em
carta a Domingos José de Almeida, de 9 de março de 1844, justificou-se alegando
que defendera a sua honra e que Onofre fora usado pelos seus inimigos, os
quais, quando o tiro saíra pela culatra, teriam escondido o rabo e deixado o
infeliz morrer abandonado. Segundo Bento, seus adversários haviam imaginado
opor um gigante a um pigmeu. Assim, apesar de lamentar a sorte do morto, garantia
“não ter o menor remorso” e declarava-se pronto a repetir o ato, alheio ao
tamanho ou à reputação de quem o insultasse. Foi isso.
Juremir Machado da
Silva
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