(Para as mulheres, o que
gostaríamos de ouvir)
Não vejo o amor sem a admiração.
Admirar é desejar ser igual estando junto.
Admirar-se. Admirar a gentileza do homem jurando por Deus.
Admirar sua lealdade com os amigos.
Admirar seu jeito esforçado de assumir as contas.
Admirar seu cuidado treinado com os idosos, cedendo assentos
e lugares nas frases.
Admirar os princípios herdados dos pais.
Admirar sua masculinidade em sobrecarregar no abraço.
Admirar seu riso infantil, sua ingenuidade no tropeço.
Admirar sua vivacidade em brincar.
Admirar, admirar-se.
Admirar a conversa que tem com o filho sobre quem cuida de
Deus.
Admirar seu temperamento sereno em noites de chuva.
Admirar sua inquietude para sair com o sol.
Admirar sua concentração numa música nova.
Admirar inclusive quando ele amarra os sapatos, debruçado
como a água nas escadas.
Admirar seu nervosismo nas provas, nos concursos, nos exames
do trabalho.
Admirar sua letra com ânsias de terminar.
Admirar sua falta de jeito em dançar, compensada pela
alegria de estar contigo.
Admirar seu modo de transar, sua fixação por poltronas.
Admirar quando ele interdita o dia para arrumar aparelhos
quebrados.
Admirar o perfeccionismo que o
impede de ser totalmente seu.
Admirar quando ele dorme no meio
do filme e finge que assistia.
Admirar suas mentiras
encabuladas.
Admirar, admirar-se.
Admirar sua disposição em ser
mais velho no medo e ser mais novo no aniversário.
Admirar suas meias sem par na
gaveta, suas fotos esquecidas de datas, seus recados de telefone faltando
números.
Admirar sua capacidade em desmemoriar compromissos.
Admirar ao circular o sabão nos seios como se fosse uma
vidraça.
Admirar seu talento em provocar
amizades no trem ou na rua, pouco preocupado em se preservar.
Admirar quando urra desaforos no estádio, logo ele tão
civilizado, tão cordato na família. Admirar quando chora e não se enxerga
lágrimas, um choro de soluços, recalcado.
Admirar sua vocação para pegar a joaninha da gola e a pôr
novamente na grama.
Admirar como disfarça que perdeu um botão abrindo as mangas
ou o zíper quebrado colocando a camisa para fora.
Admirar suas palavras de amor,
incompreensíveis, mas terrivelmente musicais, e dizer “não entendi”, para
escutar outra vez.
Admirar suas calças apertadas, justas como minhas pernas nas
dele na cama.
Admirar sua respiração pesarosa com o luto.
Admirar sua caça de baratas voadoras pela sala e perceber
que ele tem mais pavor do que eu. Admirar quando gosta de um livro e me conta
tudo como se eu nunca fosse ler.
Admirar quando fica bêbado e se
enrola no cobertor do meu casaco, desculpando-se por aquilo que ainda não fez.
Admirar seus roubos nos tabuleiros de criança.
Admirar sua dificuldade em se livrar dos pijamas gastos.
Admirar sua barba por fazer em minhas coxas. Admirar quando
me busca antes de pedir.
Pode-se admirar um homem sem amá-lo. Mas não amar um homem sem admirá-lo.
Fabrício Carpinejar
no livro “Canalha!” - Crônicas
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