sexta-feira, 27 de outubro de 2017

O Frade-de-Pedra



Gravura de Hélio Ricardo Alves

O último frade-de-pedra que sobrou das muitas dezenas colocadas nas esquinas das ruas estreitas e beiras de calçada em Porto Alegre foi encontrado por Nilo Ruschel, perto de casas modestas e à beira de um pequeno banhado refletindo o marco de grés, sem referências e com explicações contraditórias. Ari Veiga Sanhudo escreveu um conto em que um frade-de-pedra conversava com o seu par do outro lado da rua. O remanescente do Nilo Ruschel estava só, e se pudesse contar alguma coisa diria que na sua nobreza jamais permitiu que nele fosse amarrado qualquer animal de montaria ou tração; até advertia que estava protegido por lei, e quem o danificasse sofreria pena de multa severa.

O frade-de-pedra era um marco feito de arenito, com aproximadamente 1,30 m de altura, esculpido em oito faces, com uns 40 cm de diâmetro, e com uma cúpula em cima, que vista de longe, parecia um chapéu de padre. Servia para proteger as calçadas das manobras feitas por carroças e carretas nas ruas estreitas. Muitos historiadores antigos confundiam o frade-de-pedra com o palanque que, no interior, era chamado de “frade-de-cerne”* (este sim, para amarrar rédeas).

Não havia como enganar-se, porque o Código de Posturas Policiais punia com rigor quem atravancasse estradas de ruas. Ora, nas esquinas da Rua dos Andradas havia, desde a Rua General Câmara até a Rua Dr. Flores, quatro frade-de-pedra, um em cada ângulo. Como poderiam os cavaleiros amarrar cavalos ou charretes numa esquina movimentada e estreita?

O solo de Porto Alegre é de consistência granítica, e o arenito (grés) vinha dos rios Caí e Sinos, quando havia estradas, em forma de blocos para serem esculpidos por um artesão credenciado pela administração municipal, que respeitava o padrão estabelecido. Para amarrar cavalos bastaria fazer um palanque cilíndrico de madeira ou granito e sem escultura.

O frade-de-pedra surgiu quando se promulgou uma lei (no início do século XIX) obrigando os proprietários de casas a calçar o passeio fronteiro as suas propriedades, e desapareceu, coincidentemente, quando a iluminação pública prosperou; o frade-de-pedra foi pouco a pouco desaparecendo e dando lugar aos postes de luz, nas esquinas.

O último frade-de-pedra pode se visto no jardim fronteiro ao Museu Joaquim José Felizardo, na Rua João Alfredo, onde foi no passado o Solar Lopo Gonçalves.

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*Informação prestada pelo Dr. Firmino Chagas Costa, de Júlio de Castilhos.

(Do livro “Porto Alegre foi assim...”,
desenhos a nanquim de Hélio Ricardo Alves)

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Museu Joaquim José Felizardo e o frade-de-pedra


Frade-de-pedra decorativo defronte à Escola de Engenharia




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