O homem que sabia tudo

Victor Godói

Era uma vez um homem que sabia tudo. Ele já tinha lido todos os livros, de todos os assuntos. Não havia algo que ele não soubesse. Passou em primeiro lugar no vestibular, pois tinha lido todos os livros e apostilas, e sabia todas as questões. Na faculdade, formou-se com honra ao mérito, por ter conseguido nota máximas em todas as provas. Ele realmente sabia tudo.

Sempre se dava bem quando saía com os amigos, pois tinha aprendido nos livros como conquistar as mulheres. Na hora do sexo, ele sabia exatamente o que fazer para que sua parceira tivesse prazer. Ele sabia como terminar um namoro, ou como se recuperar de um fora. Nenhuma emoção o surpreendia, ele sabia como elas eram, quanto tempo duravam e quando passavam. Estava tudo nos livros.

Um dia, o homem que tudo sabia se casou. E o casamento dele foi como deveria ser, e ele se sentiu como descrito nos romances. Em sua casa não havia brigas, pois ele conhecia os segredos dos relacionamentos, e como consertar todo tipo de coisa. No trabalho, era exemplar. Tinha lido todos os livros da área, não havia especialista melhor que ele.

Quando seu filho nasceu, ele sabia o que ia sentir, de forma que não se surpreendeu quando desmaiou ao assistir o parto. Teve o número de filhos recomendado pelos entendidos do assunto, e educou as crianças com perfeição, seguindo os manuais. À medida que as crianças foram crescendo, soube conversar com eles e explicar de onde vinham os bebês e o porquê de estarem crescendo pelos em lugares engraçados.

Um dia, sua mulher morreu, e ele já tinha aprendido nos livros como lidar com aquele sentimento. Enquanto seu corpo envelhecia, ele consumia a dosagem correta de vitaminas, carboidratos e cálcio. Com o tempo, sua memória foi ficando mais fraca, e, embora tivesse lido todos os livros, ele já esquecia como lidar com as coisas, brincar com os netos e alimentar os gatos. 

No momento da sua morte, ele sabia que ia morrer, mas não conseguiu se lembrar o que viria a seguir, e teve medo. Medo da morte. Esse foi seu último sentimento, e o único com que ele não conseguiu lidar em toda sua vida.