sexta-feira, 26 de abril de 2019

Cafezinho em Bagé

(Uma antiga crônica política)

Lourenço Cazarré*


Depois de tirar foto com poncho e boina e ainda empolgado com aquele comovente discurso em que nos informou, pela primeira vez, que tem vergonha na cara, o presidente Lula foi tomar um cafezinho num bar da Sete de Setembro, a principal rua de Bagé. Lá, defrontou-se com um gauchão, já meio mamado, que puxou assunto:

- E aí, Presidente, dizem que em Brasília a situação tá mais quente que frigideira sem cabo!

- O Corinthians ganhou do...

- Mas o povo, aqui em Bagé, anda mais sobressaltado que cozinheiro de hospício.

- Fique calmo. Com o companheiro Meirelles no Banco Central, não tem crise.

- Presidente, eu sei que cusco não se mete em briga de cachorro grande, mas é verdade que o senhor cortou mesmo o mensalão?

- A minha assessoria já emitiu nota oficial sobre este assunto.

- O Roberto Jefferson disse que os deputados ficaram de boca aberta, como burro que comeu urtiga.

- Isso de mensalão não existe neste país.

- Bah, mas o Roberto Jefferson sabe das coisas! Ele é mais bem informado que gerente de funerária e barbeiro.

- Se alguém errou, tem que pagar.

- Presidente, me desculpe, eu sou mais grosso que papel de enrolar prego, mas o que o senhor fez não tem sentido. Os pobres deputados já estavam acostumados com a mesadinha. Ficaram mais atazanados que galinha agarrada pelo rabo.

- Eu estou tranquilo! Neste país ninguém é mais ético do que eu! Está ouvindo?

- Calma, presidente! O senhor me parece mais nervoso do que potro com mosca no ouvido.

- Me respeite! Eu tenho um diploma do Senai que vale mais do que muito doutorado.

- Concordo. Meu irmão, que se formou na faculdade, é mais chato que chinelo de gordo. Mas, voltando à vaca fria, me diga: por que o Zé Dirceu anda mais ansioso que anão em comício?

- O companheiro Zé Dirceu está recolhido, preparando sua defesa.

- O Dirceu vivia alegre, dando ordem pra todo mundo, mas agora anda mais nervoso que nem velha em canoa. Não fala mais com a imprensa. Está mais calado que guri que se borrou nas bombachas.

- Fique sabendo que, doa a quem doer, eu vou cortar na minha própria...

- E o Delúbio na CPI? Estava mais escorregadio que telefone de açougueiro. É um bicho matreiro. Se fez de leitão pra mamar deitado. Simpatizei com ele, mas aquele goiano é mais falso que idade de mulher.

- Enquanto não surgirem provas, o companheiro Delúbio é inocente.

- E aquele tal de Sílvio? Falava mais rápido que enterro de bexiguento. Não entendi nada do que ele disse... ou não disse.

- No momento oportuno, no fórum adequado, os companheiros apresentarão suas defesas.

- E o carequinha? O tal de Marcos Valério parecia mais assustado que barata atravessando galinheiro. Acho que ele estava com medo de sair de lá preso.

- O PT é o PT e o governo é o governo...

- Os jornais estão dizendo que, nos dias de pagamento, no Banco Rural, se juntavam por lá mais assessores do que corvos em carniça de vaca atolada.

- Isso é maldade dos tucanos. FHC tem inveja do meu maravilhoso governo.

- Pode ser. Fernando Henrique é mais manhoso do que gato que quer pegar passarinho. Ele disse que, no que se refere a tocar o governo, o senhor é mais vagaroso do que tropeiro de lesma.

- Vamos mudar de assunto. FHC me deixa irritado.

- Está bem. Dizem que o senhor ficou muito amigo do Severino. Que andam juntos pra todo lado, mais grudados que cocô em tamanco de leiteiro. É verdade?

- O companheiro Severino merece o maior respeito. É nordestino e pobre como eu.

- Estou sabendo, mas tome cuidado! O Severino é mais esperto que cavalo de contrabandista. Dizem que ele é mais ligado do que rádio de preso.

- Será que o companheiro gauchão poderia me deixar em paz?

− Mas, bah, é claro. Sei que o senhor anda sofrendo mais que joelho de freira em Semana Santa. Me desculpe, mas eu gosto de espichar assunto. Minhas conversas são mais compridas que trova de gago. Mas eu não resisti: o senhor é um homem mais conhecido do que parteira de campanha, e aí, eu...

- Me dê licença. Agora, vou pegar o Aerolula. Estou em cima da hora.

- Sei como é. Todo político é apressado que nem cavalo de carteiro.

- Fui!


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*Lourenço Cazarré é jornalista e escritor. Mora em Brasília.





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