Moacyr Scliar
Machado de Assis em foto de Marc Ferrez
Machado de Assis, cujo centenário foi
lembrado no dia 29 de setembro de 2008, não teve vida fácil. Mulato, pobre,
(gago), descendente de escravos, órfão de mãe, ainda teve de enfrentar uma
doença que para ele foi uma carga muito pesada. Machado sofria de epilepsia. A
doença provavelmente teve início na infância; o escritor aludiu a “umas coisas
esquisitas” que sentira quando menino, mas não esclareceu do que se tratava.
Aliás, ele relutava muito em admitir seu problema ainda que suas crises
convulsivas tivessem sido testemunhadas por muitas pessoas.
Machado não falava da enfermidade nem
mesmo para amigos íntimos e só revelou à esposa, Carolina de Novais, depois do
casamento. O embaraço aparece até mesmo em sua literatura. Na primeira edição
de Memórias Póstumas de Brás Cubas,
ele diz, ao falar do sofrimento de uma personagem cujo amante morre: “Não digo
que se carpisse; não digo que se deixasse rolar pelo chão, epiléptica...”. Nas
edições posteriores a frase foi substituída por: “Não digo que se carpisse; não
digo que se deixasse rolar pelo chão, convulsiva...”. Por causa das convulsões,
não raro mordia a língua, coisa que dificultava a fala o que ele atribuía as
“aftas”. (*)
Parece que Machado de Assis consultou
o famoso doutor Miguel Couto e que tomou brometo, um fraco tranquilizante então
usado, que não funcionou, causando inclusive efeitos indesejáveis. Mas Miguel
Couto afirmava que a epilepsia se construiu em um desafio para o escritor, um
desafio que ele venceu com sua magnífica obra.
(O
texto teve suprimido alguns parágrafos que julgamos irrelevantes)
(*) Parece que a causa da morte
do escritor foi um câncer na língua, constantemente agredida pelas mordidas,
quando de suas convulsões.
O coche fúnebre, saído da sede da
Academia, no Silogeu Brasileiro, após o discurso em que Rui Barbosa se despediu do
morto em nome de seus confrades, caminhou lentamente até o Cemitério de São João
Batista, acompanhado a pé pela multidão silenciosa.
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