terça-feira, 6 de outubro de 2020

Algumas músicas brasileiras sobre prostituição

                                             Boneca de Pano

                                                 Assis Valente

 (1935) 

Boneca de pano,

Gingando num cabaré.

Poderia ser bonequinha de louça,

Tão moça, mas não é.

Poderia ser bonequinha de louça,

Tão moça, mas não é.

Um dia alguém a chamou de boneca,

E ela, sendo mulher, acreditou.

O tempo foi passando

E ela se desmanchando

E hoje,

Quem olha pra ela não diz quem é.

Em vez de boneca de louça,

Hoje é boneca de pano,

De um sombrio cabaré.

 Dama do cabaré

   Noel Rosa

   (1936)

 

Foi num cabaré na Lapa
Que eu conheci você.
Fumando cigarro,
Entornando champanhe no seu soirée.

Dançamos um samba,
Trocamos um tango por uma palestra,
Só saímos de lá m
eia hora depois de descer a orquestra.

Em frente à porta um bom carro nos esperava,

Mas você se despediu e foi pra casa a pé.

No outro dia, lá nos Arcos eu andava,
À procura da Dama do Cabaré.

Eu não sei bem se chorei no momento em que lia,
A carta que eu recebi, não me lembro de quem.
Você nela me dizia que quem é da boemia,
Usa e abusa da diplomacia,
Mas não gosta de ninguém.

 Quem há de dizer

 Alcides Gonçalves e Lupicínio Rodrigues

 (1948)

 

Quem há de dizer,

Que quem você está vendo,

Naquela mesa bebendo

É o meu querido amor.

Repare bem que toda vez

Que ela fala,

Ilumina mais a sala

Do que a luz do refletor.

O cabaré se inflama

Quando ela dança,

E com a mesma esperança

Todos lhe põe o olhar.

E eu, o dono,

Aqui no meu abandono,

Espero morto de sono

O cabaré terminar.

Rapaz! Leva esta mulher contigo,

Disse uma vez um amigo,

Quando nos viu conversar.

Vocês se amam,

E o amor deve ser sagrado,

O resto deixa de lado,

Vai construir o teu lar.

Palavra! Quase aceitei o conselho,

O mundo, este grande espelho,

Que me fez pensar assim.

Ela nasceu com o destino da Lua,

Pra todos que andam na rua,

Não vai viver só pra mim...

 Dolores Sierra

 Wilson Batista e Jorge de Castro

 (1956)

 

Dolores Sierra
Vive em Barcelona,
Na beira do cais.
Não tem castanholas
E faz companhia
A quem lhe der mais.

 Nasceu em Salamanca,

Seu pai lavrador,

Veio a maioridade.
Como quem nasce na roça
Tem sempre a ilusão
De viver na cidade.

Sua mãe chorou

No dia em que ela partiu,
Pra conhecer Dom Pedrito,
Que prometeu e não cumpriu.
Com frio e com sede,
Só na sarjeta,
Sorriu para um homem,
E ganhou a primeira peseta.

O navio apitou, paguei a despesa,

E a história se encerra.
Adeus. Barcelona, adeus,
Adeus. Dolores Sierra.

Eu vou tirar você desse lugar

 Odair José

 (1972)

 

Olha, a primeira vez que eu estive aqui,

Foi só pra me distrair,

Eu vim em busca do amor.

Olha, foi então que eu lhe conheci,

Naquela noite fria, em seus braços,

Meus problemas esqueci.

Olha, a segunda vez que eu estive aqui,

Já não foi pra distrair,

Eu senti saudades de você.

Olha, eu precisei do seu carinho,

Pois eu me sentia tão sozinho,

E já não podia mais lhe esquecer.

Eu vou tirar você desse lugar.

Eu vou levar você pra ficar comigo.

E não me interessa o que os outros vão pensar. (bis)

Eu sei que você tem medo de não dar certo,

Pensa que o passado vai estar sempre perto,

E que um dia eu posso me arrepender.

Eu quero que você não pense em nada triste,

Pois quando o amor existe,

Não existe tempo pra sofrer.

Cabaré

 Aldir Blanc e João Bosco

 (1973)

 

Na porta, lentas luzes de néon.
Na mesa, flores murchas de crepom.
E a luz grená filtrada entre conversas,
Inventa um novo amor, loucas promessas.

De tomara-que-caia,

Surge a crooner do Norte,
Nem aplausos, sem vaia,
Um silêncio de morte.

Ah, quem sabe de si nesses bares escuros,
Quem sabe dos outros, das grades, dos muros.

No drama sufocado em cada rosto,

A lama de não ser o que se quis.
A chama quase morta de um sol posto,
A dama de um passado mais feliz.

De tomara-que-caia,

Surge a crooner do Norte,
Nem aplausos, sem vaia,
Um silêncio de morte.

Ah, quem sabe de si nesses bares escuros,
Quem sabe dos outros, das grades, dos muros.

Um cuba-libre treme na mão fria,

Ao triste strip-tease da agonia,
De cada um que deixa o cabaré,
Lá fora, a luz do dia fere os olhos...

                                                     Folhetim

 Chico Buarque

 (1978)

 

Se acaso me quiseres,
Sou dessas mulheres
Que só dizem sim.
Por uma coisa à toa,
Uma noitada boa,
Um cinema, um botequim...

E, se tiveres renda,
Aceito uma prenda,
Qualquer coisa assim.
Como uma pedra falsa,
Um sonho de valsa,
Ou um corte de cetim.

E eu te farei as vontades,

Direi meias verdades,
Sempre à meia luz.
E te farei, vaidoso, supor,
Que és o maior e que me possuis.

Mas na manhã seguinte,

Não conta até vinte,
Te afasta de mim,
Pois já não vales nada,
És página virada,
Descartada do meu folhetim.

P.S. As gravações dessas músicas estão na internet:

1. “Boneca de pano”, com os Demônios da Garoa;

2. “Dama do cabaré”, com Orlando Silva;

3. “Quem há de dizer”, com Francisco Alves;

4. “Dolores Sierra”, com Roberto Vidal;

5. “Eu vou tirar você desse lugar”, com Odair José;

6. “Cabaré”, com João Bosco;

7. “Folhetim”, com Gal Costa.


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