quinta-feira, 24 de setembro de 2020

A implosão da mentira*

 

Mentiram- me.
Mentiram- me ontem
e hoje mentem novamente.
Mentem de corpo e alma completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.

Mentem, sobretudo impunemente.
Não mentem tristes,
alegremente mentem.
Mentem tão nacionalmente
que acho que mentindo história afora,·

vão enganar a morte eternamente.

Mentem, mentem e calam,
mas as frases falam e desfilam de tal modo nuas
que mesmo o cego pode ver a verdade
em trapos pelas ruas.

Sei que a verdade é difícil e para alguns
é cara e escura,
mas não se chega à verdade pela mentira
nem à democracia pela ditadura.

Evidentemente crer que uma flor nasceu
em Hiroshima e em Auschwitz havia um circo
permanentemente.

Mentem, mentem caricaturalmente,
mentem como a careca mente ao pente,
mentem como a dentadura mente ao dente
mentem como a carroça à besta em frente,
mentem como a doença ao doente,
mentem como o espelho transparente
mentem deslavadamente como nenhuma
lavadeira mente ao ver a nódoa sobre o rio
mentem com a cara limpa e na mão
o sangue quente,

mentem ardentemente como doente nos
seus instantes de febre,
mentem fabulosamente
como o caçador que quer passar gato por lebre
e nessa pilha de mentiras a caça é que caça o caçador
e assim cada qual mente indubitavelmente.
Mentem partidariamente,
mentem incrivelmente,
mentem tropicalmente,
mentem hereditariamente,
mentem, mentem e de tanto mentir
tão bravamente
constroem um país de mentiras diariamente.

           Alfonso Romano de Sant´Anna

 * Aqui está uma parte do poema. 


Nenhum comentário:

Postar um comentário