domingo, 29 de novembro de 2015

O poeta profético



Carlos Drummond de Andrade. Poeta, Contista e Cronista brasileiro.
Itabira MG, 1902. Rio de Janeiro, 1987. Profeta também.

I

O Rio? É Doce.
A Vale? Amarga.
Ai, antes fosse
Mais leve a carga.

II

Entre estatais
E multinacionais,
Quantos ais!

III

A dívida interna.
A dívida externa
A dívida eterna.

IV

Quantas toneladas exportamos
De ferro?
Quantas lágrimas disfarçamos
Sem berro?

Publicado em 1984 no jornal Cometa Itabirano, o poema não chegou a ganhar versão subsequente em livro – o que levou alguns portadores de antologias de poemas do autor a, em um primeiro momento, duvidar da autenticidade da citação, mas os versos são mesmo de Drummond.

Escrito em um período em que a dívida externa era um fantasma no horizonte de qualquer tentativa de crescimento no Brasil, Lira Itabirana, com versos curtos e diretos que buscam inspiração nas quadras da poesia popular, faz a comparação entre a atividade mineradora incessante e lucrativa e a dívida "eterna" do país, pouco aplacada mesmo com as toneladas de ferro exportado.

Apesar do aparente tom antecipatório, ele apenas reitera alguns elementos com que o poeta mineiro trabalhou ao longo de toda sua carreira: crítica social e política aliada à evocação nostálgica de uma Minas Gerais que já não existia. Lira Itabirana é apenas um dos exemplos de poemas nos quais Drummond refletia, entre melancólico e alarmado, com os efeitos da mineração em seu Estado natal. Qualquer deles, agora, poderia ser relembrado com o mesmo caráter assombroso.

Em O Maior Trem do Mundo – mais tarde compilado em Poesia Errante, Drummond repete o mote do trem que leva embora não apenas a riqueza mineral extraída da terra, mas a própria terra e seu coração. O poema foi escrito em uma época em que a economia de Itabira já começava a dar mostras de colapso, sem que a cidade tivesse se beneficiado da riqueza gerada pelo empreendimento. O poema de Drummond aborda, com melancolia, a possibilidade de esgotamento dos veios minerados na cidade e seu abandono previsível quando não houver mais o que tirar do coração da terra:

O maior trem do mundo
Leva minha terra
Para a Alemanha
Leva minha terra
Para o Canadá
Leva minha terra
Para o Japão
O maior trem do mundo
Puxado por cinco locomotivas a óleo diesel
Engatadas geminadas desembestadas
Leva meu tempo, minha infância, minha vida
Triturada em 163 vagões de minério e destruição
O maior trem do mundo
Transporta a coisa mínima do mundo
Meu coração itabirano
Lá vai o trem maior do mundo
Vai serpenteando, vai sumindo
E um dia, eu sei não voltará
Pois nem terra nem coração existem mais.

De acordo com a pesquisadora Letícia Malard, autora do livro No Vasto Mundo de Drummond (Editora UFMG, 2005), a "corrosão" é uma metáfora forte e recorrente na poesia de Drummond: "uma corrosão no sentido literal, socioeconômico – a serra sendo corroída pela retirada do minério – e uma corrosão metafórica – a alma corroída do itabirano, uma vez que procura a 'sua' serra, a qual lhe parecia eterna, e não mais a encontra."

Logo, a preocupação de Drummond com os efeitos da mineração em sua região nada tinha de profética. E se agora ela surpreende, é porque, infelizmente, ninguém estava prestando atenção.

*Zero Hora


Quem quer ser bilionário?


(Do livro “O X da questão”, de Eike Batista*)


Sonha mas agir

“Um sonho é um sonho até que se acorde. Um homem pode acalentar esse sonho ou arregaçar as mangas e pensar no que é preciso para torná-lo realidade.”

Visão

“A visão 360 graus é a bússola. E observar o entorno jurídico, político financeiro, ambiental, social, humano, logístico e operacional. É antever problemas e pensar em tudo.”

Autoconfiança

“Se você duvida de você mesmo, não vai encantar sua equipe nem o mercado. Isso não é necessariamente vaidade. É, antes de tudo, confiança.”

Oportunidade na dificuldade

“A primeira reação de alguém quando depara com uma região de fronteira onde não há água nem luz é correr dali para nunca mais voltar. Minha reação é inversa. Quanto maior o problema, maior o estímulo.”

A cara do dono

“Uma empresa precisa ter dono para não se ver espremida entre forças antagônicas.”

Ajuda e sorte

“Sorte é um elemento do projeto. Mas ela nunca estará presente se o projeto não estiver bem concebido e com todas as variáveis muito bem cobertas.”

Inspiração

“Enxergue seus projetos com inspiração e não visando ao lucro. Nenhum grande artista mirava o lucro ou tinha em mente quanto dinheiro poderia ganhar com suas pinceladas ou seus versos.” 


*Que foi milionário e hoje responde a vários processo na justiça...

sábado, 28 de novembro de 2015

O valor de um “muito obrigado”



“Ficamos-lhe obrigadas por tanta gentileza! Assinado: Clube das Viúvas”.

Esses foram os dizeres do cartão recebido por um amigo, em agradecimento ao ramalhete que enviou ao Clube das Viúvas de sua cidade. “Obrigadas?”, questionou ele. Sim, por que não? Se estivesse escrito “agradecidas”, ele não se espantaria.

Elas também poderiam ter dito: “Muito obrigadas pelas flores!”.

O adjetivo “obrigado” flexionado em feminino plural feriu seus ouvidos. O que nos fere os ouvidos não é apenas o que está errado, mas também aquilo que não estamos acostumados a ouvir. A expressão de cortesia “obrigado” varia conforme o sexo do sujeito da oração, pois é um adjetivo. Concorda com a(s) pessoa(s) que agradece(m). Um homem diz “muito obrigado”; a mulher, “muito obrigada”. O agradecimento no plural é usado de forma muito rara, mas é correto responder à pergunta “Como vão seus familiares?” com “Vamos bem, obrigados!”. Assim também foi correta a manifestação de agradecimento das mulheres com um “muito obrigadas!”.

Vamos avançar um pouco além, ou seja, aprofundar na etimologia e no sentido filosófico da expressão “obrigado”. Há quem pergunte “por que obrigado?, tenho obrigação de quê?”. Pegando uma carona no texto de Luiz Jean Lauand, professor da USP, para a revista Língua Portuguesa da editora Segmento, encontramos uma explicação de São Tomás de Aquino, em sua obra Suma Teológica. Tomás ensina, em seu Tratado da Gratidão, que a gratidão se compõe em diversos graus. O primeiro consiste em reconhecer o benefício recebido, obter uma graça, aceitar um favor. O segundo consiste em louvar e em dar graças àquele que nos deu algo gratuito, em troca de nada. O terceiro grau é a retribuição, de acordo com suas possibilidades, segundo as circunstâncias mais oportunas de tempo e lugar.

É assim que cada língua expressa a gratidão em diferentes graus. O inglês “to thank” e o alemão “zu danken” tomam a gratidão com frieza, na primeira dimensão, ou seja, apenas o reconhecimento da graça. Já a forma latina “graças” presente no italiano e no espanhol vai mais além, pode ser considerada uma segunda dimensão, o nível de louvar e dar graças.

Especial é mesmo a formulação portuguesa, tão encantadora e singular, pois é a única a situar-se, claramente, no terceiro grau, o nível mais profundo da gratidão: “o do vínculo (ob-ligatus), o do dever de retribuir”, afirma Lauand.

Concluímos, portanto, que o agradecimento está, intimamente, ligado a quem pensa, pondera, reconhece o benfeitor. E, ao aceitar uma dívida impagável, o homem agradecido sente-se embaraçado, porque sabe que, por mais que faça, tudo será insuficiente. Assim, é preciso humildade para aceitar um favor imerecido, pois fica o dever de retribuir, acompanhado à consciência de que será impossível cumprir totalmente. Porém, quem não quiser se comprometer com a retribuição, que use os inócuos “Valeu!”, “Falou!”, “Beleza!”.

Miguel Dias Filho - Professor



terça-feira, 24 de novembro de 2015

O homem da alma rasgada



(Gaúcho por Danúbio Gonçalves)

Costumava apear da rosilha anca de vaca sempre à tardinha, ali pelo lusco-fusco, àquela hora em que o silêncio parece de igreja e se ergue sobre o campo depois da algazarra da bicharada. Até o vento emudece, não se percebe nenhuma brisa. Então arrastava suas chinelas de borracha feitas à faca, com tiras de couro, rumo do balcão. Eu olhava a bombacha puída e a camisa preta surrada, com um rasgo no ombro sobre a costura. Tinha outra camisa também rasgada, de uma cor que lembrava o marrom, mas agora nem cor mais tinha. Era pobre, vivia de changas nas granjas e de pequenos serviços nas casas da Vila Rica. Também fazia e vendia gamelas. Pequenas, médias e umas muito grandes. Por isso, o chamavam de Julinho Gamela, o homem da camisa rasgada.

A quantidade de compras dependia dos pilas que arrumava no dia. “Vivo com minhas pobrezas”, dizia, exibindo um sorriso largo, típico daqueles que não têm contas a pagar. Viúvo, os filhos haviam se mandado há muito tempo e agora morava solito num ranchinho beira de estrada, perto da passagem dos trilhos em São João do Barro Preto. Era alegre e satisfeito. Apesar disso, quem o conhecia bem sabia que era um homem ferido pela vida, marcado a ferro e fogo pelo destino. Havia sido um injustiçado no decorrer dos anos, desde que começara a trabalhar em lavouras de arroz nas várzeas de Cachoeira. Ainda rapazote, fazendo taipa numa noite de luar, a pá tocou num objeto estranho. Achou que era pedra e com uma alavanca tirou da terra um grande pote de barro. Honesto, entregou ao patrão. Este ficou ainda mais rico, pois dentro havia muitas moedas de ouro, prata e outros objetos antigos e preciosos. A recompensa foi apenas um cavalo bragado e um chapéu preto.

Depois, na costa do Uruguai, quando chegou ao posto de capataz de estância, após sofrer muito no lombo do cavalo dia e noite, a propriedade foi vendida. O novo dono mandou-o embora e, mais uma vez, Júlio Gamela saiu pela estrada carregando nos tentos apenas sua esperança e assobiando uma milonga triste. Veio parar ali nas charqueadas de Tupã, onde aprendeu vários ofícios de salga. Quando o conheci já era velho, tinha as mãos cheias de cicatrizes e muitas quebraduras nos braços. Meu pai o chamava para castrar terneiros, pois tinha “mão boa” e nenhum animal bichava. Na cabeça, mantinha o velho chapéu preto do tempo de Cachoeira. “Só pra lembrar que podia ser hoje um homem rico”, brincava.

 Muitos anos depois, passei no lugar onde ficava seu ranchinho. Não havia mais nada, só um casebre em ruínas, abandonado. Por isso escrevo em favor dos humildes, dos desamparados, dos que andam pelo mundo montados numa rosilha magra e com um chapéu preto furado na cabeça. Essa gente invisível, sem presente nem futuro, gente que veste bombacha puída e, invariavelmente, carrega dentro de si a alma estropiada.

(Da coluna Campereada de Paulo Mendes no Correio do Povo)

Glossário

Rosilha: diz-se do cavalo que tem pelagem misturada com pelos brancos, pretos e vermelhos.

Anca de vaca: diz-se do cavalo que tem os quartos parecidos com os de uma vaca.

Changas: pequenos serviços avulsos; biscates.

Gamela: vasilha de madeira.

Pila: nome que o gaúcho dá à unidade monetária, seja qual tenha sido (réis, cruzeiros, cruzados, reais etc.).

Solito: o mesmo que sozinho.

Ranchinho: casebre feito de pau-a-pique, quase sempre coberto de santa-fé. O rancho é a morada do posteiro (homem que habita temporariamente, num posto afastado da sede da fazenda. Nome que se dá àquele que toma conta do gado, como vigia).

Taipa: parede (geralmente de pedra e terra) que se ergue para represar a água e fazer um pequeno açude.

Bragado: diz-se do cavalo que tem malhas ou manchas brancas atravessadas na barriga.

Milonga: espécie de música platina dolente, em ritmo binário, cantada ao som do violão.

Charqueda: estabelecimento onde se charqueia a carne, mesmo que saladeiro.

Salga: local, na charqueada, onde se salga a carne.

Campereada: ato de camperear. Cavalgada pelo campo para ver o gado, separar algumas cabeças para venda, abate ou transferência para outra invernada (designação de certas pastagens rodeadas de obstáculos naturais ou fechadas com cerca de arame, onde se guardam eqüinos, muares e bovinos).

(Do Dicionário Gaúcho, de Alberto Juvenal de Oliveira – Editora AGE)



Nunca mais



Nunca mais vi ninguém fumando cachimbo. Nem o pai do Pimentinha nem o Saci-Pererê. Aliás, quase não vejo mais ninguém fumando qualquer coisa.
Nunca mais vi ninguém pegando jacaré. Nem caçando tatuí. Nem soltando pipa em forma de gaivota na praia.
Nunca mais vi ninguém acompanhando corrida de submarino no Arpoador.
Nunca mais passei um fax. Nem mandei telegrama. Nem recebi carta. Ultimamente, não tem ninguém nem deixando recado na minha secretária eletrônica.
Nunca mais vi ninguém comprando um cartão-postal.
Nunca mais vi ninguém comendo presuntada. Nem coquetel de camarão. Nem sanduíche de queijo com banana.
Nunca mais vi uma tolha de Linholene, aquela que parecia de linho.
Nunca mais vi ninguém revelando um filme. Nem criando uma comunidade no Orkut.
Nunca mais ouvi ninguém falar do Second Life.
Nunca mais vi o Cine Pirajá. Nem o Cine Jurema.
Nunca mais vi o Super Bruni 70.
Nunca mais vi ninguém brincando de polícia e ladrão. Nem de pera, uva ou maçã.
Nunca mais vi ninguém jogando bola de gude.
Nunca mais tomei Mirinda. Nem uísque sour. Nem vinho Liebfraumilch, que vinha numa garrafa azul.
Nunca mais vi um Simca Chambord. Nem um DKW Vemag.
Nunca mais vi um Renault Dauphine.
Nunca mais vi ninguém comprando um disco. Nem ouvindo walkman. Nem escutando fita cassete.
Nunca mais vi o Tabuleiro da Baiana. Nem o Palácio Monroe. Nem o prédio do Cassino Atlântico.
Nunca mais pus BomBril na antena para melhorar a imagem.
Nunca mais vi antena. Nem seletor de canais. Nem botão de horizontal e vertical.
Nunca mais vi ninguém brincando de telefone sem fio. Nem de “a palavra é...”. E nem de tesoura.
Nunca mais vi “O fino da bossa”. Nem o “Corte Rayol Show”.
Nunca mais ouvi alguém dizer “pena que a TV não seja a cores”. Ou que “depois do sol, quem ilumina seu lar é a Galeria Silvestre”. Ou que “ninguém vende mais barato que O Mundo das Louças”. Ou que “o Príncipe veste hoje o homem de amanhã”.
Nunca mais vi um show do João Gilberto.
Nunca mais vi uma cédula de votação.
Nunca mais vi ninguém usando perfume Lancaster. Nem pomada Minâncora.
Nunca mais ouvi a música ciclâmen.
Nunca mais vi ninguém consultando uma enciclopédia. Nem o Aurélio. Nem o Houaiss.
Nunca mais vi um Electra II da Varig. Nem táxi com duas portas e sem o banco do carona. Nunca mais vi um cinema drive-in.
Nunca mais vi uma miss com maiô Catalina.
Nunca mais vi um filme de Tarzan.
Nunca mais vi ninguém com calça rancheira. Nem com sandália japonesa. Nem com blusa BanLon.
Nunca mais vi o meu autógrafo do Alberto Sordi. Nem o da Maysa.
Nunca mais vi ninguém pedindo autógrafo.
Nunca mais vi uma máquina de escrever. Nem uma cama Dragoflex.
Nunca mais vi ninguém usando lenços Paramount. Aliás, quase ninguém mais usa lenço.
Nunca mais vi ninguém dançando o sa-sa-ruê. Nem ouvindo o jequibau. Nem ensaiando o let kiss.
Nunca mais vi o anúncio da hora certa durante o intervalo comercial. Nem a previsão do tempo. Nem a temperatura.
Nunca mais vi um cinejornal.
Nunca mais vi uma ficha de telefone. Nem um catálogo telefônico.
Nunca mais ouvi sinal de discar.
Nunca mais vi ninguém usando creme dental Kolynos.
Nunca mais vi uma caneta-tinteiro. Nem um estojo de lápis.
Nunca mais vi um compasso. Ou uma régua T.
Nunca mais vi um esquadro.
Nunca mais vi alguém dando aula de caligrafia. Nem de trabalhos manuais. Nem de Educação Moral e Cívica. Nunca mais vi um caderno com o “Hino Nacional” estampado na contracapa.
Nunca mais vi um filme de arte. Nem uma comédia sofisticada.
Nunca mais vi uma chanchada.
Nunca mais vi ninguém usando uma lanterna.
Nunca mais vi ninguém jogando pif-paf. Nem escopa.
Nunca mais vi ninguém jogando crapô.
Nunca mais vi um faquir.
Nunca mais vi um show no Golden Room.
Nunca mais fui ao Teatro Alaska.
Nunca mais fui ao Tivoli Park.
Nunca mais vi um ximbolê. Nem alguém brincando de “ordem... seu lugar... sem rir... sem falar...”. Nunca mais vi ninguém pulando amarelinha.
Nunca mais vi minha carteirinha de sócio do Clube dos Amigos de Lassie. Nem minha bengala do Bat Masterson. Nem minha calça Calhambeque.
Nunca mais vi um cachorro pequinês.
Nunca mais ouvi ninguém dizendo que vai botar pra quebrar. Ou que entrou pelo cano. Ou que tô contigo e não abro.
Nunca mais vi ninguém dançando de rostinho colado.
Nunca mais voei pela Varig. Nem pela Cruzeiro. Nem pela Panair. Nem pela Vasp.
Nunca mais vi uma sirigaita. Nunca mais levei um safanão.
Nunca mais vi ninguém molhando o pão no café.
Nunca mais vou ver o Rio Doce.

Texto de Artur Xexéo – O Globo de 22.11.2015


Artur Xexéo é carioca nascido em 1951 no bairro da Urca e criado em Copacabana. Jornalista, torce pelo Fluminense e pela escola de samba Vila Isabel. Trabalhou no "Jornal do Brasil", e nas revistas "Veja" e "IstoÉ". Escreve no jornal "O Globo" há quase uma década, além de colaborar com outros veículos de comunicação.


terça-feira, 17 de novembro de 2015

Dúvidas de Português



Guardanapo?

Por que se guarda o napo?

“A minha dúvida é sobre a palavra guardanapo.

O que é napo?

Por que se guarda o napo?”

(Marcos Faria Cordeiro)

A consulta de Marcos é boa por mais de uma razão. Em primeiro lugar, sobretudo quando expressa em termos tão singelos, é divertida, mas não fica nisso. Existem aspectos realmente enigmáticos em torno da palavra guardanapo, registrada pela primeira vez em português (com a grafia “gardanapo”) no distante ano de 1536.

Tudo indica – até por falta de alternativas razoáveis – que fomos buscar a palavra no termo francês garde-nappe. Este nunca quis dizer guardanapo: a palavra francesa para essa pequeno pedaço de pano ou papel é, desde o século 14, serviette. No entanto, tal assimetria semântica não seria em si um problema. Garde-nappe é, literalmente, um protetor de toalha de mesa (nappe), uma placa, especialmente de vime, que se põe sob o prato para poupar o tecido do calor ou da sujeira. Algo parecido em forma e função com o que, em conjunto, chamamos de jogo americano, embora este costume ser usado no lugar da toalha e não sobre ela.

De toda forma, garde-nappe e guardanapo compartilham pelo menos o campo semântico da mesa de jantar, e basta imaginar o uso de pedaços de pano sob os pratos para que soe plausível a alteração de sentido da palavra em sua migração de uma língua a outra. O verdadeiro problema com a tese que situa garde-nappe na origem de guardanapo é que a palavra composta francesa só teria sido registrada, segundo o Houaiss, no século 18, cerca de duzentos anos depois da nossa. E agora?

E agora, mistério. A tese de uma formação ocorrida no próprio português esbarra no fato de que não temos, em nossa língua, nada que se pareça com “napo”. O francês foi buscar seu nappe (toalha) no latim mappa (guardanapo, justamente) – que entre nós, depois de uma tabelinha com o italiano, já chegou com o sentido adquirido na Idade Média de representação gráfica de um terreno (rabiscado no guardanapo!) e veio a dar no vocábulo… mapa, pois é.

Por que dizemos ‘obrigado’ quando agradecemos?

“Por que a língua portuguesa obriga a gente a usar a palavra ‘obrigado’ na hora de agradecer alguma coisa? Não é esquisito,quando paramos para pensar nisso? Acho até grosseiro,pois dá a entender que a pessoa só fica grata porque é forçada. Onde está a obrigação? E outra dúvida:uma mulher pode dizer ‘obrigado’ ou deve sempre dizer ‘obrigada’?”

(Viviane Assis)

O sentido de obrigado como fórmula de agradecimento é literal. O que faz com que Viviane o estranhe – no que tem a companhia de muita gente – é o fato de que a palavra, inicialmente um adjetivo,vem ganhando nesse caso uma autonomia de interjeição. Perde-se na memória coletiva a construção que a levou a ser empregada em tal papel.

O particípio do verbo obrigar (do latim obligare, “ligar por todos os lados, ligar moralmente”) expressa o reconhecimento de uma dívida entre quem recebe um favor ou gentileza e quem o faz – ambos,dessa forma, ligados, atados, presos por um laço moral.

A frase completa seria “fico-lhe obrigado”, ou seja, “passo, a partir deste momento, a ser seu devedor”. Na linguagem jurídica, obrigado é também um substantivo que significa “sujeito passivo de uma obrigação”,isto é, de uma dívida ou outro compromisso contratual.

Sobre a segunda dúvida de Viviane, farei aqui um resumo do que respondi em 2010 a um leitor impressionado com o número de mulheres que dizem “obrigado”. Do ponto de vista da tradição, trata-se simplesmente de um erro, um sinal de desleixo com o idioma. Se obrigado é um adjetivo, exige que se apliquem a ele as flexões cabíveis de número e gênero: obrigada, obrigados, obrigadas.

Ocorre que o papel de adjetivo, como eu disse acima, vem se perdendo na palavra quando a empregamos com o sentido de “grato”. Hoje o termo costuma ser usado como interjeição, o que torna natural que seja compreendido como invariável. Aquilo que de certo ponto de vista é um erro indiscutível também pode ser encarado como uma mutação linguística em curso.

(Publicado na Veja-Sérgio Rodrigues)

Sobre Palavras --ossa língua escrita e falada numa abordagem irreverente

Mais dúvidas

Por isso ou porisso

A forma de escrita correta desta locução é por isso. A palavra porisso está errada. Nunca deverá ser escrita uma só palavra, mas sim duas palavras separadas. A locução por isso significa por esse motivo e indica, principalmente, uma consequência daquilo que foi dito ou feito. É sinônima de: por esse motivo, assim sendo, à vista disso, em vista disso, em consequência, dessa forma, dessa maneira, desse modo, dessarte, entre outras.

A palavra por é uma preposição e a palavra isso é um pronome demonstrativo. Por isso pode ser uma locução coordenativa conclusiva, exprimindo uma conclusão, uma consequência ou uma locução adverbial com significado de consequentemente. Juntamente com a palavra que pode também ser uma locução subordinativa causal, exprimindo uma causa: por isso que.

Exemplos:

Tenho que tomar conta de minha irmã mais nova, por isso não poderei ir à praia hoje.

Vou trabalhar na Espanha, por isso vou aprender espanhol.

Sei que a situação é difícil, por isso peço compreensão.

Fique sabendo mais!

A locução por isso é ainda utilizada comumente com a substituição do pronome demonstrativo isso por outros pronomes demonstrativos equivalentes, como os pronomes demonstrativos isto e aquilo.

Exemplos:

Foi por isto? (mostrando algo perto do falante "eu")
Foi por iso? (mostrando algo perto de com quem se fala "tu")
Foi por aquilo? (mostrando algo longe do falante e de com quem se fala)

Palavra Relacionada: isso.

Do Blog Dúvidas de Português

Entre mim e ele

Frequentemente, pessoas têm dúvida com relação ao emprego dos pronomes pessoais em construções em que aparece a preposição entre.

É preciso, de início, lembrarmo-nos de que, em princípio, os pronomes pessoais retos só podem ser sujeitos de oração e não, complementos. Assim, em frases como “Isso fica entre mim e ele”, não caberia eu no lugar de “mim”, pois esse pronome figuraria no predicativo “entre eu e ele”. Em outras palavras, um pronome reto (eu) estaria exercendo a função de complemento.

Nesta altura, você pode justamente questionar: “Ué, mas ele também não é pronome pessoal reto? 

Como pode figurar como complemento e eu não pode?”. É verdade, mas isso depende do uso que os falantes cultos fazem e eles querem assim.

Dessa forma, os pronomes pessoais eu e tu quando aparecem regidos pela preposição "entre" devem figurar na forma oblíqua – como em "Não há dificuldade entre mim e ti" – e não, na reta, como em "Não há dificuldade entre . Os demais pronomes são empregados na forma reta, apesar de figurarem como complementos: "Isto fica entre mim e ele" e "Está tudo bem entre nós e eles". Por questão de eufonia, é preferível o mim ser utilizado em primeiro lugar.

O mesmo vale quando temos pronomes de tratamento: "Esse assunto fica entre mim e o senhor", “Diga que aquilo se passou entre mim e você” e “Isso fica entre nós e Vossa Excelência”.

Professor Paulo Hernadez

Para eu ou para mim?

Para eu ou para mim? O uso do pronome “eu” ocorre quando o mesmo é o sujeito da oração, já o pronome “mim” é usado como complemento, ou seja, é o objeto da oração.

Usamos o pronome do caso reto (eu, tu, ele (a), nós, vós, eles (as)) quando nos referimos ao sujeito da oração. Já os pronomes oblíquos tônicos (mim, ti, ele (a), nós, vós, eles (as)) fazem papel de objeto e surgem após uma preposição: para mim, de mim, por mim, e assim por diante.

Veja um exemplo:

a) Ela trouxe o presente para eu desembrulhar.

b) Ela trouxe o presente para mim.

Observe que na primeira oração temos duas orações: Ela trouxe o presente/para/ eu desembrulhar. “Eu” aqui é sujeito do verbo “desembrulhar”.

Já na segunda oração, “mim” é complemento e, portanto, objeto indireto (uma vez que vem depois da preposição).

Na dúvida sempre faça uma pergunta ao verbo: se a resposta tiver um sujeito, então é pronome do caso reto, caso contrário, será objeto. Observe:

a) Ela trouxe o presente: quem trouxe? Ela.

b) Para eu desembrulhar: quem desembrulhar? Eu.

A lógica é simples: geralmente, quando há dois verbos, também haverá dois sujeitos.

Outros exemplos:

a) Se for para eu ficar, então ficarei! (ficar → sujeito eu; ficarei → sujeito eu)
b) Ele disse para eu ficar. (disse → sujeito ele; ficar → sujeito eu)
c) Ele não disse nada para mim. (disse → sujeito ele; objeto indireto → para mim)
d) Para mim, ele está fazendo de conta que não sabe de nada. (fazendo → sujeito ele; sabe → sujeito ele; para mim → objeto indireto)

Atenção: Verifique se há preposição + pronome + verbo porque, nesse caso, o pronome em questão será do caso reto. Se houver preposição + pronome, sem o verbo, então, já sabe, caso oblíquo!

(Do Blog Mundo Educação)

Entre eu e você ou entre mim e você?

É comum surgirem equívocos no uso dos pronomes pessoais, principalmente os do caso oblíquo. Contudo, uma dica importante fará com que não haja mais dúvidas a respeito desse assunto:

De acordo com a norma culta, após as preposições emprega-se a forma oblíqua dos pronomes pessoais. Veja:

1. Isso fica entre eu e ela. (Errado)

1. Isso fica entre mim e ela. (Certo)

ou

2. Isso fica entre mim e ti. (Certo)

Os pronomes do caso oblíquo exercem função de complemento, enquanto os pronomes pessoais do caso reto, de sujeito. Observe:

1. Ela olhou para mim com olhos amorosos (olhou para quem? Complemento: mim.).

2. Por favor, traga minha roupa para eu passar (quem irá praticar a ação de passar? Sujeito: eu.).

Vejamos a pergunta que dá título ao texto: Entre eu e você ou entre mim e você? Depois da explicação acima, constatamos que existe uma preposição: entre. Então, o correto é “Entre mim e você”, pois, após a preposição, usa-se pronome pessoal do caso oblíquo.

Da mesma forma será com as demais preposições: para mim e você, para mim e ti, sobre mim e ele, entre mim e ela, contra mim, por mim, etc. Veja:

a) Ele trouxe bolo para mim e para ti.

b) Ninguém está contra mim.

c) Você pode fazer isso por mim?

d) Sobre mim e você há uma nuvem de muitas bênçãos.

Agora, observe:

Preciso dos ingredientes para mim fazer o bolo. (Errado)

Existe a preposição “para”, no entanto, o pronome “mim” está exercendo o papel de sujeito da segunda oração: para mim fazer o bolo. Logo, o emprego do pronome oblíquo está equivocado.

O certo seria:

Preciso dos ingredientes para eu fazer o bolo. (Certo)


Por Sabrina Vilarinho - Graduada em Letras



segunda-feira, 16 de novembro de 2015

As melhores frases brasileiras


01. Existo, logo desisto.
02. Nada é mais fácil para uma mulher do que se passar por difícil.
03. O homem é o pecado capital da mulher.
04. Quem renega seus vícios nos incomoda com suas virtudes.
05. Há cabeças que mesmo cortadas ainda emitem alguns pensamentos.
06. Em um século a mulher saiu do porão, encostou-se ao parapeito da janela e se instalou na  vitrine.
07. Quase todo mundo fala de si mesmo como se fosse o melhor dos seres humanos.
08. Espera-se dos outros o impossível; de si mesmo apenas o possível.
09. Quem sai aos seus não precisa de exame de DNA.
10. No fim, sua vida era um livro aberto de páginas em branco. Rezou sempre na mesma cartilha.
11. Não se distraia com as instruções de segurança. Concentre suas atenções na própria comissária.
12. Sem dúvida era um político equilibrado. Só saía de cima do muro quando tinhas cacos de vidro.
13. Era tão analfabeto que, para fazer um O, tinha que sentar nu na areia.
14. A prova de que a bebida não causa amnésia é que os bêbados sempre se lembram de pedir mais uma.
15. Se trabalho enriquecesse, formigas não viveriam no buraco.
16. Tão alienado que, quando caía em si, tirava o corpo fora.
17. Nem todas as palavras são levadas pelo vento. As mais pesadas permanecem no chão.
18. Quem lida com estivador tem que jogar pesado.
19. A contradição do humorista ateu é a presença de espírito.
20. Monótona a vida do perneta: sempre no mesmo pé.
21. Mãe, só tem uma. Mas o que tem de filho-da-mãe...
22. A prova de que o sofrimento sempre ensina é que os professores ganham uma miséria.
23. As bactérias se alastram porque vão fungo nas doenças.
24. Saúde no Brasil: Há pus no fim do túnel.
25. Era um intelectual tão colonizado que nos restaurantes da moda só pedia caldo de cultura.
26. Ia trabalhar de jeans apertado e provocante. Foi demitida por justa calça.
27. Pobre quando estica no fim de semana é porque morreu mesmo.
28. Atrás de todo político de sucesso tem sempre uma empreiteira que o financia.
29. Loteria corre sempre. E muito, porque poucos conseguem ganhar.
30. Algo muito repetido passa a ser uma verdade. Quantas vezes isso já foi repetido.
31. Era uma casa tão pequena que um quarto parecia um oitavo.
32. Com a devastação atual, as únicas folhinhas a cair no outono serão as do calendário.
33. Muitos perdem o bonde da história por pegá-lo andando.
34. Dizer preju já é uma tentativa para diminuir o prejuízo.
35. No fast food a pressa é inimiga da refeição.
36. Brasil é o país onde todos dizem “com certeza” e ninguém tem certeza de nada.
37. Fale-me em ênclise e dar-te-ei esta mesóclise.
38. Terra à vista, é claro – mas com 500 anos para pagar.
39. Encontrou o teatro de portas fechadas: pregaram-lhe uma peça.
40. Toda grande queda na bolsa sempre levanta suspeita.
41. Não importa a marca – papel higiênico é tudo a mesma merda.
42. Primeiro estágio do amor: atração. Último estágio do amor: traição.
43. Muita gente que construiu castelos nas nuvens hoje mora embaixo da ponte.
44. Uma consulta ao oculista está custando os olhos da cara.
45. Serviço funerário é uma atividade que nunca vai morrer.
46. Nos crematórios, toda quarta-feira é de cinzas.
47. Para o mau entendedor, meia palavra é bosta.
48. Quando a esmola é demais, o santo de verdade devolve.
49. A panela de pressão explodiu porque caiu em depressão.
50. Pequeno crime não compensa.
51. Lavar dinheiro é uma grande sujeira.
52. Imortal é aquele que não tem onde cair morto.
53. Se duvidar, as grandes empreiteiras superfaturam até mesmo as pontes de safena.
54. Quem mete os pés pelas mãos é o contorcionista de circo.
55. Era considerado gente fina porque sempre fazia vista grossa.
56. Alguns homens se deixam comprar; outros, por sua vez, se vendem por muito pouco.
57. Era um luxo de lixa – mas acabou virando um lixo.
58. Se Maomé não vai à montanha é porque achou uma moita mais perto.
59. As pessoas que gostariam de ser imortais são as mesmas que não sabem o que fazer no sábado à noite.
60. Bom tempo aquele em que bala perdida era apenas não conseguir pegar doce no dia São Cosme e São Damião.
61. Afinal, deputado no Brasil é parlamentar ou pra lamentar?
62. Pobre só lança pedra fundamental de alguma coisa quando começa o quebra-quebra.
63. Do jeito que vai o arrocho, os trabalhadores vão torcer para que tudo acabe em pizza. Pra ver se comem alguma coisa.
64. Olho da rua: o ponto de vista do patrão.
65. Na telefônica o clima é de medo. O chefe é cheio de pulso.
66. Palavra de ordem dos coveiros: o luto continua.
67. E o futuro do Brasil? Aí já outros 500 anos.
68. Tuberculoso declara o imposto de renda como pessoa tísica.
69. Do modo que a coisa anda, até nuvem passageira vai pagar taxa de embarque.
70. Em bar de racista, a conta vem discriminando o chope claro do escuro.
71. Do comerciante roubando no peso da comida: filo porque quilo.
72. Azar é nascer virado pra lua, em noite de eclipse.
73. Nem toda que reluz é loura.
74. Era tão rica que combinava o sapato com a cotação da bolsa.
75. Insegurança: vão-se os anéis, os dedos e a vida.
76. A fome é tanta, que à noite todos os gatos são ao molho pardo.
77. A filha da ostra era uma pérola.
78. Os últimos serão os primeiros a darem uma desculpa pelo atraso.
79. Esperança: o governo já abriu concorrência pra instalar a luz no fim do túnel.
80. Deus é brasileiro, mas pediu asilo no céu.
81. Uma mariposa só não faz bordel.
82. De nada adianta bancos inteligentes e gerentes burros.
83. Correu a vida inteira atrás de dinheiro; na realidade morreu em último lugar.
84. Amiga: o problema do seu namorado é psicológico. Ele não Freud, nem sai de cima.
85. Minha Terra em palmeiras onde canta o sabiá, as aves que aqui gorjeia já foram em contrabando pra lá.
86. Diariamente o monge trapista cavava sua sepultura. Aos 98 anos achou petróleo.
87. Quem tem boca vai a Roma. Quem tem pé-de-pato vai a Veneza.
88. Hoje tem comida, mas cuidado com os espinhos. – É peixe, mãe? – Não, é cactos.
89. O mau é o bom que não deu certo.
90. A única coisa que eu não tolero é a intolerância.
91. A notícia da sua morte causou grande surpresa. Ninguém lembrava que ainda estava vivo.
92. Por que não desorganizam o crime organizado?
93. Natal dos homens corresponde à sexta-feira da paixão dos perus.
94. O sindicato do crime recomenda: nunca trabalhem sem carteira assassinada.
95. Aquele médico só cuidava de clientes mortos. Era legista.
96. O Ibama prendeu o faquir. Usava pele de ouriço como fronha de travesseiro.
97. Nunca peça a graça no dia do Santo. Ele está muito ocupado.
98. Para os homens a cobra é um símbolo fálico. Para as cobras o falo é um símbolo ofídico.
99. O cupim teve uma forte indigestão. Roeu 20 páginas de um livro do Paulo Coelho.
00. Era um jogador sem sorte. Em toda sua vida só acertou uma vez. Na roleta russa.


Bossa Nova para principiantes



Texto de Edson Aran

Se você acha que amar é tolice, bobagem e ilusão, é bossa nova.

Se amar foi sua ruína, é samba-canção.

Se a ingrata deu pro Assum Preto, pro Pintassilgo e pro Ditão, é música sertaneja.

Se você acordou de manhã se sentindo miserável, não é bossa nova, é blues.

Se a última fileira do teatro consegue te escutar, não é bossa nova.

Se a primeira também não escuta, é show do Philip Glass.

Se você vai à praia de tardinha para ver o barquinho, é bossa nova.

Se você só viu barcão, solzão, canção ou outra coisa terminada em “ão”, é samba-enredo.

Menos improvisação. Aí é jazz.

Música com maçã, Iansã e febre terçã, é coisa do Djavan.

Mas, se tiver pau, pedra e um resto de toco, é o fim do caminho.

Se você fica deprimido quando pensa no amor, é bossa nova.

Se você pensa no amor e fica deprimido, é impotência.

Se você é cantora e mostra o joelho, é bossa nova. Se mostra a bunda, é axé music.

Se mostra que só sabe gemer com voz fina e estridente, é a Sandy. Ou o Junior. Uma das duas.

Se as mulheres jogam calcinhas no palco quando você canta, definitivamente não é bossa nova.

Se você é homem e tira a calcinha no palco, é Tropicalismo.

Se você é mulher e entra no palco sem calcinha, é a Lady Gaga.

Se ela passa num doce balanço a caminho do mar, é bossa nova.

Se a sua alegria atravessou o mar, é outra coisa.



Ranking das mentiras mais contadas



01) BÊBADO: - Sei perfeitamente o que estou fazendo.

02) AMBULANTE: - Qualquer coisa, volta aqui que a gente troca.

03) ANFITRIÃO: - Já vai agora? Ainda é cedo!

04) ANIVERSARIANTE: - Presente? Sua presença é mais importante...

05) ADVOGADO: - Esse processo é rápido.

06) CASAL SEM FILHOS: - Visite-nos sempre; adoramos suas crianças.

07) CORRETOR DE IMÓVEIS: - Em seis meses colocarão água, luz e telefone.

08) DELEGADO: - Tomaremos as devidas providências.

09) DENTISTA: - Não vai doer nada.

10) DESILUDIDA: - Não quero mais saber de homem.

11) DEVEDOR: - Amanhã, sem falta!

12) ENCANADOR: - É muita pressão que vem da rua...

13) FILHA DE 17 ANOS: - Dormi na casa de uma colega...

14) FILHO DE 18 ANOS: - Antes das 11 estarei de volta.

15) GERENTE DE BANCO: - Trabalhamos com as taxas mais baixas do mercado.

16) INIMIGO DO MORTO: - Era um bom sujeito. Foi tão cedo...

17) JOGADOR DE FUTEBOL: - Vamos continuar trabalhando forte.

18) LADRÃO: - Isso aqui foi um homem que me deu.

19) MECÂNICO: - É o carburador ou a rebimboca da parafuseta..

20) MUAMBEIRO:-- Tem garantia de fábrica.

21) NAMORADA: - Pra dizer a verdade, nem beijar eu sei...

22) NAMORADO: - Você foi a única mulher que eu realmente amei...

23) NOIVO: - Casaremos o mais breve possível!

24) ORADOR: - Apenas duas palavras...

25) POBRE: - Se eu fosse milionário espalhava dinheiro pelo todo mundo...

26) RECÉM-CASADO: - Até que a morte nos separe.

27) SAPATEIRO: - Depois alarga no pé...

28) SOGRA: - Em briga de marido e mulher eu não me meto.

29) VAGABUNDO: - Há 3 anos que procuro trabalho, mas não encontro.

30) VICIADO: - Essa vai ser a última cheirada.

31) VICIADO PEGO NO FLAGRA: - Estava só segurando pra um amigo...

32) A NAMORADEIRA: - Você é o segundo homem que 'conheço'....

33) O NAMORADO: - Vou botar só a cabecinha...

34) A NAMORADA: - Eu não sou como essas garotas que andam por aí...

35) O CORNO: - O que tem de corno neste mundo...

36) PAI DE VEADO: - Meu filho não é machão, ele é apenas diferente...

37) PAI DE SAPATÃO: - Com a minha filha não tem frescura...

38) O IMPOTENTE: - Comigo o amor é sempre platônico...

39) A FRÍGIDA: - Entreguei meu corpo a Deus...

40) O INTERNAUTA: - Meus e-mails são sempre sérios.


Delírios de um vestibulando



Sentada naquela praça, procurava distrair-me observando as moléculas brincando enquanto aguardava a condução que não vinha. Foi quando me deparei com a cena que procuro descrever, tal qual a vi. Dona Hipotenusa caminhava lentamente, trazendo no colo Cateto, seu filho. Seu marido Isósceles caminhava logo atrás do tio, Escaleno. Formavam um triângulo amoroso, segundo diziam.

E observaram uma Tangente solitária que ali estava. Foi quando Bissetriz, moça afoita e apressada, tropeçando em um ângulo obtuso, caiu, machucando-se na diagonal. Acudiram todos, em uma espiral descendente. “É a enésima vez que caio”, dizia a moça. “É preciso derivar a exponencial cúbica”, observou um logaritmo que chegava, passeando com seu decimal de estimação. Cateto riu, o que deixou a Bissetriz em um estado secante, quase chorosa. Foi Dª Hipérbole que, traçando paralelas com os braços, a socorreu. Hipotenusa, ao ver sua irmã recém-chegada, recriminou-a pelo atraso poligonal sem se dar conta de que estava, ela também, milimetricamente atrasada. Um quilômetro lotado virou a esquina; Isósceles e Escaleno fizeram menção de subir, mas desistiram, enquanto Tangente decidiu ir mesmo assim, já que estava atrasada para mais infinito.

Da condução desceram os irmãos Próton e Nêutron, que logo perceberam estar na equação errada. Pequenos átomos alçaram vôo em direção à pirâmide de uma elipse perfeita. Os irmãos eram opostos pelo vértice – um côncavo, o outro convexo – e logo passaram a discutir: “Seu pleonasmo, não viu que ainda não era a Paroxítona? Estamos na Proparoxítona!” A discussão parecia aquecer em graus Celsius, quando chegou a autoridade. O Máximo Divisor Comum chegou impondo uma regra de três simples, incógnita à mostra, bradando em sustenido: “Chega desta metáfora aqui!” Foi quando chegaram as três irmãs Próclise, Mesóclise e Ênclise, sorvendo vogais enquanto discutiam quem ia à frente, no meio ou atrás da fila que se formava à espera da condução. O polígono chegou dirigido por Pitágoras, velho conhecido de Dª Hipotenusa e do filho Cateto. “Falta o outro”, dizia enquanto desacelerava o vetor. Quando, por fim, a praça se esvaziou, observei Co-seno e sua mulher Mediatriz, que estava para ter um determinante em breve. “É só uma fase”, pensei eu, mas logo me dei conta de que são duas. “Mas elas vão passar. Ou melhor, eu vou.” Entrei no ônibus.

*****

É de autoria de Thaís Cortez, que discorreu sobre um tema livre, no Curso Objetivo Santo Amaro, publicado na edição de Setembro/2000 do BICO (Boletim Informativo do Colégio Objetivo).




Tia Ciata



No registro de nascimento era uma, Hilária Batista de Almeida. No samba, era três: Tia Ciata, Tia Asseata ou ainda Tia Assiata. Nascida em Salvador (BA), em 1854, Tia Ciata foi responsável por consolidar o samba no Brasil. Na época, as rodas de samba - e as seções de candomblé - só podiam ocorrer com aval e vigia da polícia. Aos 22 anos, firmou-se em terras cariocas e fez de sua moradia a "casa dos sambistas" e berço da primeira filha do gênero musical: a canção "Pelo Telefone", de Donga e Mauro de Almeida, gravada em 1916.

*****


Cozinheira. Mãe de Santo. Animadora Cultural. Dona da casa onde se reuniam sambistas e onde foi criado o primeiro samba gravado em disco, "Pelo Telefone", assinado por Donga e Mauro de Almeida. Há controvérsias sobre a data de nascimento de Tia Ciata. Alguns pesquisadores afirmam que a data correta é: 23/4/1854. Tia Ciata (seu nome é encontrado também grafado como Siata, Aciata, Assiata ou Asseata) chegou ao Rio de Janeiro em 1876, aos 22 anos, indo residir inicialmente na Rua General Câmara. Em seguida, residiu na Rua da Alfândega e depois na Rua Visconde de Itaúna (próxima à Praça Onze). Tia Ciata tirava seu sustento da cozinha típica baiana. Ela vendia quitutes em seu tabuleiro entre as ruas Uruguaiana e Sete de Setembro, e também no Largo da Carioca. Logo se destacou entre as baianas festeiras introdutoras da dança do sombra no Rio de Janeiro, e passou a promover sessões de samba em sua casa, na qualidade de Batalaô-omin. Realizava igualmente rituais de culto aos seus orixás africanos. Cada vez mais popular, Tia Ciata recebia em sua casa um grande número de políticos, boêmios, músicos e batuqueiros que lá iam saborear seus pratos típicos, principalmente sua moqueca. Foi numa destas reuniões que nasceu o samba "Pelo telefone", de Donga e Mauro de Almeida.

(Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira)

As Reuniões na Casa da Tia Ciata

Nascida na Bahia, Hilária Batista de Almeida ou Tia Ciata, emigrou com outras "tias" baianas para o Rio, que era a capital do país na época e o lugar onde as manifestações culturais eram mais intensas e os meios de sobrevivência, mais favoráveis. Entre as tias baianas que emigraram com tia Ciata, destacam-se tia Amélia (mãe de Donga), tia Presciliana de Santo Amaro (mãe de João da Baiana), tia Veridiana (mãe de Chico da Baiana). Tia Ciata, a mais famosa de todas, logo se instalou num sobrado da rua Visconde de Itaúna, nº 117, em frente ao Colégio Pedro II, onde fundou uma casa comercial para vender quitutes baianos e cultivar o jogo. Cedo tia Ciata reuniu uma freguesia de malandros, que faziam música, inspirados naquele ritmo que ela havia trazido à cidade grande. Entre esses malandros, estaria a nata de compositores de samba do início do século, a exemplo de Donga, Sinhô (o Rei do Samba), Pixinguinha, Hilário Jovino Ferreira, João da Baiana, China (irmão de Pixinguinha), Heitor dos Prazeres e tantos outros. Foi através dessas reuniões, onde a música e o jogo se misturavam, que foi criado o primeiro samba de autor identificado: O "Pelo Telefone".

(Luiz Américo - A História da MPB)


Tia Ciata e Tia Josefa


Pelo Telefone

A versão oficial e a que o povo preferia cantar

No dia 20 de outubro de 1916, Aurelino Leal, chefe de polícia do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, determinou por escrito aos seus subordinados que informassem “antes pelo telefone” (as aspas são nossas), aos infratores, a apreensão do material usado no jogo de azar. Imediatamente o humor carioca captou a comicidade do episódio, que ao lado de outros foi cantada em versos improvisados nas festas de Tia Ciata e registrado rapidamente por Donga em seu nome, na Biblioteca Nacional. É lógico que os versos “oficiais” eram diferentes daqueles que ridicularizavam o chefe de polícia. Sua versão popular, a que corria na boca das ruas dizia:

Versão oficial (de Donga)


Ernesto dos Santos, o Donga, registrou,
mas o primeiro samba teve vários compositores.

O chefe da folia
Pelo telefone
manda avisar
que com alegria
não se questione
para se brincar.

Ai, ai, ai
deixa as mágoas para trás
ó rapaz!
Ai, ai, ai
fica triste se és capaz
e verás.

Tomara que tu apanhes
pra nunca mais fazer isso
tirar amores dos outros
e depois fazer feitiço...

Ai, a rolinha
Sinhô, Sinhô
é que a avezinha
Sinhô, Sinhô,
nunca sambou
Sinhô, Sinhô,
porque esse samba,
Sinhô, Sinhô,
é de arrepiar,
Sinhô, Sinhô,
põe perna bamba,
Sinhô, Sinhô,
me faz gozar,
Sinhô, Sinhô.

O “Peru” me disse
se o “Morcego” visse
eu fazer tolice,
que eu então saísse
dessa esquisitice
de disse que não disse
Ai, ai, ai
aí está o canto ideal
triunfal
viva o nosso carnaval,
sem rival.

Se quem tira amor dos outros
por Deus fosse castigado
o mundo estava vazio
e o inferno só habitado.

Queres ou não
Sinhô, Sinhô,
vir pro cordão,
Sinhô, Sinhô
do coração,
Sinhô, Sinhô
por este bamba.

Versão das ruas (1916)

O chefe da polícia
pelo telefone
mandou avisar
que na carioca
tem uma roleta
para se jogar...

Ai, ai, ai
o chefe gosta da roleta,
ô Maninha.
Ai, ai, ai
ninguém mais fica porreta,
é, Maninha.

O chefe Aurelino,
Sinhô, Sinhô,
é bom menino.
Sinhô, Sinhô,
pra se jogar,
Sinhô, Sinhô,
de todo jeito,
Sinhô, Sinhô.
O bacará
Sinhô, Sinhô,
o piguelim,
Sinhô, Sinhô,
tudo é assim.

Versão contestatória (1917)

Pelo telefone
A minha boa gente
Mandou avisar
Que meu bom arranjo
Era oferecido
Para se cantar.

Ai, ai, ai
Leve a mão na consciência
Meu bem,
Ai, ai, ai
Mas por que tanta presença, meu bem?

Ó que caradura
De dizer nas rodas
Que esse arranjo é teu!
É do bom Hilário
E da velha Ciata
Que Sinhô escreveu.

Tomara que tu apanhes
Para não tornar a fazer isso
Escrever o que é dos outros

Sem olhar o compromisso.

A letra registrada por Donga, que passou a ser conhecida com original e aparece nas gravações até hoje, é alongada, homenageando o “Peru”, o jornalista Mauro de Almeida, co-autor da obra, e o “Morcego”, Norberto do Amaral Júnior, figura conhecida no Clube dos Democráticos, incorpora também elemento do folclore nordestino.

Cantado em público pela primeira vez (segundo Almirante) no Cinema Teatro Velo, à rua Haddock Lobo, na Tijuca, despertou de imediato a cobiça alheia e – com razão ou sem ela – contestações quanto à autoria de Donga pipocaram de todos os lados. Houve, inclusive uma versão cantada no carnaval de 1917 o verdadeiro tango Pelo Telefone dos carnavalescos João da Mata, o imortal Mestre Germano, Tia Ciata, Hilário, com arranjo do pianista Sinhô, denunciando Donga nas entrelinhas.

(Pesquisa do fascículo número 1 “Os Grandes Sambas da História”)