O sogra do poeta
Os últimos anos da vida de Bernardo
Guimarães (acima) foram de recolhimento e de isolamento. Pobre e modesto,
depois de haver tentado vários lances da fortuna, vivia em um dos arrabaldes de
Ouro-Preto, quando ali o foi visitar Augusto de Lima. No correr da palestra, o
romancista da Escrava Isaura falou de si, assinalando o modo por que a sorte
paradoxalmente o protegia.
- O meu destino é de tal ordem, meu amigo, -
disse, -
que a minha sogra tem o nome de Felicidade!...
Entre as figuras de relevo que
serviam de alvo habitual à sátira impiedosa de Emílio de Menezes, estava
Capistrano de Abreu (acima), historiador ilustre, sábio respeitadíssimo, em
torno do qual se criara uma glosadíssima lenda de desleixo, de abandono
próprio, e, mesmo, de falta de higiene.
Utilizando
esta versão popular, contava o poeta:
-
Uma vez o Capistrano mandou à tinturaria, para ser lavado, um terno com que
andava há doze anos. Uma semana depois, aparece-lhe à porta um empregado da
tinturaria, e entrega-lhe um embrulho pequenino, que lhe cabia na mão.
E como lhe perguntavam
o que seria, Emílio concluía, invariável:
Eram os
botões, menino!
Regalias militares
Laurindo Rabelo (foto acima), não obstante
o descaso de si mesmo, era profundamente orgulhoso. Médico do Exército e íntimo
na casa do coronel Tamarindo, havia o poeta chegado à residência deste, em dia
festivo, na ocasião, exatamente, em que a mesa das pessoas gradas já se achava
completamente cheia.
Não querendo fazê-lo esperar, a dona
da casa indicou-lhe um lugar na mesa da gente moça.
Laurindo
franziu o rosto.
- Adeus,
coronel, - disse, despedindo-se.
E já da
porta, ofendido:
- Os
médicos do Exército jantam com o Estado-Maior!
Frequentador da casa dos Marianos, de
que descende Alberto de Oliveira, conheceu Fagundes Varela (acima) um mulato
pernóstico, de nome Teodorico. Aliteratado, o pardavasco pediu ao poeta que lhe
emprestasse as Flores do Mal.
- Não
posso, -
recusou Varela, piscando os olhos azuis.
E sem a
menor consideração:
- É de
Baudelaire; não para “bode ler!”.
Luto de boêmio
O grupo de boêmios de que faziam
parte Bilac, Murat, Coelho Neto, Guimarães Passos, Pardal Mallet, Paula Ney e
outros, atravessava a sua fase luminosa, quando, um dia, ao chegarem estes à
pensão em que morava Aluísio Azevedo (acima), o encontraram com os olhos
vermelhos de chorar. Tinha-lhe morrido a mãe no Maranhão, e o romancista, além
de outras preocupações, estava a braços com a do luto, impossível na ocasião
pela absoluta falta de dinheiro. A única roupa que possuía era um terno
cinzento, absolutamente inútil naquela emergência.
Guimarães Passos havia chegado,
porém, recentemente de Alagoas, e era dono de um terno preto, destinado a
grandes cerimônias. Correu a casa, e trouxe-o, para emprestar ao amigo,
enquanto este arranjava outro.
Passou-se, entretanto, o primeiro
mês. Passou-se o segundo. Passou o terceiro, e Aluísio sem devolver ao dono o
terno preto, em que se metia diariamente. Guimarães Passos não suportou mais a
demora; plantou-se, uma tarde, à Rua do Ouvidor, ao lado de Coelho Neto e
Alcindo Guanabara, e, à passagem do autor d' O Mulato, que vinha com a sua
roupa emprestada, chamou-o:
- Aluísio!
E fazendo-o parar, intimativo:
- É
preciso que alivies o luto!...