quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

O Velho Pinga

Sérgio Gaúcho Azevedo

Tenho o prazer de postar a doçura da nossa infância do anos 60 e fim de 70 em Sant'Ana do Livramento! Nosso ícone era o “velho Pinga” e suas balas de mocotó!


Todo domingo eu ficava esperando
o velho Pinga aparecer,
numa guampa ele vinha tocando
anunciando o que era gostoso de ver.

O som ia chamando e a gurizada
freneticamente se punha a correr.

As balas eram as mais gostosas
que não dava para comer uma só
e o velho Pinga docemente tocava
anunciando balas de leite e mocotó.

Era toda a semana essa doce espera
ouvir o som da “guampa” tocar.
Fazer esse tempo voltar... Quem dera!
Ver novamente o velho pinga passar.

Sabor que adoça minhas lembranças
eternizando o gosto no meu paladar
em sonhos volto sempre à infância
onde a saudade jamais vem só
e não há tempo que a extinga,
pois é nela que abraço o velho Pinga.
saboreando suas balas de mocotó.

Tenho o prazer de postar a doçura da nossa infância do anos 60 e fim de 70 em Sant'Ana do Livramento! Nosso ícone era o “velho Pinga” e suas balas de mocotó!

Nosso doble chapa “Gaúcho da Fronteira” fala nesse ícone santanense em uma de suas músicas...

Música do Gaúcho da Fronteira:


Cerro do Marco quero levantar pandorgas,
Na rua d′água cruzar levantando pó;
Ouvir um grito pelas ruas da cidade ééé...
O velho Pinga vendendo balas de mocotó;
Mocotó com leite dá força e dá vigor,
Mocotó com leite dá força e dá vigor;
Minha terra, minha gente,
o meu povo quero ver tudo de novo...
quero ver tudo de novo...

 O segredo da bala do Pinga


“Mocotó com leite dá força e dá vigor. Do Pinga cinco. Do Pinga, por favor!” Assim cantava o Velho Pinga, entre toques de berrante, a sua canção pelas ruas e praças de Sant’Ana do Livramento, nos anos 1970 e 1980. A gurizada corria, alegremente, ao seu encontro, louca para saborear as balas de mocotó-com-leite. O “Viejo de la guampa”, antes de entregar o produto ao infante cliente, contava e recontava as balas e dizia “vai uma de inhapa”, ainda que entregasse apenas as cinco balas compradas.

Nas histórias das balas, contadas de geração em geração, sempre se faz presente, junto ao Pinga, uma saudosa atmosfera do passado desta Fronteira. É como se o berrante, a canção, a caixa de balas enroladas em papel branco, a piada e os passos do Velho Pinga tivessem o poder de reconstruir uma cidade que não mais existe, mas que ainda está por aí… viva nas memórias de quem o conheceu ou escutou as histórias contadas a seu respeito.

Pensando nas famosas balas de mocotó-com-leite me ocorreram várias ideias, tais como: resgatar a receita original; propor ao curso binacional de gastronomia do IFSul-UTU a realização de uma pesquisa sobre essa originalíssima iguaria; articular as forças políticas para declará-la, oficialmente, como patrimônio imaterial da Fronteira; e ainda, produzi-la com a finalidade de distribuí-la aos turistas que acorrem às cidades de Rivera e Sant’Ana do Livramento.

Comecei a conversar com as pessoas sobre essas ideias, e a partir dos diálogos, cheguei à conclusão de que o meu intento é irrealizável. Primeiramente, é impossível refazer a bala porque a receita morreu junto como seu criador. Pinga tinha segredos culinários que nunca contou para ninguém. E, em segundo lugar, porque uma bala de mocotó-com-leite similar não seria a mesma bala do Pinga, faltar-lhe-ia o ser social do passado que a gerou, sobretudo, os espaços urbanos e as pessoas que não mais existem. A bala do Pinga, sem o Pinga, seria uma ideia tão absurda e ilógica como uma chuva sem água.

Além dos ingredientes essenciais à sua fabricação, o mocotó e o leite, a bala do Pinga, guardada na caixa da memória, é adocicada pela saudade dos amigos de infância; pela recordação das ruas, esquinas, prédios, sinaleiras e praças do passado; pela lembrança dos jogos no estádio de futebol ou dos desfiles no Dia da Pátria; pela reminiscência da companhia de uma vó, de um tio, ou, até mesmo, dos pais que pagavam pelo doce mais famoso e característico da Fronteira – ou seja, por ingredientes que residem apenas na memória coletiva do povo fronteiriço e que, portanto, não caberiam numa panela.

De toda essa história, talvez o dado mais interessante, seja o quanto a intangível bala do Pinga suscita um desejo, ainda maior, em quem não viveu aquele tempo. A famosa guloseima é inesquecível até mesmo para quem nunca a provou com o paladar, mas teve a oportunidade de devorá-la por meio das histórias, carregadas de emoções e saudades, contadas e recontadas pelas crianças de ontem para as crianças de hoje.

Por isso, a melhor homenagem que se pode fazer ao Pinga, e ao seu mundo, não reside na recriação da bala de mocotó-com-leite “que dá força e dá vigor”. Tal feito não passaria de um simulacro incapaz de recriar a bala original. Por isso, quem quiser encontrar a bala do Pinga que a busque lá onde ela sempre esteve viva, presente e disponível para a degustação. Busquem-na na memória e nas histórias do povo da Fronteira. Ah! E parece que ainda leva uma de inhapa.

(Do saite: www.aplateia.com.br)


5 comentários:

  1. Obrigado pela divulgação deste texto. Escrevi ele para um concurso do IFSul. Sou Professor de Filosofia no campus do IF de Santana do Livramento, me chamo Eliézer dos Santos Oliveira

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    1. Amigo Eliezer, parabéns pelo teu belo texto, quem teve o privilégio de conhecer o Velho Pinga, figura folclórica e muito querida de Santana do Livramento, conheceu um ser humano exemplar!

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  2. Na condição de Gaúcha Desgarrado aqui no Rio de Janeiro, quero declinar meu comentário para declarar que na minha infância em Livramento, por muitas vezes meus Pais me levavam para a Praça e ficávamos esperando o Pinga passar, e quando ouvíamos o som do seu berrante, era só alegria. . .

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  3. Quem nunca ouviu o Velho Pinga cantar:

    “Mocotó com leite dá força e dá vigor;
    Ô Pinga, Pinga, ô Pinga, por favor!”

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  4. Meu avô muita saudade!

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