Ele teve 68 canções vetadas
durante a ditadura. Em outubro de 1973, quando havia definido o repertório para
o novo disco, submeteu as 12 canções ao crivo da censura, como era de praxe.
Apenas uma foi liberada. Em abril do ano seguinte, outras 44 seguiram o mesmo
destino: o veto. Para poder gravar, era preciso negociar com os novos
parceiros, os agentes da censura. Numa ocasião, quando lhe proibiram de usar a
palavra “polícia” na canção “Nova York“,
sugeriu cantá-la em inglês, “police”, o que bastou para que a nova versão fosse
aprovada.
Em meados de 1973, Taiguara
preferiu o exílio em
Londres. Retornou ao Brasil em 1975 para gravar e lançar um
disco, do qual participaram músicos do calibre de Hermeto Pascoal e Wagner
Tiso. O show foi cancelado e toda a tiragem recolhida pela polícia em 72 horas,
convencendo Taiguara a sair novamente do Brasil, sem planos de retorno. Só
voltou a cantar no Brasil quando um civil ocupava o Palácio do Planalto, em
1986, podendo finalmente cantar as letras que tinham sido proibidas.
Embora seja mais conhecido hoje
pela canção romântica “Universo no Teu Corpo” (“Vem comigo / meu pedaço de
universo é no teu corpo”), seu cancioneiro lista títulos tão sugestivos quanto
“Cavaleiro da Espernaça“, feita em homenagem ao comunista Luís Carlos Prestes,
“Teu Sonho Não Acabou”, “Geração 70”
e “Que as Crianças Cantem Livres” (“E que as crianças cantem livres sobre os
muros / e ensinem sonho ao que não pode amar sem dor / e que o passado abra os
presentes pro futuro / que não dormiu e preparou o amanhecer”).
(Memórias da
Ditadura)
Que as crianças cantem livres
Taiguara
O tempo passa e atravessa as avenidas,
E o fruto cresce, pesa e enverga o velho pé.
E o vento forte quebra as telhas e vidraças,
E o livro sábio deixa em branco o que não é.
Pode não ser essa mulher o que te falta,
Pode não ser esse calor o que faz mal,
Pode não ser essa gravata o que sufoca,
Ou essa falta de dinheiro que é fatal.
Vê como um fogo brando funde um ferro duro.
Vê como o asfalto é teu jardim se você crer,
Que há um sol nascente avermelhando o céu escuro,
Chamando os homens pro seu tempo de viver.
E que as crianças cantem livres sobre os muros,
E ensinem em sonho ao que não pode amar sem dor.
E que o passado abra os presentes pro futuro,
Que não dormiu e preparou o amanhecer...
Da Folha de S.Paulo
Os muros a que se refere Taiguara
são muitos, mas são, sobretudo, os metafóricos muros das barreiras que separam
as trevas da luz, a mediocridade da criatividade, a teimosia da abertura mental
e psíquica, separam a inércia do movimento para a frente, para o novo, para a
revisão do velho conceito. Onde estiver, um beijo, caro Taiguara. É isso.
(Fevereiro de 2011)
O cantor e compositor Taiguara
Chalar da Silva (1945-1996) nascido no Uruguai durante uma temporada de
espetáculos de seu pai, o bandoneonista e maestro Ubirajara Silva, foi um dos
melhores compositores da MPB e considerado um dos símbolos da resistência à
censura durante a ditadura militar, tanto que teve, aproximadamente, 100
músicas vetadas, razão que o levou a se auto exilar na Inglaterra em meados de
1973.
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