A insistência dos leitores em
querer saber como é que os compositores gaúchos começaram a agradar o público
me fez sair um pouco da rotina, para dar uma explicação. Para isso, tenho de
voltar um pouco no tempo e falar novamente da composição Se acaso você chegasse, que foi a música que abriu o caminho no
centro do país para as gravações dos compositores do Rio Grande do Sul.
A história é a seguinte: no ano
de 1935, surgiu em Porto
Alegre a Rádio Farroupilha, dirigida pelo grande radialista
Arnaldo Balvê, que procurou promover os compositores “Prata da Casa”. Foi nessa
época que eu, para brincar com um amigo, Heitor Barros*, já falecido, fiz o
samba Se acaso você chegasse. Os marinheiros que seguidamente aqui chegavam,
vendo que muita gente cantava aquela música, resolveram incluí-la no repertório
da orquestra dos navios, espalhando-a para todo o Brasil, sem que ninguém
soubesse quem era o seu autor. O pessoal de uma gravadora, que ouviu o meu
samba e testemunhou o sucesso que fazia, resolveu edita-la, à espera que seu
autor aparecesse. Foi com grande dificuldade que consegui provar que a música
era minha, porque ninguém acreditava que um gaúcho pudesse compor um samba
tipicamente carioca. Depois, os jornais de todo o Brasil começaram a publicar
que no Rio Grande do Sul também se compunha samba, fazendo com que os editores
de discos começassem a se interessar por nossas músicas.
Depois dessa conversa toda, vai
de novo a letra do meu samba.
Se acaso você chegasse
Lupicínio Rodrigues e
Felisberto Martins
(Lupi, falando ao
amigo Heitor Barros)
Se acaso você chegasse,
No meu chatô e encontrasse
Aquela mulher
Que você gostou.
Será que tinha coragem
De trocar nossa amizade
Por ela que já lhe abandonou?
(Agora, Lupi, depois
da pergunta feita acima,
ele diz ao amigo o porquê da pergunta.)
ele diz ao amigo o porquê da pergunta.)
Eu falo porque essa dona
Já mora no meu barraco
À beira de um regato
E de um bosque em flor.
De dia me lava a roupa,
De noite me beija a boca,
E assim nós vamos vivendo de
amor.
(Do livro “Foi assim −
o cronista Lupicínio conta as histórias das suas músicas”,
o cronista Lupicínio conta as histórias das suas músicas”,
de Lupicínio
Rodrigues − L&PM)
*Samba de 1938 foi uma forma de
propor paz ao amigo Heitor Barros, de quem ele roubara a mulher. Heitor gostou
tanto da música que perdoou Lupicínio, pois este sabia que agira mal e temia
perder o amigo, que muito prezava.
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