João Ribeiro, in
Língua Nacional
O brasileiro diz comumente:
− Me diga... me faça o favor...
É esse um modo de dizer de grande
suavidade e doçura, ao passo que o − diga-me
− faça-me − duros e imperativos.
O modo brasileiro é um pedido; o modo
português é uma ordem.
Em − me diga − pede-se; em − diga-me
− ordena-se. Assim, pois, somos inimigos da ênfase e mais inclinados às
intimidades.
Eis o suposto erro que, afinal, é a
expressão diversa da personalidade. E se quisermos uma prova decisiva nesta
matéria, temo-la no uso chamado português que também fazemos, quando há
necessidade, imperativas de mando ou de ênfase. Então, nesses casos,
praticamos, sem o saber, a vernaculidade dos pronomes.
Se, entre brasileiros, um ordena que
outro se retire, diz logo:
− Safe-se! Raspe-se! Suma-se!
É a ênfase que vernaculiza a
expressão, e eis porque não a admitimos onde seria imprópria, excessiva e
contrária à nossa índole.
− “Me passe os cobres...” é a fórmula
de uma cobrança amigável.
− “Passe-me os cobres...” é já uma
intimação violenta, judicial, manu
militari.
Que interesse temos, pois, em reduzir
duas fórmulas a uma única e em comprimir dois sentimentos diversos numa só
expressão?
Em geral todas as mutilações por amor
da vernaculidade (ou antes portuguesismo) envolvem qualquer sacrifício dalma,
destroem os meios-tons, os matizes criados sob a luz e o céu americano.
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João Ribeiro (João Batista Ribeiro
de Andrade Fernandes), jornalista, crítico, filólogo, historiador, pintor,
tradutor, nasceu em Laranjeiras, SE, em 24 de junho de 1860, e faleceu no Rio
de Janeiro, RJ, em 13 de abril de 1934.
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