O mês de julho tem
um grande significado para a nossa aviação, pois assinala a passagem de duas
importantes datas: o nascimento e a morte de Alberto Santos Dumont, que
trabalhou incansavelmente pelo progresso da humanidade, escrevendo páginas
decisivas na história espacial, como criador do primeiro balão dirigível e do
aeroplano mecânico.
No início da Revolução de 1932, ele
havia chegado a Guarujá, acompanhado do seu sobrinho Jorge Dumont Villares,
demonstrando então profundo esgotamento nervoso. Ficou hospedado no Hotel La
Plage e no dia 23 ainda chegou a receber a visita do aviador Edu
Chaves, sendo que pouco depois veio a ocorrer o dramático desfecho.
“Guarujá − Alberto Santos Dumont −
23-julho-1932. Alberto Santos Dumont − Brasileiro, branco, solteiro, com 59
anos de idade, inventor. Ao que consta, foi encontrado morto em um dos
apartamentos do hotel de la
Plage , no Guarujá, onde residia. Trata-se do cadáver de um
homem de estatura mediana e de constituição regular, ainda em estado de
flacidez muscular. Veste terno de casemira preta, gravata preta e calça botinas
pretas. Não encontramos pelo corpo vestígio de lesão traumática. A morte se deu
por colapso cardíaco”.
Existem várias versões sobre o seu
falecimento, mas vejamos o relato do delegado de polícia que atendeu à
ocorrência, Dr. Raimundo de Menezes, descrita por Barros Ferreira, a qual
transcrevemos: (1)
“Santos Dumont estava hospedado no
Hotel La Plage ,
que era o melhor do Guarujá. De lá, recebera a comunicação aflita. Não havia
tempo a perder. Dirigi-me para o hotel, onde fui encontrar Edu Chaves e um
sobrinho do inventor, muito preocupados. Contaram-me que Santos Dumont, nos
últimos dias, ficara muito impressionado com o lançamento de bombas por parte
de aviões do Governo Ditatorial. Culpava-se pelo seu invento, que devia
aproximar os homens e não contribuir para maior matança. Penitenciava-se pelo
mau uso que faziam da aviação. Já sofrera uma crise muito grave.
Sucedera o inesperado. Apesar da
vigilância com que o cercavam discretamente, ele desaparecera. Talvez se tivesse
afogado.
− Mas já
procuraram no hotel?
− Ainda não.
− Já viram nos banheiros? Qual deles usava?
− Está fechado.
− Por dentro ou por fora?
− Não reparamos.
− Convém ir ver sem demora. É capaz de estar...
− Ainda não.
− Já viram nos banheiros? Qual deles usava?
− Está fechado.
− Por dentro ou por fora?
− Não reparamos.
− Convém ir ver sem demora. É capaz de estar...
Correram em direção ao banheiro.
Bateram à porta. Como não houvesse resposta, mandei arrombá-la. E o que vimos constituía
um quadro dos mais dramáticos. Santos Dumont enforcara-se. O corpo, pequeno e
magro, pendia do cano do chuveiro. Utilizara como corda o cordão do roupão de
banho. Retirado o corpo, o médico informou que nada mais havia a fazer. Estava
morto. Restava dar cumprimento aos regulamentos. Conquanto se tratasse de uma
glória nacional, a autópsia se impunha. Mas, quando cheguei à delegacia, já me
aguardava um telefonema do chefe de polícia, então o Tirso Martins. Informou-me
que a família de Santos Dumont obtivera do Governador Pedro de Toledo a entrega
do corpo...”
E mais
adiante:
... − Suicidou-se, sem dúvida alguma.
Por enforcamento. Apanhou o sobrinho distraído e escapou-lhe. O Edu Chaves
contou-me que ele andava muito abatido, ultimamente.
− Então não crie embaraços à família.
Vamos dar o caso como morte natural. A família insiste na dispensa da autópsia.
Não há motivo para não atender a essa solicitação. O governador está de acordo.
Eu assumo a responsabilidade. Já demos instruções à Censura para que os jornais
não divulguem a morte como suicídio.
Assim foi encerrado o caso. Para mim,
de certa maneira, da forma mais humanitária e honrosa...”
O “Pai da Aviação” passou seus
últimos dias de vida no Grande Hotel de La Plage , em Guarujá, na Ilha de Santo Amaro, a
poucos quilômetros da Base de Aviação Naval da Boacaina. E foi ali que, visivelmente abatido pela
doença que o afligia, entregou a alma ao Criador no dia 23 de julho de 1932,
quando o governo decretou luto oficial por três dias.
Depois do triste desenlace, os
parentes e amigos que se encontravam em São Paulo , Drs. Jorge Alfredo e Alberto Dumont
Villares, os Srs. José Severo Dumont Fonseca, Alcides de Nova Gomes e os Drs.
Taylor de Oliveira, Francisco Bento de Carvalho, José Bento de Carvalho e João
Mourão, se deslocaram rapidamente para o Guarujá e acompanharam o corpo até
nossa cidade, através do ferry boat e, daqui para São Paulo, pela estrada de rodagem.(2)
Da capital bandeirante, o esquife de
Santos Dumont foi colocado num comboio especial que partiu da Estação do Norte
(Roosevelt) com destino ao Rio de Janeiro, onde foi sepultado com honras de
Ministro de Estado.
Suicídio ou não, o certo é que
desaparecia, aos 59 anos de idade, o genial aeronauta patrício, desbravador
incansável que cumprira o seu patriótico sonho de menino: competiu com as aves
e elevou-se majestosamente no espaço como um verdadeiro homem-pássaro,
tranqüilo como um deus-alado, pois, afinal, o seu sonho era "voar como os
pássaros e não saltar como os gafanhotos”.
(*)
J. Muniz Jr., no livro Episódios e Narrativas da Aviação na Baixada
Santista, edição do autor,
comemorativa da Semana da Asa de 1982, Santos/SP.
(1)
"Morte Trágica de Santos Dumont", Edição Extra.... (4.3.1963)
(2)
"O Brasil Perdeu um dos Seus Maiores Filhos", jornal A
Tribuna (24.7.1932)
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