Era uma linda noite, escura e chuvosa. O sol, oculto pelas nuvens, brilhava nas trevas. Deitado em pé, sentado num banco de pedra feito de pau, à sombra de uma macieira, sem folhas, que dava jabuticabas com gosto de melancia, um mudo gritava consigo mesmo aos seus companheiros:
“Prefiro mil vezes a morte a perder a vida!”
Perto dali, bem longe, próximo a um bosque sem árvores, os pássaros pastavam alegremente, enquanto as vacas saltavam de galho em galho, procurando suas tocas e os elefantes descansavam à sombra de um pé de alface.
Corri como um louco, com jeito de maluco, vagarosamente depressa, para minha casa de minha irmã. Passei a noite em claro, pois esqueci de apagar a luz. Logo às dez horas da madrugada, fui ao veterinário que me disse que eu estava com a língua do sapato com sapinhos.
Montei em minhas costas e saí, voltando, a galope pelas curvas retas de um deserto gelado até chegar à porta de minha casa do meu primo. Entrei pela porta da frente que fica nos fundos do apartamento térreo do quinto andar. Deitei o meu paletó na cama e pendurei-me no cabide. Acordei e vi que estava dormindo. Levantei-me, lentamente, depressa, dei marcha-ré no meu ventilador e rumei para o banheiro onde eu servi o almoço para o garçom. Levantei, carinhosamente, com gestos bruscos, os pés da cama da mesa, sentindo um gosto estranho na boca, pois havia comido o guardanapo e limpado a boca com o bife.
Do lado de fora, dentro da casa, um cego, falando com um surdo, lia o seu jornal, ouvindo um mudo cantar. O jornal, sem folhas, dizia, em chinês falado no Japão:
“Você sabia que os quatro profetas são três: Jacó e Jeremias.”
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