quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Um ato de amor

 Zé Victor Castiel

Fui adolescente no final da década de 1960 e início de 70. Bons tempos aqueles. A gente usava calças boca de sino e ainda disputava para ver qual delas era a maior. Durante do dia, brincávamos de tudo aquilo que já foi cantado e decantado em verso e prosa, como bolas de gude, taco e tantas outras que só não podem acontecer hoje porque nenhum pai se atreveria a deixar seus filhos na rua brincando, sob pena de voltarem traumatizados com algum tipo de violência. 

Havia, porém, um perigo, que não era considerado como tal e que mais tarde voltaria para cobrar seu preço: o fumo, o crivo, o cigarro. Naquela época, todos os adultos, se não fumavam regularmente em alguma ocasião, apareciam com um cigarro nos dedos. Era charmoso. Os artistas de cinema e televisão fumavam compulsivamente e era aquela pequena bengala cênica que dava segurança aos atores e emprestavam charme aos seus personagens. As piteiras eram usadas como adereço de beleza e valor para que os outros percebessem. Era de bom-tom. As propagandas da televisão, que ao fim e ao cabo ditavam a moda, eram lindas. Pouca gente escapava daquilo. 

As crianças maiores e os adolescentes também queriam utilizar o cigarro para parecer mais interessantes. Claro que faziam isso escondido dos pais, mas, quando surpreendidos, recebiam uma reprimenda que não condizia com o delito cometido. 

E assim foram se passando os anos.  Muitas dessas pessoas deram-se conta de que o cigarro não era o que dizia ser e trazia consigo inúmeros malefícios. Na verdade, os que permaneceram fumando já eram escravos de uma droga que era considerada lícita e que se adquiria em qualquer supermercado ou vendinha. 

Mas aí já era trade. Deixar de fumar passou a ser uma tarefa muito difícil. Evidentemente que uma pessoa é muito mais forte do que um pedaço de papel enrolado com fumo dentro. Mas, por incrível que pareça, é muito difícil parar. E aí começaram a surgir os malefícios daqueles que fumaram tanto tempo e deram chance para o azar. 

Não culpo, de forma alguma, as pessoas que ainda fumam. Muitas delas foram compelidas a isso pela mídia e pela época em que viveram. Mas não compreendo como um jovem ou um adolescente ainda consegue aderir ao cigarro, mormente sabendo que seu cheiro é desagradável e que suas consequências, um dia, serão nefastas. Orientem bem seus filhos desde a mais tenra idade para que fiquem afastados desse mal que, mais cedo ou mais tarde, volta para assombrar a sua saúde. Acreditem em mim. É um ato de amor. 

(Do jornal Zero Hora, 30.11.2023)

Nenhum comentário:

Postar um comentário