quinta-feira, 10 de agosto de 2023

Internacional X River Plate

 Libertadores da América 2023 

A classificação mais emocionante da história do inter 

Fabrício Carpinejar

Tinha que ser no extremo da paixão, contra um juiz que não deu uma penalidade clara em cima de Bustos, contra os prognósticos, contra a soberba do River Plate. 

Se o gol de Figueroa no primeiro título nacional ficou conhecido como gol iluminado, com um facho de luz sobre a sua cabeça, o gol de Gabriel Mercado pode ser caracterizado como o gol lunar, afastando as sombras do Beira-Rio. 

Só podia ser de um argentino o autor do primeiro lance redentor. É a lei do ex, o antídoto feito do veneno. 

Só podia ser de falta, uma cobrança tão escassa em nossa artilharia, o segundo lance consagrador daquele que é o regente da orquestra, Alan Patrick, que prova ser o nosso cérebro, o sucessor de D’Ale*. 

Só que Inter é sofrimento, lágrimas de sangue, suor frio. Não viria fácil. Andamos sempre de mãos dadas com o abismo, com o perigo. 

Inter é Instituto de Cardiologia, é ponte de safena, tinha que vir o desconto do River no apagar das luzes e, com ele, o sufoco da garganta seca, o medo de desperdiçar o que estava ganho, de jogar fora a classificação certa por um detalhe, por um triz, por uma desatenção. De novo. De novo. 

O final torturante lembrava Olímpia, mas lembrava agora para superar o trauma. 

A escrita se quebrou. 

Só podia ser nos pênaltis. Com Rochet marcando, não defendendo. Com o nosso uruguaio da seleção comemorando o gol com os punhos levantados de suas luvas. 

Depois de vinte penalidades. Depois de quase enlouquecermos com o escorregão de Solari e a bola na trave de De Pena. 

Só podia ser com Coudet no banco, vindo na última hora para se redimir e nos conferir esse acréscimo de garra e loucura. 

Inter foi gigante, épico, inesquecível. Está nas quartas de final da Libertadores, na classificação mais emocionante de sua história. 

Um ano que se mostrava perdido, sem Gauchão, sem Copa do Brasil, estacionado na faixa intermediária do Brasileirão, com sete jogos sem vencer, encontrou a plenitude de sentido de repente. Porque estávamos guardados para a grandeza. 

Quem não diz que talvez tudo mude, que talvez seja o nosso melhor ano superando as expectativas? 

Se o Inter ainda não conquistou o tri, com certeza já recuperou a sua alma guerreira, bélica, portenha, pampeana. Os laterais Bustos e Renê não desistiram de nenhuma bola, zaga brilhou soberana erguendo o escudo, Enner enlouqueceu a marcação. Todos jogaram porque jogaram como um todo orgânico, indivisível − o conjunto, o elenco inteiro, merece nota dez. 

Costumo dizer que diagnóstico não é destino. O diagnóstico ao colorado era que sucumbiria ao River Plate, campeão argentino, que desfrutava da vantagem de um empate. Mas o nosso destino era outro, alvissareiro, do tamanho do estádio lotado, rugindo, dos cinquenta mil torcedores. 

Estávamos com saudade da avenida Goethe. Lá vamos nós, corações incendiados, pelas ruas de fogo. 

Publicado no jornal Zero Hora, em 9/8/23. 

*D'Ale (D'Alessandro), jogador argentino campeão da Libertadores de 2010 pelo Internacional.

P.S. Na fase do mata-mata, uma semana antes, o Inter havia perdido para o River por 2 a 1 em Buenos Aires. Teria que reverter o placar para eliminar o rival em Porto Alegre. Ganhou com o mesmo escore: 2 a 1. Foram batidos 17 pênaltis. O Inter converteu 9, errou 1; O River converteu 8, errou 2. Final 9 a 8 para o Inter.

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