Era uma vez um coelhinho criado por
uma família de cangurus. Os cangurus cresciam, o coelhinho não, e por isso o
apelidaram de Canguruzinho Feio e passaram a chamá-lo de pulga, pula-migalha,
salta-formiga e todas essas coisas ofensivas que os cangurus altos reservam
para os cangurus baixinhos. Um dia, porém, toda família de cangurus foi passear
em Adelaide. E
era páscoa. E o Canguruzinho Feio descobriu, maravilhado, que não era um
Canguruzinho Feio, mas um belo coelho, animal fantástico, capaz de pôr ovos
coloridos de chocolate e, por esta razão, merecer dos humanos um tratamento de
semideus. De início, os cangurus o olharam com toda a admiração, até que um
deles – não muito alto, por sinal – provocou: “Ah é, bonito? Bota um ovo de
chocolate aí, então, pra gente ver?”
O coelho se agachou, fechou os olhos,
mentalizou um ovo de 500 g
da Lindt, fez toda força que seu pequeno esfíncter era capaz, mas o resultado
foi apenas uma bolinha de cocô. Os cangurus explodiram numa gargalhada. O
coelho ainda apertou o cocozinho com a ponta da unha e uma ponta de esperança:
vai que era um MM marrom? Não era.
Morto de vergonha, o Canguruzinho
Feio abandonou a família e passou a viver mendigão pelas ruas de Adelaide.
Era uma vez uma lesma criada por uma
família de minhocas. As minhocas pararam de crescer, mas a lesma seguia
inchando, por isso a apelidaram de Minhocona Feia e passaram a chamá-la de
bisnaga, linguiça, isca de baleia e todas essas coisas ofensivas que as minhocas
magras reservam para as minhocas gordas. A Minhocona Feia vivia fazendo regime,
jejuava por dias inteiros, tentou cortar carboidratos, glúten, frituras, mas
nada adiantava. O que mais a envergonhava, porém, não era o peso, era produzir,
em vez do húmus – orgulho e alegria de toda minhoca –, uma baba humilhante que
a seguia por onde fosse.
Um dia choveu muito, o gramado alagou
e as minhocas tiveram que se abrigar na varanda. Nesse dia, a Minhocona Feia
olhou para a vidraça da casa e viu duas Minhoconas Feias iguais a ela, na ponta
de dois rastros iguais ao seu. Nesse dia, ela descobriu que não era uma
Minhocona Feia, mas uma bela jovem lesma.
Por uma semana, a bela jovem lesma
viveu feliz com seus pares, babando na vidraça e comendo como uma condenada. E
uma condenada, de fato, ela se tornou: de tanto comer para compensar os tempos
de penúria, passou a ter problema de colesterol, diabetes, pressão alta e
acabou enfartando não muito depois da sua redenção.
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Era uma vez um ouriço que nasceu
próximo a uma família de polvos. Por uns dez segundos, ele acreditou que
pudesse ser um polvo esquisitíssimo, mas pensou melhor e percebeu que não.
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Era uma vez u filhote de tigre criado
por uma família de gatos. Os gatinhos pararam de crescer, mas o tigre não, por
isso o apelidaram de... De nada, pois assim que percebeu as risadinhas, o
filhote de tigre almoçou os quatro irmãos, a mãe, uma lesma moribunda que
encontrou na varanda, um coelho bebum que trombou na esquina e são não comeu o
ouriço e família de polvos porque não nasceu no fundo do mar, não se achava um
peixe-tigre e sequer sabia nadar.
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Antonio Prata é
escritor, autor de Nu, De Botas (2013).
Escreve semanalmente neste Caderno – Zero Hora.
Escreve semanalmente neste Caderno – Zero Hora.
Muito bom esse conto, ou é uma crônica, fiquei na dúvida.Eu tenho um amigo, que um dia conversando sobre feio e bonito, me falou, que tudo tem sua beleza, basta saber olhar, apartir desse dia comecei a ver as coisas de forma diferente.
ResponderExcluirNa verdade são pequenos contos, cada um sobre uma situação fantasiosa da vida.
ResponderExcluirEsse seu amigo ele sabe das coisas...