O perito José Eduardo Besaglia
colecionou uma série de pérolas do português criminalístico extraída de laudos
de colegas e de processos, em seu livro Perícias
e peripécias.
Þ Atropelamento animal: “os
melhores ferimentos localizavam-se no ombro esquerdo do cavalo”.
Þ Locais de homicídio:
“deparamos com um cadáver morto, em decúbito dorsal, com as costas no chão” ou
“o corpo, assistido por formigáceas, jazia ao leito de imensas mistáceas”.
Þ Bens
para penhora: “O material é imprestável, mas pode ser utilizado.”
Þ Despacho judicial:
“Arquive-se esta execução porque o exequente foi executado (à bala) pelo
devedor.”
Þ
Encerramento de um processo: “Os anexos seguem em separado.”
Linguagem poética
Policial à paisana, talvez delegado,
contando como atirou em dois homens que tentavam assaltar o cobrador e os
passageiros do ônibus em que viajava; matou um e feriu o outro:
- Quando os elementos consumaram o delito, dei voz de prisão a eles. Foi
quando os mesmos esboçaram reação onde houve a troca de tiros.
No motel
A maior familiaridade de agentes da
lei, escrivães e peritos com o português pode evitar vexames clássicos como o
de um boletim de ocorrência registrado em 2 de abril de 1993, pelo Motel Estância
dos Executivos, em Catanduva (SP). O incidente, a destruição parcial de um
motel em decorrência das chuvas, teve a seguinte descrição hiperbólica e
eufêmica:
“Chovia torrencialmente. De inopino
no meio da torrente, os elementos em fúria manifestam-se sob a forma de uma
faísca elétrica que, com um vigor moralista, precipita-se sobre o Motel
Estância dos Executivos. O estrépido é ensurdecedor, assustando vários casais
que, cansados, lá se preparavam após um longo dia de serviço para pernoitar.
Inicialmente, a reação é de fuga. Após o passo-a-passo, os funcionários do
motel retornam para avaliar a macabra situação. A maioria dos aparelhos de TV e
vídeo queimados, além dos portões elétricos que, assustados, se escancararam e
recusaram-se terminantemente a movimentarem-se. Banheiros de hidromassagem
inoperantes para sua medicinal função.”
De olho no seguro, os representantes
do motel queriam um registro formal do incidente. Premidos pelo preenchimento
burocrático de um boletim-padrão, mas sem saber a que categoria atribuir a
ocorrência, o escrivão e o delegado da 2ª DP em Catanduva acharam por bem indiciar
o único responsável imaginável àquela altura: São Pedro.
Não consta que o suspeito tenha sido
localizado.
(Da Revista Língua
Portuguesa – número 10)
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